Por Vinicius Siqueira (da Redação)
A madrugada dessa sexta-feira (18) ficará registrada como um momento histórico na causa em defesa dos direitos animais no Brasil. Centenas de ativistas, após seis dias de vigília em frente ao Instituto Royal, um laboratório de experimentação animal, invadiram a empresa e resgataram cerca de 200 cães da raça Beagle, os mais utilizados na vivissecção. Além dos cachorros, foram resgatados coelhos e ratos que também estavam sendo explorados para testes de produtos farmacêuticos e cosméticos no laboratório da empresa, que fica em São Roque, no interior de São Paulo.
A manifestação começou sábado (12) quando alguns ativistas se acorrentaram nos portões do Instituto Royal. Durante a semana, a ação foi ganhando adesão de mais protetores e defensores de animais. Na quinta-feira (17), a tensão aumentou após a chegada de três vans e uma caminhão de pequeno porte. Os ativistas suspeitaram de que a empresa iria transferir os animais para um outro local e cogitaram que eles pudessem ser assassinados. Os manifestantes alertaram nas redes sociais que estavam ouvindo gritos de sofrimento dos cachorros. Foi então que decidiram invadir e salvar todos eles.
No local, os defensores encontraram diversos corpos de animais congelados e mutilados, causando ainda mais revolta.
Negativas
Horas antes da invasão, um grupo de manifestantes tentou registrar um boletim de ocorrência por maus-tratos contra animais, mas não foi atendido, devido à ausência do delegado na DP.
Um grupo em frente ao Instituto também tentou pedir ajuda aos policiais militares e à Polícia Civil que estavam no local, mas também não foram atendidos. Os manifestantes reclamaram que também pediram ajuda a Guardas Municipais e policiais militares, que estavam em frente ao instituto, mas eles não fizeram nada. Segundo Giuliana, outro grupo foi à casa do juiz de São Roque, que atendeu aos ativistas e chamou a polícia.
Havia uma reunião marcada para quinta-feira (17) com ativistas dos direitos animais, funcionários da prefeitura de São Roque e representantes do Instituto Royal, entretanto a empresa desmarcou sob a justificativa de estar prezando pela segurança de seus representantes.
Petição
Ativistas também criaram um abaixo-assinado que visa por fim à crueldade promovida pelo Instituto Royal e será enviada ao Supremo Tribunal Federal pelo site “Petição Pública”. O abaixo-assinado, que conta a colaboração de todos que também são contra os maus-tratos exercido no Instituto, pode ser acessado neste link.
Redes sociais
Os ativistas tiveram grande apoio nas redes sociais e o resgate foi amplamente compartilhado no Facebook e está no dia de hoje entre os “trending topics” do Twitter. Durante a noite de ontem, a página do Black Bloc SP chamou seus seguidores para participar da manifestação e os atualizou continuamente sobre as ações que eram tomadas no local, inclusive fornecendo um link para acompanhamento livestream do protesto.
O site Anonymous Brasil também publicou seu apoio à causa animal. “Estamos apoiando o ato contra essa empresa e iremos mandar algumas mensagens desde já, repensem sobre suas ações, ou vamos infernizá-los até o fim”, disse a organização em matéria em seu site oficial.
Uma página para a adoção dos animais resgatados já foi criada e alcançou mais de 100 mil seguidores em 11 horas. A “Adote um animal resgatado do Instituto Royal” já está preparando uma forma de organizar a adoção dos animais resgatados e posta fotos e vídeos dos cães que agora estão em liberdade.
Entenda o caso
O protesto começou no sábado (12), com a presença de ativistas dos direitos animais no portão de entrada do Instituto Royal.
Segundo os manifestantes, a empresa realiza testes de citotoxicidade em cães da raça Beagle, por considerarem nos mais “puros”, com menor variação genética e, portanto, maior possibilidade de controle dos resultados. Para evitar que os animais fossem torturados em cruéis testes laboratoriais, a ativista Jane Santos, uma das organizadoras do ato, reivindica que seja liberado “o acesso de representantes do grupo ao laboratório, para confirmar as justificativas de que não há crueldade nos testes, e um laudo que confirme as declarações da médica sobre a ausência de riscos de doença para os cães que participam dos testes”.
Segundo Jane Santos, “Nós conversamos com eles e fomos atendidos, tivemos um diálogo, mas eles disseram que não pretendem atender nenhuma das reivindicações, por isso continuaremos aqui, sem prazo para ir embora”. Os ativistas se acorrentaram ao portão da empresa, que está sendo investigada pelo Ministério Público devido a denúncias de maus-tratos desde 2012.
A apresentadora e ativista pró-animais, Luisa Mell, também participou da manifestação na terça-feira (15) e convocou em vídeo todas pessoas sensível à causa animal para a manifestação que ocorrerá no sábado (19), às 10h pelo fechamento do Instituto Royal, em frente à empresa.
Segundo publicação em seu site, “Nossa legislação é bem clara: Se existem métodos alternativos, os testes em animais são proibidos!!!! O que ocorre, é que o Instituto Royal não é um instituto transparente, muito pelo contrário! Eles se negam a abrir as portas para vistoria, e se negam a declarar quais testes são realizados ali. Conversei com vizinhos, que disseram não saber o que ocorre ali, mas contaram que já reclamaram algumas vezes pelo barulho que os cães fazem…“Eles gritam, choram…””
Boletins de ocorrência
Fernando Karamm, advogado do Instituto Royal, entrou com uma medida de manutenção de posse do prédio e espera que a polícia recupere os animais resgatados, já que todos têm chips subcutâneos, o que permite seu fácil rastreamento. Um boletim de ocorrência contra a invasão foi registrado por Silvia Ortiz, gerente geral da empresa, que admite a realização de testes com animais pelo Instituto e desaprova ação dos ativistas. Com base nos relatos dos policiais que acompanhavam os protestos e a invasão, um segundo boletim por furto qualificado foi formalizado.
Protesto anterior
Em agosto do ano passado, manifestantes de diversas ONGs em defesa dos animais foram a São Roque (SP) protestar contra o instituto. O grupo fez uma passeata e foi até o portão da empresa, onde quatro seguranças estacionaram o carro em frente ao portão de entrada para evitar arrombamentos.
Fechamento do criadouro Green Hill
O caso atual lembra a vitória de ativistas italianos ao conseguirem fechar a empresa Green Hill, que era um criadouro destinado à vivissecção de Beagles. Para Vittoria Brambilla, ativista italiano, aquela foi a “primeira vez no país a Justiça interpretou o crime de maus tratos de modo realmente moderno, isto é, do ponto de vista das verdadeiras vítimas, os animais, e das suas necessidades etológicas, contra os interesses soberanos de uma multinacional”.
Os beagles que seriam utilizados pela empresa também foram resgatados por ativistas, mas após a repercussão negativa que a empresa adquiriu após suas atividades serem reveladas, não entrou com nenhuma ação para reaver os animais. A Entidade Nacional de Proteção Animal emitiu a seguinte declaração na época: “A renúncia da Marshall ao recurso é uma grande vitória para o movimento em defesa dos animais, sobretudo para os cães que, lembremos, graças ao resgate e à concessão de tutela provisória conseguiram finalmente conhecer uma vida digna”.
Robson Fernando de Souza exibiu o ponto de vista abolicionista em sua coluna na ANDA sobre o fechamento do criadouro Green Hill.
Abaixo o vídeo que retrata a luta e a libertação dos animais que estavam confinados.
No vídeo abaixo podemos entender um pouco da discussão acerca da exploração de animais como cobaias em pesquisas.
Pisando no chão pela primeira vez
Em outra ação de resgate, a ONG ARME recuperou nos Estados Unidos, nove Beagles criados para testes em laboratórios que nunca haviam saído de suas caixas de metal. A operação aconteceu em 2011 e segundo a organização um planejamento para adoção dos cães foi concretizado. Veja a abaixo o vídeo com os cães interagindo e vendo, pela primeira vez, o sol.
Nota da Redação: Os ativistas que participaram do resgate provaram que a luta por direitos animais está viva no Brasil e merecem destaque na história recente sobre a causa animal. Salvaram a vida de animais indefesos que seriam torturados e mortos em testes laboratoriais feitos pela empresa. A ANDA está acompanhando este caso e atualizamos imediatamente nosso leitores sobre cada novo acontecimento.
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