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SOBREVIVÊNCIA

Animais amazônicos podem usar adaptações genéticas para enfrentar mudanças climáticas

6 de junho de 2024
4 min. de leitura
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Foto: Jordana Guimaraes

Um estudo descobriu que alguns animais amazônicos podem ter a capacidade genética de se adaptar às mudanças climáticas. Essa habilidade é essencial para manter processos biológicos importantes – como migração, troca de genes entre populações e persistência.

Persistência, na biologia, se refere à capacidade das populações de sobreviver a longo prazo em seu habitat, apesar das pressões ambientais e das mudanças.

No entanto, para que esses processos realmente ajudem a evitar uma grande perda de biodiversidade diante das rápidas mudanças climáticas, é necessário proteger a floresta e adotar medidas para mitigar os impactos negativos ao planeta.

A pesquisa se baseou na adaptabilidade genética do calango-rabo-de-chicote (Kentropyx calcarata) ao clima para entender como uma população desses lagartos influencia a distribuição e risco de extinção de outras populações da mesma espécie a partir do processo de resgate evolutivo.

Uma hipótese é que as respostas da espécie de lagarto estudada às alterações ambientais possam ser repetidas em outras espécies de animais.

Publicado no jornal Diversity and Distributions, a pesquisa foi conduzida por uma equipe liderada pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em parceria com Universidade de Brasília (UnB), Universidade de Gotemburgo (Suécia) e Kew Botanical Gardens (Reino Unido).

Animais ameaçados

De acordo com os pesquisadores, animais ectotérmicos – como anfíbios e répteis – dependem do calor do ambiente para manter a temperatura corporal adequada e realizar atividades vitais. Elas incluem procurar alimento, digeri-lo, encontrar parceiros para reprodução, fugir de predadores e descansar.

Se a temperatura do ambiente aumenta muito, esses indivíduos podem sofrer superaquecimento e precisar ajustar seu comportamento para resfriar o corpo. Por isso, são animais considerados mais vulneráveis às mudanças climáticas agravadas pela ação humana.

Ao todo, foram analisadas amostras de 112 calangos-rabo-de-chicote de várias regiões geográficas para entender os diferentes graus de adaptação climática.

Resgate evolutivo

O conceito de resgate evolutivo se refere ao processo em que adaptações ao clima, já desenvolvidas naturalmente ao longo do tempo, podem se propagar através da distribuição da espécie. Isso pode evitar que populações sejam extintas diante de mudanças ambientais significativas.

Além disso, os pesquisadores usaram análises genéticas para identificar partes do DNA dos lagartos que revelam indícios de adaptação ao clima.

Essa parte do DNA mostrou que certas populações de lagartos estão adaptadas a condições ambientais específicas em diferentes regiões: por exemplo, em áreas mais secas e sazonais – como no sudoeste da Amazônia e na transição entre a Amazônia e o Cerrado.

“Parte da espécie está distribuída em regiões mais secas da Amazônia e outras em partes mais úmidas. Como o clima tende a mudar, tendendo a ser mais seco e quente, o resgate evolutivo acontecerá quando indivíduos dessas populações adaptadas a regiões mais quentes conseguirem se manter e, no futuro, acessar através da dispersão na paisagem aquelas populações que perderam as áreas geográficas adequadas à distribuição”, apomta Fernanda Werneck, pesquisadora no IInpa.

Essa troca genética ajuda os animais a lidar melhor com as mudanças climáticas, especialmente em áreas onde o desmatamento está piorando os efeitos do aquecimento global.

Segundo Josué Azevedo, pós-doutorando do Inpa e primeiro autor do artigo, se esses indivíduos das áreas mais secas migrarem para os lugares onde outros de áreas úmidas foram extintos, evitarão que a espécie desapareça daquela região.

“Nossos resultados mostram que, em cenários de mudanças climáticas moderadas, mantendo a cobertura florestal, esta espécie tem um alto potencial de se valer de suas pré-adaptações e sobreviver até 2070 por meio do processo biológico natural de resgate evolutivo”, explica Josué.

Habitats menos fragmentados

Frequentemente, o impacto das mudanças climáticas na biodiversidade é analisado com base na capacidade atual das espécies de tolerar temperaturas mais altas. No entanto, é possível que as espécies se adaptem a essas mudanças.

Em áreas com habitats menos fragmentados, a variação genética adaptativa pode se disseminar entre as populações, aumentando a possibilidade de um resgate evolutivo.

Extinções locais

Apesar disso, em cenários de desmatamento e mudanças climáticas extremas, mesmo a variação genética adaptativa pode não ser o suficiente para evitar a extinção de populações locais, ao mesmo tempo que diminui o potencial de resgate evolutivo.

“Nossas descobertas mostram que diferentes populações da fauna possuem vulnerabilidades e potenciais adaptativos distintos às mudanças climáticas e que essa variação precisa ser considerada para construirmos estratégias de conservação da biodiversidade mais efetivas frente às mudanças ambientais em curso”, enfatiza Fernanda.

“Nossos resultados reforçam janelas de oportunidade de ação e a urgência de políticas eficazes de conservação que integrem a proteção da floresta amazônica e ações para mitigar os impactos das mudanças climáticas através de processos biológicos que evoluíram ao longo da história de formação das espécies e populações naturais”.

Dessa forma, a pesquisa demonstra como a persistência e dispersão de indivíduos com variantes genéticas adaptativas é um importante mecanismo para a manutenção da biodiversidade, de forma que não apenas salve a espécie focal do estudo, mas também preserve outros animais da região que dependem igualmente da floresta para sobreviver.

“Nos próximos estudos iremos avaliar a generalidade desse achado, ou seja, ver se outras espécies também seguem o mesmo padrão”, finaliza ela.

Fonte: G1

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