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RISCO DE EXTINÇÃO

Até 2100, mais de 80% das espécies de anfíbios do Pantanal e entorno perderão áreas adequadas

Estudo realizado por pesquisadores do Brasil e da Suíça prevê que, mesmo em cenário otimista de emissões de gases do efeito estufa, haverá perda em 99% da área da bacia do Alto Paraguai

18 de fevereiro de 2025
André Julião | Agência FAPESP
4 min. de leitura
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O sapo-de-barriga-vermelha (Melanophryniscus fulvogutatus) pode desaparecer do Pantanal devido às mudanças climáticas. Foto: Diego Santana

Estudo publicado no Journal of Applied Ecology aponta que a bacia do Alto Paraguai, que inclui o Pantanal e seu entorno, pode perder quase todas as áreas adequadas para a vida de anfíbios anuros (sapos, rãs e pererecas) até o fim do século.

Ao cruzar um banco de dados sobre localização das espécies da região com as projeções climáticas para 2100, pesquisadores do Brasil e da Suíça concluíram ainda que mais de 80% das espécies desse grupo perderão áreas adequadas.

O trabalho teve como primeiro autor Matheus Oliveira Neves, que o realizou durante doutorado na Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT).

Segundo a pesquisa, as unidades de conservação integral, que correspondem a meros 5,85% do território, protegem, em média, menos de 5% da distribuição geográfica dos anfíbios.

Em 2022, como estratégia para frear a extinção de espécies, a Convenção da Biodiversidade da Organização das Nações Unidas (ONU) recomendou que 30% da superfície terrestre fosse coberta por áreas protegidas até 2030.

Atualmente, esse índice é de 17%, e engloba tanto unidades de conservação como terras indígenas.

Considerando os dados sobre biodiversidade de anfíbios, os autores do estudo propõem a criação de novas unidades de conservação na bacia do Alto Paraguai, em locais que serão mais adequados no futuro para esse grupo de animais, altamente dependente da umidade.

“As unidades de conservação de proteção integral atualmente protegem muito pouco as espécies de anfíbios do Pantanal, a maior planície inundável do mundo. É preciso expandir as áreas protegidas, considerando o cenário de um futuro mais quente e seco”, conta Mario Ribeiro Moura, que coordenou o estudo durante o período que passou como pesquisador do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB-Unicamp), onde foi apoiado pela FAPESP.

Atualmente, Moura é professor na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). No estudo, seu grupo considerou dois cenários de mudanças climáticas, seguindo as projeções do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). No otimista, as emissões seguiriam as mesmas do presente, o que acarretaria um aumento de 2 °C na temperatura média global até 2100. No pessimista, com um aumento das emissões, a elevação seria de 4 °C.

Foram utilizados mais de 4 mil registros de ocorrência das 74 espécies de anfíbios conhecidas da bacia do Alto Paraguai, que além do Pantanal, no Brasil, inclui partes do Paraguai e da Bolívia.

Futuros possíveis

As poucas áreas que seriam adequadas para abrigar anfíbios no futuro, tanto no cenário otimista quanto no pessimista de emissões, se encontram atualmente no norte da bacia do Alto Paraguai, na transição com o Cerrado, próxima a Cuiabá (MT), e no sudeste da região, perto de Campo Grande (MS), além da parte sudoeste, próxima ao Chaco paraguaio.

Entre as áreas protegidas atuais, nenhuma demonstrou uma riqueza de anfíbios maior do que a esperada para o cenário climático presente, embora seis delas (8,2%) tenham uma riqueza significativamente menor do que se esperava. A comparação foi feita com áreas não protegidas, de igual tamanho e formato, escolhidas aleatoriamente.

As projeções para o futuro indicam ainda um ganho de espécies maior do que o esperado em cinco delas (6,8%) no cenário otimista e em três (4,1%), no pessimista. No entanto, em duas e três (2,7% e 4,1%), respectivamente nos cenários otimista e pessimista, a perda de espécies é maior do que se esperaria.

“Em resumo, apenas 13,7% das áreas protegidas atuais na bacia do Alto Paraguai demonstram um potencial de abrigar mais ou perder menos espécies em pelo menos um cenário futuro. A maioria dessas áreas são terras indígenas”, explica Moura.

Embora os pesquisadores defendam a criação de novas unidades de conservação integral e a ampliação das atuais, eles ressaltam a necessidade de mitigar os impactos de práticas agropecuárias inadequadas e promover a restauração de ecossistemas aquáticos.

“Enquanto o Acordo de Paris previa conter o aumento da temperatura global em 1,5 °C até o fim do século, já experimentamos esse patamar em 2024. A mudança no modelo econômico, atualmente baseado em consumo de combustíveis fósseis, precisa ser radical para mitigar os impactos da catástrofe climática sobre a biodiversidade e a sociedade”, encerra Moura.

Fonte: Agência FAPESP

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