Por Patricia Tai (da Redação)
Chris Donohue, um americano que vive em Nairobi, estava dirigindo com sua esposa e filhos pelo Parque Nacional de Nairobi quando encontrou um avistamento ingrato: o corpo de um rinoceronte sem vida, sem o seu chifre – que havia sido arrancado, e com o seu estômago aberto. Ele disse que a visão lhe dava náuseas e foi algo traumático. As informações são do Washington Post.
“As crianças perguntaram: ‘Papai, aquele rinoceronte está doente?’. E respondemos que não, que ele tinha sido caçado”, contou Donohue, que costuma leva seus filhos a este parque várias vezes por ano.
Caçadores fortemente armados mataram a rinoceronte fêmea que estava grávida, enquanto esta descansava perto de uma fonte de água. Foi o primeiro assassinato de um rinoceronte no Parque Nacional de Nairobi nos últimos seis anos, segundo informações do Serviço de Vida Selvagem (Kenya Wildlife Service – KWS) do Quênia.
“Isso mostra até onde os criminosos estão dispostos a se arriscar”, disse Paul Udoto, porta-voz do departamento. “Estamos levando isso muito a sério pois é um novo nível de caça, e muito ousado”, acrescentou, referindo-se ao fato dos crimes estarem ocorrendo em um Parque que antes era considerado mais seguro.
A morte é o mais recente caso a ilustrar uma tendência preocupante, já que a demanda na China e outros países asiáticos pelo chifre de rinocerontes e pelo marfim obtido das presas de elefantes está aumentando. No Quênia, estima-se que vinte e nove rinocerontes tenham sido mortos por caçadores no ano passado. Neste ano, já foram mortos trinta e cinco até agora.
Uma das razões pelas quais os caçadores não hesitam em ir adiante com as matanças ilegais é que as leis anti-caça do Quênia são antiquadas e fracas. Quando quatro chineses se declararam culpados em Janeiro mediante acusações de contrabando de marfim, eles não foram presos e apenas tiveram de pagar uma fiança de menos de 400 dólares cada um, valor insignificante diante das dezenas de milhares de dólares que o marfim rende a eles quando vendido na Ásia.
No entanto, isso pode vir a mudar. O Parlamento do Quênia deverá se reunir no próximo mês para aprovar um projeto de lei no sentido de aumentar o tempo de prisão e as multas nestes casos.
O projeto de lei prevê uma multa mínima de aproximadamente 115 mil dólares, ou uma prisão de no mínimo quinze anos – “ou ambas” – para quem cometer crimes contra espécies ameaçadas de extinção. Aqueles que estiverem portando “troféus” (partes de corpos de animais) pagarão uma multa de quinze mil dólares ou cumprirão cinco anos de prisão – ou ambos. Caçadores “esportivos” também enfrentarão penalidades mais duras.
“Isso é importante pela simples razão de que um dos maiores desafios são as penas brandas que temos”, disse Martin Mulama, chefe do escritório de preservação Ol Pejeta, um santuário animal particular próximo ao Quênia que mantém elefantes e rinocerontes. “Se isso for adiante, vai haver uma intimidação à caça”, complementou Mulama.
A Casa Branca anunciou no último mês que o tráfico de vida selvagem é um mercado multibilionário que está dizimando as populações de animais emblemáticos da África. O Presidente Barack Obama, durante uma viagem à Tanzânia em Julho, país vizinho do Quênia, anunciou que investirá dez milhões de dólares no combate ao tráfico de produtos da vida selvagem da região, sendo que três milhões serão destinados ao Quênia.
“Nós estamos tentando o nosso melhor para sensibilizar os quenianos a olhar para a vida selvagem como se estivessem olhando para uma pessoa”, disse o Presidente, que continuou: “Esta é nossa herança. Todos nós temos um papel a desempenhar…Por mais que a demanda venha da China e da Ásia, são os moradores locais que realizam o ato da caça”.
Após tantas mortes, o governo do Quênia finalmente parece estar aumentando suas defesas aos animais. No início deste mês, ele anunciou a formação de uma unidade interagências para ser implantada em pontos de mais alta incidência de caça furtiva.
“Ações urgentes e decisivas precisam ser tomadas para eliminar o aumento em escala da caça, que agora tornou-se também uma questão nacional e econômica”, declarou Judi Wakhungu, secretária de Gabinete do Ministério de Meio Ambiente e Recursos Naturais e Hídricos.
O Quênia perdeu 190 elefantes neste ano. Ao longo dos últimos três anos, cerca de 1.000 elefantes foram mortos por caçadores furtivos. Recentemente, um guarda foi ferido por arma de fogo de caçadores no Parque Nacional Lake Nakuru.
Donohue, o americano cuja família viu o rinoceronte morto na semana passada, teme que as suas visitas habituais ao Parque nunca mais sejam as mesmas.
Quando eles saíam do Parque, viram guardas armados a pé, protegendo outro rinoceronte. Mais tarde passaram por um jipe cheio de caçadores armados, com feições opressoras.
“Meu filho mais novo, de 3 anos de idade, enquanto nós estávamos dirigindo para longe do rinoceronte morto, me disse: ‘Papai, todos os rinocerontes devem estar mortos’ “, conta Donohue, que disse acreditar que, se as coisas continuarem assim, em breve isso será verdade.