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REFLEXÃO

Ativista Txai Suruí fala sobre ações urgentes para frear crise climática

9 de maio de 2022
7 min. de leitura
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Foto: Divulgação

Foi em outubro de 2021, em Glasgow, na Escócia, que o mundo conheceu uma brasileira com discurso forte, que cobrava ações urgentes para conter os avanços das mudanças climáticas. Misturando referências dos Racionais Mc’s com Ailton Krenak, Txai Suruí foi a única brasileira e indígena latino-americana a discursar na abertura da 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 26).

Desde então, a curiosidade sobre quem era aquela jovem, hoje com 25 anos, se espalhou pelos quatro cantos. Dentro e fora do Brasil, líderes de governos, famosos, a imprensa, movimentos sociais e ambientais se debruçaram para saber mais sobre a vida e as lutas de Txai, que é criadora do movimento Juventude Indígena de Rondônia, coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé e mais recentemente se tornou jovem conselheira do Pacto Global da ONU.

Em todos os lugares que frequenta — como ela diz, não tem parado quieta —, leva consigo a responsabilidade de defender pautas que julga fundamentais para pensar um outro Brasil, com mais respeito à floresta e aos povos que nela vivem. Entre elas, a demarcação de terras indígenas.

Filha da indigenista Neidinha Suruí e do cacique Almir Suruí, dois grandes expoentes quando o assunto é defesa dos povos originários e do meio ambiente, Txai acredita que para contornar a crise ambiental será necessário um esforço coletivo de todos os setores da sociedade e o fortalecimento das leis e órgãos ambientais no país. Mas diz ser urgente reconhecer, também, o papel desempenhado por indígenas que mantêm a floresta de pé.

“Quando se preserva uma terra indígena, se preserva o meio ambiente. Nossos territórios são as melhores barreiras contra o desmatamento”, diz nesta entrevista a Ecoa.

Ecoa – Na sua opinião, quais são os temas mais urgentes hoje no Brasil?

Olha, muita coisa. Nós estamos totalmente na contramão de tudo, principalmente quando falamos em questões ambientais, em mudanças climáticas. O Brasil prometeu, por exemplo, acabar com o desmatamento até 2028, mas a realidade é outra. Na verdade, os ataques ao meio ambiente têm aumentado. Por isso, acho importantíssimo fortalecer as leis ambientais e os órgãos ambientais do país — o Brasil precisa respeitar os povos originários. É preciso entender a importância dos indígenas quando falamos em cuidar do meio ambiente.

Uma das principais demandas do movimento indígena hoje é a demarcação de terras. Por que isso é importante para vocês e para o país?

Nós temos uma relação diferente com a terra. Faz parte de quem nós somos. O nosso território faz parte da nossa cultura, da nossa construção como comunidade. Uma coisa que está clara é a importância das pessoas para a preservação da floresta hoje. A gente tem que ter um olhar socioambiental.

Quando se preserva uma terra indígena, se preserva o meio ambiente. Nossos territórios são as melhores barreiras contra o desmatamento. E demarcar terras vai muito além da preservação. Nós também estamos criando soluções importantes que colocamos em prática dentro dos territórios para recuperar o que foi degradado.

Falando nisso, o seu povo tem criado estratégias de desenvolvimento sustentável nas aldeias. O que tem sido feito por aí que você gostaria de ver replicado pelo país?

Desde 2005 nós trabalhamos com reflorestamento da nossa área porque sabemos que é importante devolver para a floresta aquilo que tiramos dela. Também produzimos café sustentável, por exemplo, com cacau, com castanha. Nós vemos que manter a floresta em pé é muito mais lucrativo. Estamos inclusive utilizando áreas que foram degradadas quando houve invasão nas nossas terras para criar nossas roças.

São sistemas agroflorestais que geram produtos orgânicos de qualidade que alimentam nosso povo e as pessoas de fora também, já que conseguimos parcerias para levar esses produtos para mais lugares. Nosso sonho é construir um Brasil com qualidade de vida para todo mundo, levando essas soluções que encontramos para todos.

Você é filha da indigenista Neidinha Suruí e do cacique Almir Suruí, conhecidos pela luta em defesa do meio ambiente e dos povos indígenas. Como foi crescer com esses exemplos em casa?
É uma responsabilidade bem grande, né? (risos). Mas eles são meus maiores exemplos. São minha inspiração. Aprendi tudo com eles. Na nossa cultura, aprendemos tudo com os mais velhos, com nossos pais, avós, tios, todos eles me passaram muito ensinamento.

Principalmente o olhar para o coletivo. Me ensinaram a olhar para a floresta como vida, a olhar para os animais como vida, a respeitá-los, a viver em harmonia com eles. Me ensinaram a cuidar da natureza assim como ela cuida da gente.

Você e seus pais sofreram e ainda sofrem ameaças graves. Faz dois anos que um amigo seu, o ativista indígena e ambiental Ari Uru-Eu-Wau-Wau, foi morto. Por que defender o meio ambiente é tão perigoso aqui?

Eu acho isso acontece porque o Brasil é um país que ainda tem uma visão de que destruir floresta é sinônimo de progresso. E quem defende a floresta de pé é visto como atrasado, como um empecilho para o progresso.

Aqui ainda se tem um olhar muito colonizador, especialmente em relação ao indígena. Olha tudo o que está acontecendo com os ianomami, e o Brasil não se revolta. E sabe por quê? Porque não olha para o indígena como ser humano. A nossa vida não vale nada aqui.

Recentemente, você esteve no Acampamento Terra Livre (ATL). Como foi estar lá? Tem algo que você viu ou ouviu que te impactou mais e que gostaria de compartilhar com mais gente?

Foi muito importante lembrar que estamos em ano eleitoral e mostrar a importância de apoiar candidaturas indígenas — e também lembrar pessoas não indígenas a votarem nessas candidaturas. Mas o que mais me impressionou foi a quantidade de jovens lá. Isso mostra a força da juventude.

Qual tem sido o papel e a importância dessa juventude para a causa ambiental?

Eu acho que a juventude é esperança, principalmente nesses momentos em que muitas vezes a gente desanima. Porque quando falamos em mudanças climáticas, degradação do meio ambiente, estamos falando do fim do mundo. Pelo menos o fim do nosso mundo. A juventude entendeu que algo precisa ser feito agora. Não é uma questão de futuro, é de presente. Nós estamos sofrendo as consequências. Para mim, a juventude traz a força necessária para que haja mudança.

E o que de mais urgente precisa ser feito para conseguirmos reverter esse fim do mundo?

Eu não sei o que é mais urgente, mas acho que a gente precisa de ações radicais. Temos medo dessa palavra, né? Mas acho que vamos precisar ser radicais. É preciso demarcar terras indígenas, fortalecer nossas leis e órgãos ambientais, precisamos do esforço de toda a sociedade. As empresas precisam mudar o jeito de agir. Se não pararem de comprar produtos que são derivados do desmatamento ilegal, do genocídio indígena, isso tudo vai continuar.

E é preciso pensar nas pessoas. Temos que pensar em mudanças climáticas, mas principalmente nas pessoas que já estão sendo afetadas e morrendo por causa delas. Eu acho que muitas pessoas ainda não começaram a agir porque a água não bateu na bunda delas, né? O que aconteceu em Minas Gerais, em Petrópolis, na Bahia são as consequências das mudanças climáticas que já estamos vendo hoje. Quem está sendo afetado com tudo isso são populações vulnerabilizadas, mas logo, logo essa água vai bater na bunda de todo mundo.

Por fim, o que você falaria para os governantes que serão eleitos no fim do ano?

Eu acho que eles têm que olhar para o meio ambiente. Tem que olhar para as mudanças climáticas como uma pauta suprapartidária. Essa não pode ser pauta de um governo específico, de um candidato específico. Olhar para o meio ambiente vai além de ser de esquerda ou de direita. É qualidade de vida para todo mundo. Os políticos precisam ouvir o povo, escutar as pautas dos povos indígenas, da juventude, das mulheres, dos negros… Escutar o que temos a dizer para construir um país melhor para todos.

Fonte: UOL

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