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ESTUDOS

Antártica guarda todos os segredos do clima

Estratégico para a compreensão das mudanças climáticas, o Continente Gelado é prioridade de cientistas do mundo todo. O Brasil está na vanguarda desses estudos, que podem ajudar a prever fenômenos extremos, como as enchentes no Sul

1 de julho de 2024
Vinicius Doria
6 min. de leitura
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Foto: amanderson2 | Wikimedia Commons

O desastre ambiental que destruiu o Rio Grande do Sul, em maio, elevou a crise global das mudanças climáticas a um grau de preocupação inédito no Brasil e estendeu a toda a sociedade o debate sobre prevenção e mitigação de danos causados por eventos extremos da natureza. Na tragédia gaúcha, o número de mortes pode passar de 200 — são 179 confirmadas até ontem e 34 pessoas ainda estão desaparecidas. Diante de tanta destruição, será possível, um dia, prever eventos extremos a tempo de mobilizar estruturas de atendimento antes que tragédias se instalem? Os cientistas dizem que sim.

Uma das chaves para entender como as mudanças climáticas impactam o Brasil está a 3,6 mil km de distância de Porto Alegre e atende pelo nome de Estação Antártica Almirante Ferraz. O Continente Antártico e os mares que o circundam guardam muitas informações fundamentais sobre o clima do planeta e, em particular, do Brasil. Diante do aquecimento global e dos desafios que essas alterações impõem a governos do mundo todo, a presença brasileira na Antártica vem se tornando cada vez mais estratégica, tanto do ponto de vista da ciência, quanto da importância geopolítica da região.

O verão deste ano registrou a segunda menor extensão de gelo marinho já observada até hoje, cerca de 2 milhões de km², uma área 30% menor do que a média anual registrada ao fim dos verões de 1981 a 2010. A maior perda de gelo foi registrada no ano passado, quando a área congelada não chegou a 1,8 milhão de km². Para a comunidade científica, esse desequilíbrio está diretamente ligado ao aquecimento global e serve como mais um aviso de que não dá para protelar a adoção de medidas para enfrentar a emergência climática.

O Correio Braziliense conversou com pesquisadores e militares ligados às pesquisas na Antártica para entender a importância da presença brasileira na região. Em um ponto, há consenso: o primeiro alerta sobre eventos climáticos extremos com potencial para atingir o país virá, na maioria das vezes, do Polo Sul, potente fábrica de frentes frias e de massas polares que chegam até o Brasil, afetando o tempo do campo e das cidades. Por isso, apontam a importância estratégica de estudar não só o clima e a atmosfera da região, mas também o comportamento do Oceano Austral, a biodiversidade da região e a dinâmica do gelo polar, que preserva uma infinidade de dados sobre a história do planeta.

“Nós nos preocupamos muito com o que acontece na Amazônia — e devemos nos preocupar com isso —, mas a distância de Pelotas (RS) para Tefé, no coração da Amazônia, é de 3,4 mil quilômetros. É a mesma distância de Pelotas até a Antártica. Se nós nos preocupamos com o que acontece na Amazônia e com seus impactos no território brasileiro, nós também devemos nos preocupar com o que acontece na Antártica. O Brasil é o sétimo país mais próximo do Continente Antártico. Precisamos entender o que acontece lá para buscar a correlação com o que acontece no nosso território. E isso só se consegue com ciência e pesquisa”, explicou o secretário da Comissão Interministerial dos Recursos do Mar, contra-almirante Ricardo Jaques Ferreira, ao Correio.

Nesse aspecto, o Brasil é veterano. As pesquisas científicas na Antártica são feitas, de forma quase ininterrupta, há mais de 40 anos, antes mesmo da inauguração da Estação Comandante Ferraz, em 1984. O direito de instalar uma base científica avançada no Sul do planeta foi conquistado ainda em meados dos anos 1970, quando o país aderiu ao Tratado da Antártica, um consórcio de 29 nações com direito de fixar presença e patrocinar pesquisas na região. Desde 1983, o Brasil é membro consultivo do tratado.

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