Tradução Laura Dourado/ Redação ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais
Qualquer pessoa que estava à procura de uma refeição gourmet no começo de 1900 nos Estados Unidos poderia sempre contar com a carne de tartaruga.
Servida como sopa ou filé, a carne de tartaruga estava presente tanto em jantares presidenciais como em refeições de trens. Ela era considerada uma iguaria tão desejada que os caçadores começaram a pegar todas as espécies que encontravam para saciar a demanda, mas a partir de 1920, essa febre começou a diminuir.
No entanto, agora os adoradores e protetores das tartarugas têm motivos para se preocupar novamente. A demanda pelo animal começou a crescer na China, onde elas são vendidas como animais domésticos, alimento e até medicamento, que supostamente melhorariam o sistema imunológico e a performance sexual. Nos anos 2000, as tartarugas chinesas foram dizimadas e cerca de 75% das 90 espécies de água doce da Ásia – incluindo a tartaruga gigante de casco mole do rio Yangtze, a maior tartaruga de água doce da Terra – estão ameaçadas de extinção.
Durante as últimas décadas as espécies de tartaruga de água doce dos Estados Unidos, onde os estados do Sudoeste mantêm algumas das maiores concentrações do mundo, estão compensando o déficit chinês, e esse apetite por tartarugas aumentou a procura no próprio país por animais domésticos e pela carne do animal, e também ocasionou a perda de uma parte de seu habitat.
Atualmente, estados ricos em tartarugas, como Flórida e Texas, proibiram ou restringiram sua captura receando que esse crescimento na demanda pudesse provocar um colapso no equilíbrio das populações. No entanto, o estado de Louisiana ainda permite a captura de tartarugas quase sem restrições. Lá, as pessoas podem conseguir uma licença para capturar qualquer uma das 19 espécies de água doce que o estado abriga, com exceções para as espécies mais vulneráveis: a tartaruga-agressiva-jacaré, a tartaruga de caixa e a tartaruga almíscar razor backed. Residentes pagam US$ 25 para tirar a licença e pessoas de outros estados pagam US$ 80.
Contudo, o Centro de Diversidade Biológica e a Rede de Restauração do Golfo querem mudar isso. Em outubro as organizações de conservação preencheram uma petição com o Departamento de Vida Selvagem e Pescas da Louisiana demandando que o estado banisse a coleta de espécies selvagens para fins comerciais. A captura pode destruir a população de tartarugas no estado, de acordo com a petição, o que demonstra que Louisiana tem a política de captura mais permissiva do sudeste do país.
“Tartarugas são uma parte muito importante da rede alimentar”, diz Elise Bennett, uma das advogadas do Centro de Diversidade Biológica. “Elas estão no planeta por cerca de 300 milhões de anos e ajudaram a manter a saúde dos rios e lagos eliminando caracóis, plantas aquáticas e criaturas mortas. O fato de que alguém pode pegar quantas quiser é um grande problema”, conclui.
A bióloga Amity Bass, diretora da divisão de recursos costeiros do Departamento de Vida Selvagem e Pescas da Louisiana concorda com o posicionamento de Bennet e completa: “Precisamos dar um jeito nas nossas regulamentações e pensar em como torná-las mais atuais e significativas”.
O que não sabemos
É impossível saber quantas tartarugas da Louisiana foram tiradas da natureza para fins comerciais. Até agosto, o Estado não exigia que os compradores de tartarugas registrassem suas compras.
Papéis coletados pelo Serviço de Vida Selvagem e Pesca dos Estados Unidos, agência responsável por monitorar e proteger a vida selvagem, devem – teoricamente – ajudar a preencher pelo menos algumas lacunas. A informação divulgada revela que 17 milhões de tartarugas vivas e selvagens foram exportadas dos Estados Unidos entre 2012 e 2016 para fins comerciais; 16 milhões delas passaram por New Orleans.
A tartaruga-de-ouvido-vermelho, conhecida como “tartaruga de loja de dez centavos”, era predominante nas exportações, contabilizando 12.4 milhões. Outras espécies largamente capturadas e enviadas para fora de seu habitat foram: tartaruga mapa, tartaruga hieroglífica, tartaruga-pintada, apalone spinifera e tartaruga-víbora.
O Serviço de Vida Selvagem e Pesca reconhece que esses números não são muito confiáveis. Craig Hoover, responsável pela Divisão dedicada à proteção da vida selvagem em risco, diz que as inspeções dos carregamentos e as discussões feitas em vários workshops indicam que a maioria dessas tartarugas “selvagens” que são exportadas vem na realidade de fazendas de tartarugas na Louisiana, onde criar e vender filhotes é um grande negócio. Craig diz que quando a origem das tartarugas não é especificada, a categorização padrão é definida como “selvagem”, mesmo que seja evidente que ela veio de uma fazenda e, ele acrescenta, os próprios fazendeiros constantemente definem suas tartarugas como selvagens e não de cativeiro.
A documentação imprecisa traz à tona uma questão mais ampla que é do interesse de conservacionistas e cientistas: é difícil avaliar políticas existentes sem uma noção clara do que realmente está acontecendo. “Esse é o único dado que nós temos sobre exportações”, diz Elise Bennett. “É especialmente preocupante para pessoas que estão envolvidas na conservação de animais que os dados não são exatos e nem tão úteis como gostaríamos”.
Que menos tartarugas selvagens são exportadas do que os dados de comércio sugerem é uma boa notícia, mas isso não significa que elas estão a salvo.
Capturadas antes de se reproduzirem
A maioria das tartarugas de Louisiana não está na lista de animais vulneráveis de extinção da União Internacional para a Conservação da Natureza, organização que define o status da conservação da vida selvagem; mas especialistas em tartarugas se preocupam que a captura inconsequente possa colocá-las em uma situação de risco.
As tartarugas de água doce são grandes alvos de exploração porque podem demorar até 20 anos para amadurecerem sexualmente e seus ovos e filhotes são presas para vários predadores, como pássaros e guaxinins.
A petição preenchida em outubro cita um estudo de 1997 que mostra que as tartarugas-de-ouvido-vermelho que vivem em locais protegidos nos Estados Unidos são maiores e em mais quantidade do que as tartarugas em Louisiana, sugerindo que os caçadores visam conseguir as adultas para vendê-las como animais domésticos e comida.
Peter Paul van Djik, diretor do programa de cágados e tartarugas de água doce do Conservation International, explica que as tendências relacionadas às tartarugas na China mudam rápido, e esse é o mercado que basicamente movimenta o comércio de tartarugas. Por isso, é possível que as futuras demandas por espécies que não estão em cativeiro hoje podem ameaçar novas populações selvagens da espécie no futuro, informou a National Geographic.
Enquanto o governo continuar falhando no monitoramento e proteção das tartarugas as perdas podem ser extremas.
“Nós aprendemos há 100 anos que a caça era uma má ideia que levaria à eliminação de populações de animais selvagens. Você não precisa olhar tão longe para comprovar isso, veja o quase desaparecimento do bisonte americano e a total extinção do pombo-passageiro, uma vez o pássaro mais abundante da Terra”, diz Michael Forstner, um biólogo a Texas State University.
Nota da Redação: Infelizmente, estas tartarugas são apenas algumas vítimas da contínua exploração e assassinato de animais em todo o mundo para satisfazer os paladares e outros caprichos humanos retrógrados e cruéis. Enquanto as pessoas continuarem a financiar esta barbaridade, inúmeras espécies serão dizimadas pela falta de compaixão e respeito com outros seres vivos que também possuem direitos e devem ser preservados.