Segundo o geólogo Nikolás Stríkis, professor do Instituto de Geociências da USP (Universidade de São Paulo), a peleoclimatologia é um instrumento essencial para identificar os fenômenos que não fazem parte do ciclo natural e fornecer uma visão mais precisa do que pode acontecer no futuro, além de evidenciar como um evento climático em um local do planeta pode interferir no ambiente de outras regiões.
Stríkis cita como um exemplo do potencial da peleoclimatologia a mesma transição entre Plioceno e o Pleistoceno, última vez em que a Terra teve a concentração de CO2 na faixa de 400 ppm.
“Nesse período, não existia gelo na Groenlândia. Esse gelo permanente que vemos no Ártico, que não derrete no verão, só se forma quando a concentração de CO2 cai para baixo desse valor. Com base no registro, vemos que provavelmente não teremos a geleira permanente em breve”, diz.
Um estudo publicado no início de dezembro na revista Nature Communications trouxe uma previsão semelhante e que concorda com os dados paleoclimáticos. A pesquisa demonstra, com base em modelos matemáticos que o Ártico pode ter um primeiro dia em condições consideradas livres de gelo antes de 2030.
Em uma pesquisa feita com estalagmites em cavernas localizadas no norte de Minas Gerais, em uma região de cerrado, Stríkis comparou os registros dessas estruturas no Brasil com os de isótopos de oxigênio do gelo na Groenlândia ao longo dos anos.
“Durante os períodos frios na região congelada, os isótopos também mudam de comportamento nas estalagmites. Assim, o frio [na Groenlândia] corresponde a períodos superúmidos aqui, e os períodos mais quentes ali, representam fases mais secas nessa região de Minas Gerais”, explica o cientista.
“As informações vêm de fontes totalmente distintas, o que dá mais segurança na reconstituição do clima feita com base nesses indicadores. E isso pode ser feito em uma escala temporal longa, que chega a milhões de anos”, diz o meteorologista Pedro Leite da Silva Dias, professor no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP.
Dias afirma que muitos céticos do aquecimento global usam esses mesmos dados para argumentar que o planeta já foi muito mais quente do que é hoje.
“Sim, isso é verdade, mas foi há milhões de anos, era um outro mundo, inclusive na distribuição de continentes e oceanos, com outras espécies habitando a Terra. Estamos interessados no aquecimento e na sobrevivência agora”, conclui.
Fonte: Folha de S.Paulo