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CRIME AMBIENTAL

'Assassinato covarde', diz pesquisador sobre onça morta com 50 tiros de chumbinho

Máscara, como era chamada a onça monitorada pelo ICMBio, caçava em propriedades rurais porque estava com um ferimento na pata direita que a fazia mancar, impedindo que conseguisse caçar presas no habitat

13 de agosto de 2021
Mariana Dandara | Redação ANDA
5 min. de leitura
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Máscara era monitorado por projeto ambiental (Foto: Beatriz de Mello Beisiegel/ICMBio)

A morte de uma onça-pintada encontrada com mais de 50 perfurações de chumbinho no interior de São Paulo pode ter sido vítima de algum morador da região onde o crime aconteceu. Máscara, como era chamado o animal monitorado por um projeto ambiental, foi encontrado sem vida em um córrego no limite entre os municípios de Guapiara e Capão Bonito.

Ameaçada de extinção, a onça era protegida por um projeto realizado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) em parceria com a Fundação Florestal. O corpo perfurado pelos tiros foi localizado em 5 de julho às margens da Rodovia Penteado de Camargo (SP-250). Agora, mais de um mês depois, descobriu-se que Máscara havia entrado em fazendas e matado animais para comer, o que pode ter sido a motivação de sua morte.

A aposentada Adelita Pereira dos Santos é uma das moradoras da região que se deparou com Máscara no sítio onde vive. Ela lamenta que tenham cometido tamanha crueldade contra a onça, ceifando sua vida. “Desde quando eu vim pra cá, eu já sabia que tinham onças, mas nunca me prejudicou em nada”, relatou a moradora ao G1. Os acidentes passaram a acontecer de fevereiro deste ano em diante. Segundo Adelita, dois cachorros foram mortos pela onça, que também matou  “galinha, perus, patos e gansos”.

Preocupada com os animais criados na propriedade, Adelita buscou meios de protegê-los, mas como jamais cogitou tirar a vida da onça, recorreu aos pesquisadores do projeto ambiental, que foram até o sítio e instalaram cercas elétricas e luzes automáticas para afugentar a onça, que nunca mais retornou ao local. “Ela não apareceu mais. Sempre eles perguntavam, mas eu falava que nunca mais apareceu, e agora a bichinha apareceu morta”, lamentou a aposentada, que pede que a população tenha consciência e respeite os animais silvestres.

Borboleta pousou em uma das patas de Máscara após o animal ser morto (Foto: Fundação Florestal/Divulgação)

“Não matem. A onça-pintada está em extinção, então não matem, procurem alguém que saiba cuidar, avisem, como aconteceu comigo”,  disse. “Fiquei muito triste [quando a onça morreu]. De tanto os pesquisadores falarem das onças, eu já tinha os nomes delas decorados: o Máscara, Meio-dia, Dominó… São muito bonitas. Eu jamais imaginei que alguém teria essa coragem”, completou.

Pesquisadores do projeto realizado pelo ICMBio explicaram que Máscara caçava em propriedades rurais porque estava com um ferimento na pata direita que a fazia mancar, impedindo que conseguisse caçar presas no habitat. A ferida havia sido observada através das chamadas “armadilhas fotográficas” e, por conta do ferimento, o resgate da onça estava sendo planejado, mas não houve tempo de ser executado.

“Quando um animal fica prejudicado e não consegue mais caçar presas naturais por estar machucado, ele começa a caçar o que está mais fácil. Então, ele estava comendo patos e galinhas nas casas do entorno”, explicou ao G1 Beatriz de Mello Beisiegel, analista ambiental do ICMBio.

“As providências para contratação estavam sendo tomadas e, no dia de aprovação dos orçamentos para captura, alguém cruzou o seu caminho antes da equipe do projeto. Um assassinato covarde em um momento que o animal estava prestes a ser resgatado e tratado”, lamentou o pesquisador Thiago Borges Conforti, da Fundação Florestal. “Hoje se sabe que existem menos de 20 indivíduos de onça-pintada na Serra de Paranapiacaba. Agora resta menos um”, completou.

Máscara era considerado fundamental para a sobrevivência das onças-pintadas no Contínuo do Paranapiacaba, uma das três últimas áreas onde as onças conseguem sobreviver por um longo período. Com a morte do animal, uma nova estimativa populacional da espécie deve ser feita.

Onça-pintada foi encontrada morta em córrego (Foto: Fundação Florestal/Divulgação)

Exceto pelos tiros e as consequências das lesões, Máscara era saudável, conforme constatado em exame de necropsia. Os pesquisadores afirmam ainda que a onça viveu por pelo menos oito anos antes de ser morta. Eles suspeitam que ela tenha sido assassinada na área rural e transportada de veículo até uma ponte que corta a Rodovia Penteado de Camargo, de onde foi jogada em direção a um córrego.

De acordo com Thiago, a onça foi encontrada morta no dia 5 de julho às margens da Rodovia Penteado de Camargo (SP-250). A suspeita é de que ela tenha sido morta na área rural e transportada de veículo até a ponte na rodovia, de onde foi jogada para o córrego.

O caso foi denunciado à Polícia Federal, que instaurou um inquérito para investigar a denúncia. Matar animais silvestres é crime e pode ser punido com até um ano de reclusão. A pena pode ser aumentada se o animal estiver ameaçado de extinção, como é o caso de Máscara.

Responsável por gerenciar Áreas Protegidas Estaduais em todo o estado de São Paulo, a Fundação Florestal divulgou nota por meio da qual orientou os moradores que detectarem a presença de onças em suas propriedades a procurar as equipes locais das Áreas Protegidas imediatamente. “O diálogo certamente evita assassinatos desnecessários como esse”, diz o comunicado do órgão.

Armadilha fotográfica fez registros de Máscara (Foto: Laura Trujillo e Luís Palácios/Arquivo pessoal)

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