Em uma série de operações realizadas em dezembro de 2024, inspetores de vida selvagem do Departamento Florestal de Bangladesh desmantelaram uma rede de contrabando de tartarugas, resgatando mais de 2.100 animais vivos e expondo uma expansão preocupante do tráfico dessas espécies protegidas. As ações destacaram a crescente ameaça à biodiversidade do país, impulsionada pela demanda local e internacional por carne de tartaruga.
A primeira operação ocorreu no dia 28 de dezembro, quando inspetores, seguindo uma denúncia, interceptaram um ônibus intermunicipal em Dhaka, capital do país. Dentro do compartimento de bagagens, encontraram duas caixas contendo dezenas de tartarugas vivas.
O motorista do ônibus, Siddikul Islam, afirmou que cargas semelhantes são transportadas diariamente pela rota, com destino a Sherpur, no distrito de Bogura, onde empresas estrangeiras estão envolvidas em projetos de infraestrutura.
Dois dias depois, no dia 30 de dezembro, os inspetores localizaram um depósito temporário de tartarugas em um mercado úmido no distrito de Chandpur, próximo a Comilla. Lá, foram apreendidas 1.300 tartarugas de água doce vivas, pesando 280 kg no total.
As espécies encontradas — tartaruga-de-telhado-indiana, tartaruga-de-olho-indiano e tartaruga-de-carapaça-mole-indiana — são protegidas pela Lei de Conservação e Proteção da Vida Selvagem de Bangladesh, de 2012.
Essa não foi a primeira grande apreensão do mês. No dia 10 de dezembro, o Departamento Florestal havia invadido outro depósito em Chandpur, resgatando 800 quilos de tartarugas das mesmas espécies.
Sanaullah Patwary, diretor da Unidade de Controle de Crimes contra a Vida Selvagem (WCCU), expressou preocupação com o volume de apreensões em um curto período. “Isso indica uma expansão alarmante do comércio ilegal de tartarugas no país”, disse ele à Mongabay.
Demanda estrangeira e rotas de contrabando
Apesar da proibição do comércio de tartarugas desde 1998, a caça e o contrabando persistem, atendendo tanto ao consumo local quanto ao tráfico para a Índia. No entanto, as recentes operações revelaram rotas que conectam regiões distantes do país, sugerindo uma demanda crescente.
“Muitos estrangeiros estão em Bangladesh trabalhando em megaprojetos de infraestrutura. Suspeitamos que a demanda deles por carne de tartaruga tenha contribuído para esse aumento”, explicou Sanaullah.
Sherpur, destino da carga interceptada, é um ponto estratégico para o transporte de tartarugas para distritos do norte, como Rangpur e Dinajpur, onde empresas chinesas atuam em projetos de construção. Já em Pabna, uma força de trabalho russa está envolvida na construção da primeira usina nuclear do país.
Asim Mallick, inspetor da WCCU, acrescentou que há evidências preliminares de que tartarugas vivas e partes de carapaças estão sendo contrabandeadas para a Índia a partir de distritos fronteiriços do norte.
Impacto na biodiversidade e alerta para extinção
Bangladesh, com sua vasta rede de rios e corpos d’água, abriga uma rica diversidade de tartarugas de água doce. No entanto, a perda de habitat devido à piscicultura comercial e a caça descontrolada estão colocando essas espécies em risco.
Shafique Haider Chowdhury, professor aposentado de zoologia e revisor técnico da Lista Vermelha de Bangladesh de 2015, alertou que o tráfico desenfreado pode levar espécies atualmente estáveis à categoria de ameaçadas. “Se nada for feito, a próxima Lista Vermelha, prevista para 2025, pode classificar todas as tartarugas de Bangladesh como ameaçadas”, afirmou.
As tartarugas de água doce desempenham um papel crucial na manutenção do equilíbrio ecológico, agindo como predadoras e necrófagas. Sua extinção teria impactos devastadores nos ecossistemas aquáticos do país.