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Atlas da Carne: uma breve resenha

18 de outubro de 2016
3 min. de leitura
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Reprodução / Heinrich Böll Stiftung
Reprodução / Heinrich Böll Stiftung

O Altas da Carne é uma publicação de 68 páginas da Fundação alemã Heinrich Böll Stiftung. Editado em alemão em 2013, saiu agora a versão em português (disponível gratuitamente pela internet).
Na introdução é anunciado que não se trata de uma campanha vegetariana, mesmo porque, “na equipe do escritório da fundação no Brasil todos e todas comem carne. Por outro lado, quase todos procuramos comer menos carne”. A proposta do Atlas é romper com a alienação reinante em relação àquilo que está em nossos pratos e fazer as conexões globais daquilo que mobilizamos quando comemos. A forma como vem sendo feito o consumo de carne e seus derivados é reprovado da primeira à última página. São feitas denúncias gravíssimas, bem fundamentadas com dados, gráficos/infográficos e tabelas. A iniciativa é louvável, pois organiza e atualiza muitas informações, o que não é garantia de mobilização das pessoas para uma urgente mudança de rota.
Nele somos chamados de “coprodutores”, atores conscientes dentro desse sistema alimentar “que toma decisões coerentes ao saber como os alimentos são produzidos e quem os produz”. Então, o que levaria as pessoas a diminuir ou, quem sabe, abolir o consumo de carne? O apelo ambiental ou da saúde teria essa força? Acredito que poucas pessoas são altruístas o suficiente a ponto de fazer a renúncia de um hábito tão arraigado culturalmente, em nome do meio ambiente. Saúde? É possível ter boa saúde comendo com moderação esses produtos. Não necessariamente uma dieta saudável, mas a proposta do Atlas é uma dieta sustentável. Ela seria capaz de proteger a biodiversidade e os ecossistemas, além de ser economicamente justa e acessível, nutricionalmente adequada e por otimizar os recursos naturais e humanos. Ainda assim, os autores levantam um problema. Essa dieta seria viável para as populações de alto poder aquisitivo que têm acesso a mercados alternativos, o que não aconteceria e nem acontece com as populações de baixa renda dos grandes centros urbanos, que estão nas mãos dos poucos, grandes e poderosos fornecedores. No mundo industrializado “é mais fácil comer um hambúrguer do que uma salada”, afirmam.
Ao longo do documento, não identificamos a chave capaz de fazer a mudança, que é o estranhamento ético em relação a toda essa fria maquinaria industrial. Apesar das muitas conexões, uma ausência é sentida: a do animal, sujeito de uma vida, razão de ser de todo o complexo sistema denunciado. Os animais, leia-se, vacas, bezerros (vitelo), porcos, galinhas, coelhos etc. são lidos e interpretados como um bem natural renovável. Para fazer tudo que é feito na indústria, sem nenhum constrangimento moral e ético, o animal não pode ser animal, como é o seu cachorro ou gato, capaz de sentir dor como eu e você. Eles são denominados “carne”, “conversores de alimentos”, mercadoria, commodities.
No Atlas da Carne, citam, contudo, de forma sucinta, alguns grupos e organizações ao redor do mundo que defendem o bem-estar animal. Também sugerem a criação de normas para que os animais “pudessem ser mantidos em rebanhos ou manadas que lhes permitam circular sem impedimentos e desenvolver suas hierarquias e relações sociais naturais. Essa iniciativa “acabaria com os estábulos sem luz natural ou ar fresco, muito comuns na indústria da pecuária” (p.61). A sugestão é, por si só, uma aceitação de que os animais destinados ao abate pela indústria não são massas amorfas e indiferentes a tudo que acontece com eles.
Tanta informação e denúncia podem ter o efeito contrário. Temo pelos animais que, de forma ininterrupta e veloz, encontram-se, agora e no amanhã, na fila de espera da linha de desmontagem de suas vulneráveis vidas. Padecem cada vez mais com a ganância desmedida daqueles que, de algum modo, não se saciam e que não conhecem os limites. Sabemos que os interesses econômicos, aliados à tecnociência, darão respostas eficientes e eficazes para os problemas ambientais e de saúde e, como é de se esperar, falarão mais alto que a moral e a ética.

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