Por Ana Cardilho
em colaboração para a ANDA
O leopardo chamado “Salati” e o cachorro da raça golden retriever “Tommy” mantêm uma amizade inusitada em uma propriedade em Pretória, na África do Sul. Segundo o proprietário do local Richard Brooker, de 23 anos, os dois animais estão sempre juntos.
Meu nome é Tommy, sou um golden retriever e estava aqui pensando com minhas patas… Este gato ao meu lado, que cochila ao sol, cresceu um bocado! No fundo, no fundo, eu acho que meu melhor amigo nem gato é. Pelo menos isso é o que diz o meu olfato. Meu amigo não tem cheiro de gato. Já ouvi falar que ele é um leopardo. Dá pra imaginar? Ter um leopardo como melhor amigo? Pois eu tenho. Seu nome é Salati.
O bichano chegou ferido a este abrigo de animais abandonados e por um tempo andou silencioso, sem muita conversa. Um dia me dei conta de que, pra onde eu olhava, lá estava o gatão. Percebi que ele me seguia a distância. Gostei da brincadeira e deixei que ele se aproximasse, que o gelo fosse quebrado, até que estávamos correndo pelos campos, dividindo o mesmo pote de água e brincando de cabo de guerra com toalhas roubadas do varal.
Não sou um cão pequeno. Tenho um porte altivo mas meu amigo já quase me passou. Como todo felino, ele é manhoso e gosta de se esfregar no meu dorso, passa a carinha redonda pelo meu focinho e se joga no chão, de barriga pra cima. Quer lambidas. Eu dou. Acho que mimei demais esse leopardo, mas ele merece. É meu melhor amigo, meu companheiro de sol, de chuva, e nas noites frias dormimos aninhados. Um esquenta o outro. De manhã, Salati me acorda fazendo cócegas na minha cara com sua língua felina. Ganho banho de gato gigante logo cedo e já desperto às gargalhadas.
Gosto demais quando meu amigo olha na direção do sol. Os olhos meio verdes meio amarelados ficam transparentes e nesse momento tenho certeza de que vejo sua alma. Meu amigo tem uma alma boa. Passou por maus-tratos, foi ferido, abandonado, sentiu medo, fome, frio, mas conseguiu ultrapassar os traumas e hoje está bem. Estamos bem. Neste abrigo, nos sentimos seguros.
Vivemos uma amizade que dizem ser pouco provável, um cachorro e um leopardo. Mas nós somos a prova de que deste lado da vida não tem raça, não tem gênero, não tem tamanho nem genética. Somos apenas dois seres iguais que se amam e bem se cuidam.
Agora vou ficar quietinho porque não quero acordar meu amigo leopardo. Ele já se espichou todo ao meu lado, botou a pata direita sobre minha barriga, suspirou e acho que está no meio de um sonho bom. Vou pra lá, vou entrar no sonho dele e aposto que ele sonha é comigo: seu mais fiel amigão!
Ana Cardilho é escritora e jornalista. Com um olho na realidade e outro na prosa imaginária conta com mais de 20 anos de experiência em rádio e TV, tendo feito reportagens, edição e fechamento de telejornais e programas, e é ficcionista.