A iniciativa surgiu da união de esforços entre o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Unep) e a The Agreement on the Conservation of Populations of European Bats (EUROBATS), tratado europeu de preservação desses animais. “O desconhecimento é a principal ameaça aos morcegos. É uma associação de má reputação com pouca informação”, afirma Enrico Bernard, professor adjunto em Biologia da Conservação do Departamento de Zoologia da Universidade Federal de Pernambuco.
O pesquisador conta que diversas ações estão sendo realizadas com a iniciativa do Ano, tais como a divulgação de publicações, atualização da lista de espécies brasileiras, bancos de informações sobre os sinais de ecolocalização dos morcegos e parcerias com a Sociedade Brasileira para o Estudo de Quirópteros. “A estratégia é comunicar melhor o papel dos morcegos. Sair na mídia chama a atenção e cria um ciclo virtuoso”, opina.
No entanto, Ludmilla Aguiar, uma das coordenadoras do Programa para a Conservação dos Morcegos Brasileiros (PCMBr), alerta para a pouca divulgação em geral e a baixa educação ambiental no Brasil, o que dificulta ainda mais a preservação desses animais. “Minha obrigação não é relatar minhas pesquisas só para meus colegas, pois eles podem vê-la numa revista científica. Mas se ela ficar só ali, na revista científica, eu não terei cumprido minha função com o dinheiro público”, explica.
Ela também destaca um fator econômico desfavorável ao mamífero: pelo fato de o Brasil ser um país agrícola, o morcego é visto como uma ameaça. “O Brasil é comandado pela agricultura, é só ver o que está acontecendo com o Código Florestal”, ressalta. A pesquisadora avisa que “qualquer pessoa que trabalhe com morcegos pode atuar na divulgação do Ano Internacional do Morcego”.
Aguiar foi a responsável pela criação, há mais de 15 anos, da revista Quiróptero Neotropical, que recebe colaborações de estudiosos do mundo inteiro e ajudou o Brasil a se inserir no mapa internacional de pesquisadores de morcegos. Atualmente, o País está entrando numa rede latino-americana de estudiosos do animal e sediará em 2013, em Brasília, o Encontro Brasileiro de Estudantes de Quirópteros (EBEQ).
Ecossistema das cavernas – Os dois pesquisadores sublinham a enorme importância dos morcegos para o ecossistema cavernícola, já que são os responsáveis por levar recursos para dentro desses locais. “Muitos dos animais que vivem ali não saem das cavernas. O morcego leva o material orgânico em forma de guano”, revela Bernard.
Ludmilla Aguiar lembra também o serviço que o animal presta como polinizador de plantas e dispersadores de sementes, como acontece com o pequi e o maracujá silvestre. Ela conta que os morcegos são “adorados” no México porque são grandes polinizadores de agave (planta a partir da qual é feita a tequila). Além disso, comem pragas agrícolas e insetos que fazem mal aos humanos, e são úteis para pesquisas em ecolocalização, por exemplo.
Os estudiosos revelam que, com a instrução normativa do Ibama que rebaixou o nível de proteção das cavernas brasileiras, esses animais ficaram ainda mais ameaçados, sobretudo em biomas como o Cerrado e a Mata Atlântica. “Basta ter um caso de animal infectado por raiva que as pessoas querem eliminar os morcegos”, conta Bernard. A queima de pneus, a inundação de cavernas e a vedação de suas entradas são medidas para combatê-los que acabam afetando todo o ecossistema cavernícola. “Há milhares de espécies dentro das cavernas, de insetos a bactérias, muitos nem descobertos ainda”, lamenta o pesquisador, que lembra que a região onde será construída a Usina de Belo Monte concentra cavernas importantes.
Brasil, segundo maior em espécies – Bernard revela também que o Brasil é o segundo país em diversidade de espécies de morcegos, com cerca de 170, “caminhando para a primeira posição”, hoje ocupada pela Colômbia. A África é o continente com mais potencial atualmente, com 350 espécies “e pode ter o dobro desse número”, relata.
Aguiar pontua que muitos países latino-americanos abrigam ONGs que trabalham com morcegos (o Brasil não conta com esse tipo de iniciativa) e destaca o trabalho dos Estados Unidos com a Bat Conservation International. O país norte-americano é apontado como líder em pesquisas sobre o animal e em algumas de suas cidades o quiróptero chega a ser atração turística. Alemanha, Austrália e Inglaterra são outros expoentes em pesquisas.
Bernard lembra que na China esses animais são símbolos de boa sorte. “Quando dou palestras sobre morcegos, as pessoas se aproximam no fim para dizer que não sabiam de sua importância ecológica. As pessoas são solidárias aos morcegos quando elas se informam a respeito desses animais”, conclui Bernard.
Fonte: Vermelho