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EFEITO INDESEJADO

Anúncio da criação de zona de desenvolvimento sustentável na divisa do AC, AM e RO fez desmatamento disparar

Depois do lançamento do projeto em 2018 a área abrangida respondeu por 76% do desmatamento do total dos três estados em 2022

22 de junho de 2024
Evanildo da Silveira
7 min. de leitura
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Foto: Getty Images

A intenção parecia louvável: levar o desenvolvimento agrícola e pecuário para o oeste da Amazônia sem destruir o ambiente. Mas aconteceu o oposto. Em 2018, o governo federal anunciou o projeto de criar a Zona de Desenvolvimento Sustentável Abunã-Madeira (ZDS Abunã-Madeira), numa área de 458 mil quilômetros quadrados – ou cerca de 10% da Amazônia brasileira – na confluência do Acre, Amazonas e Rondônia. Ao contrário do que se queria, no entanto, o desmatamento do território disparou e em 2022 representou 76% do registrado nesses três estados.

Os dados são de um estudo realizado por pesquisadores brasileiros e publicado na revista Perspectives in Ecology and Conservation. “Estávamos analisando a expansão da fronteira agrícola no Brasil e notamos que havia uma dinâmica de avanço na Amazônia, especialmente naquela região do projeto”, conta o geógrafo Michel Eustáquio Dantas Chaves, do câmpus de Tupã, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), um dos autores do trabalho. “Da análise que fazíamos de áreas de expansão da fronteira agrícola surgiu a hipótese de que, na região na qual se pretende criar a ZDS Abunã-Madeira, está acontecendo uma dinâmica similar à ocorrida na realidade geográfica do Matopiba.”

A palavra é um acrônimo, que designa uma região formada por partes dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Originalmente coberta pelo Cerrado, a área foi severamente impactada pelo avanço da monocultura da soja nas últimas décadas. “Os dados do nosso estudo sobre a ZDS Abunã-Madeira mostravam que havia tendência de expansão do arco do desmatamento para áreas mais conservadas localizadas nas porções Oeste e Norte do bioma amazônico, com a conversão de florestas em pastagens e áreas agrícolas”, explica do cientista ambiental Felipe Gomes Petrone, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), outro autor da pesquisa.

Daí surgiu a hipótese de que a intenção de criar a ZDS estaria estimulando especulação fundiária, degradação florestal e desmatamento. O objetivo do trabalho foi então comprová-la, ou seja, verificar se a região onde se pretende instalar a ZDS Abunã-Madeira está, realmente, se tornando um hotspot de degradação florestal e desmatamento. “O objetivo foi alcançado”, garante Chaves. “Conseguimos fazer essa avaliação. A hipótese foi confirmada: os níveis de degradação florestal e desmatamento aumentaram desde o anúncio do projeto, em 2018.”

A pesquisa abrangeu os 32 municípios contidos no projeto para receber a ZDS Abunã-Madeira. Em complemento, os pesquisadores também analisaram os 16 municípios que fazem fronteira imediata com eles para verificar como estava o cenário fora da área abrangida. “Para fazer o estudo, unimos dados sobre desmatamento, disponibilizados pelo Projeto de Monitoramento de Desmatamento na Amazônia Legal por satélite (Prodes), desenvolvido pelo Inpe; uso e cobertura da terra, disponibilizados pela plataforma MapBiomas; e degradação, fornecidos pelo Centro Comum de Pesquisa da Comissão Europeia (JRC)”, explica Petrone.

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