EnglishEspañolPortuguês

Azar do bebê-porquinho

19 de dezembro de 2008
2 min. de leitura
A-
A+

Enquanto todos ao meu lado, no ônibus, no metrô, nas calçadas e nas filas, vivem o frenesi típico do final de ano, eu apenas reflito. A correria faz parte da tradição, tal como comer grãos de lentilha no Réveillon, pular ondas no mar e demais superstições feitas sob encomenda para os incautos. Talvez seja o famoso ‘espírito natalino’ – uma agitação que pode ser vista nos supermercados e no trânsito, unindo aqueles que se ignoraram durante todo o ano, e agora buscam algo que não se sabe bem o que é.

Mas o sistema tranqüiliza a todos, pois o anseio mudo e angustiante da chegada das ‘festas’ pode ser contornado com uma mesa farta e sorrisos movidos a álcool, e a Imprensa já tem prontas bobagens como ‘Dicas para evitar os excessos no final de ano’ e ‘Colesterol: vilão ou aliado?’. Eu apenas vejo um número maior de animais sendo conduzidos para o abate, em marcha mais acelerada que o costume.

Toda família que se pretenda feliz no Natal e no Ano Novo antecipadamente encomendou peru assado ou lombo de porco, caso contrário estaria condenada aos piores azares durante o ano de 2009. Não se pode arriscar. Eis um bom momento para o afeto materno tomar corpo, com direito a temperos variados, muitas horas na cozinha e acompanhamento final de espumante. Tim-tim.

O aumento do consumo por parte dessas manadas de cidadãos bem-intencionados e algemados à tradição resulta em um incremento no mercado de animais para corte, apenas. A felicidade, harmonia, comemoração e alegria etílica para os animais humanos – pelo menos para aqueles que rezam conforme o ‘manual de instruções’ da vida – significam um inferno 10% mais ardido para os animais não-humanos. Pelo menos para aqueles que foram eleitos como ‘comestíveis’, claro. Azar o deles, sorte dos pandas.

No entanto, só quem sofre da ‘sociopatia vegana’, como já escutei, vê algo de errado em um bebê-porquinho exposto nos açougues, estabelecimento este decorado com rostos de Papai Noel e motivos natalinos. Para os demais, é uma iguaria a ser consumida em ocasiões especiais, e a vinda do bebê-Jesus autoriza o preparo de uma pepita gastronômica dessa estirpe. Claro, muitos também se chocam ao ver um animal inteiro filhote morto – potencialmente fofo e esperto como Babe, o Porquinho – com poucas semanas de vida, somente para satisfazer os caprichos do palato.

Mas relevam o fato com alguma rápida explicação à própria consciência, para seguirem em frente, aliviados. E provavelmente não vão recusar, depois, uma dourada costela de leitão, acompanhada de farofa, passas, pêssegos, arroz-de-festa e lentilha. Para dar sorte em 2009, claro.

Você viu?

Ir para o topo