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INTERAÇÕES

'Amizade improvável': orcas e golfinhos revelam cooperação inédita em caçadas no Oceano Pacífico

Novo estudo mostra que interação antes vista como conflito é, na verdade, uma parceria funcional na busca por alimento

13 de dezembro de 2025
4 min. de leitura
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Foto: Universidade da Colúmbia Britânica

Um estudo recém-publicado revelou uma interação até então desconhecida entre duas espécies marinhas que dividem as águas da Colúmbia Britânica, no Canadá: as orcas residentes, predadoras de peixes, e os golfinhos-de-laterais-brancas do Pacífico. Pesquisadores identificaram que esses animais realizam um comportamento coordenado durante a caça ao salmão Chinook, contrariando hipóteses anteriores que sugeriam competição ou interferência entre eles.

A descoberta indica que os golfinhos atuam como verdadeiros guias das orcas até os cardumes, obtendo, em troca, acesso a restos de peixe. Como resume a autora principal do estudo, Sarah Fortune:

— Às vezes você pode ter um amigo improvável que ajuda a guiá-lo a um banquete ou o leva a um bar subterrâneo.

Sincronia entre espécies

À primeira vista, as interações observadas da superfície pareciam desordenadas, mas as imagens e gravações subaquáticas revelaram sincronia entre as espécies. Os cientistas constataram que orcas e golfinhos mergulham lado a lado; quando os golfinhos iniciam um mergulho, as orcas repetem o movimento.

Em profundidades maiores, os golfinhos nadam próximos às orcas e emitem cliques de ecolocalização que parecem facilitar a localização dos salmões. O estudo registrou ainda situações em que orcas compartilhavam salmão com outras orcas na presença de golfinhos. Em um dos casos, um golfinho aproveitou restos de peixe.

Essas evidências contestam a visão de que os cetáceos menores estariam simplesmente “roubando pedaços de peixe” e buscando um “almoço grátis”. Para os pesquisadores, o investimento energético de ambos os lados caracteriza uma parceria funcional, e não um comportamento oportunista unilateral.

Para investigar a dinâmica, os cientistas instalaram etiquetas com ventosas em orcas residentes, equipadas com câmeras e gravadores acústicos. Drones complementaram o registro, oferecendo uma perspectiva aérea correlacionada às imagens submersas. A combinação das duas abordagens permitiu identificar momentos de aproximação entre as espécies, sequências de cliques de ecolocalização e episódios de captura e consumo de peixe na superfície, sempre com a presença dos golfinhos.

Ao todo, foram catalogados 25 eventos de perseguição conjunta. Em oito deles, orcas foram vistas compartilhando salmão Chinook, e golfinhos estavam presentes em quatro. A análise acústica revelou alternância nos períodos de ecolocalização entre as espécies. A partir disso, Fortune propôs que “eles possam estar espionando uns aos outros”, sugerindo que cada espécie pode se orientar pelo eco produzido pela outra para localizar presas.

A interpretação dos dados despertou atenção de especialistas independentes.

Diretor de pesquisa do Center for Whale Research, Michael Weiss classificou o material obtido como “um conjunto de dados realmente impressionante”, embora ressalte a necessidade de mais evidências para confirmar cooperação plena.

— Certamente há uma interação acontecendo, e provavelmente há benefícios para um ou ambos — disse.

Cientista da Oceans Initiative, Erin Ashe destacou que o estudo amplia a compreensão sobre a complexidade dos ecossistemas marinhos, nos quais golfinhos e outros animais dependem de estratégias sofisticadas para caçar, deslocar-se e evitar predadores.

A região abriga duas populações de orcas com hábitos alimentares distintos: as residentes, consumidoras de peixe, e as orcas de Bigg, que se alimentam de mamíferos marinhos, inclusive golfinhos. Embora compartilhem o mesmo ambiente, evitam contato direto. Essa coexistência levou pesquisadores a considerar possíveis motivações comportamentais para a associação com os golfinhos.

— Pode ser que os golfinhos encontrem algum tipo de refúgio junto às orcas que comem peixes. Esse refúgio pode permitir que os golfinhos cheguem perto de orcas que não representam uma ameaça. Eles podem, de certa forma, avaliar seu predador — explica Erin Ashe.

Fonte: O Globo

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