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CORAGEM

Ameaçado de morte em rota de tráfico, biólogo luta para salvar onças

8 de setembro de 2023
4 min. de leitura
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Foto: Rikky Azarcoya

Darién Gap é uma densa floresta no extremo sul do Panamá, um dos refúgios do maior felino das Américas —a onça-pintada. A espécie é dona da mordida mais forte do mundo entre os felinos e está no topo da cadeia alimentar da região. Ainda assim, estima-se que restam menos de mil delas naquele país, correndo o risco de entrarem em extinção nos próximos 50 anos.

Há 20 anos, o Panamá era crucial para manter algo chamado de fluxo genético entre as onças-pintadas do continente, mas agora elas se concentram apenas nessa área ao sul, região que está próxima da fronteira com a Colômbia, um local cercado por tráfico de drogas, armas e pessoas que se deslocam para tentar cruzar a fronteira dos EUA clandestinamente.

A mineração e o desmatamento é um grande problema do local, que perdeu mais de 130 km² de floresta entre 2012 e 2019, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente do Panamá. A perda de habitat tem feito as onças atacarem animais criados para consumo, que fazem às vezes de “vingadores” e matam os felinos que predaram seus animais domésticos e/ou os criados para consumo.

Nesse cenário complexo, as onças ainda enfrentam a ambição de criminosos, que matam os animais para comercialização de seus “produtos”, como peles, presas e órgãos genitais, que são vendidos no mercado ilegal asiático.

Em meio ao clima tenso entre vida selvagem e a humana, Ricardo Moreno, biólogo, pesquisador associado do Smithsonian Tropical Research Institute e explorador do National Geographic, é o fundador da Fundação Yaguara Panamá, que tem lutado para conscientizar produtores e agricultores locais sobre a importância das onças-pintadas e evitar o encontro de humanos com elas —ou torná-los o mais pacifico possível.

“Comecei a buscar informações científicas sobre onças-pintadas e a trabalhar em campo a partir de 1996, procurando fezes para entender o que comem, seguindo suas pegadas e rastros no campo. Oficialmente, em 2014, começamos a trabalhar no Panamá”, conta Moreno para Ecoa.

Sua instituição registrou 381 mortes entre 1989 e 2022, mas o número oficial pode chegar a 700, sendo que 96% dos animais mortos estão ligados a conflitos com pecuaristas locais.

Apesar do esforço, Moreno já teve que lidar com produtores irritados e que se opuseram ao seu trabalho de conservação porque as onças haviam matado seus animais. No entanto, sempre preferiu adotar uma “postura pacificadora”.

“Por duas vezes fui ameaçado de morte, mas graças às pessoas das comunidades, consegui voltar e conversar diretamente com quem me ameaçou e fazê-los entender”, disse Ricardo Moreno.

Moreno é conectado com a comunidade e com todos que vivem e circulam no local. Durante o trabalho de monitoramento de onças sempre leva suprimentos extras e roupas para ajudar migrantes, geralmente em situações difíceis ao tentar cruzar a região.

Foto: Rikky Azarcoya

Seu instituto oferece suporte e palestras a fazendeiros para criar novas áreas e técnicas de manejo. Em áreas em que as fazendas estão em maior contato com a presença dos felinos, são adotadas técnicas que os espantem, como a instalação de cercas elétricas ao redor de áreas de bezerros e vacas.

O trabalho de conscientização também aposta em explicar a importância do animal nas florestas da região, que predam cobras, javalis e outros animais que podem invadir o pasto e plantações desses agricultores e pecuaristas.

Vigiando as onças com a ajuda de câmeras e olhos indígenas

Moreno não está sozinho para monitorar as onças-pintadas, e conta com cerca de 1.900 câmeras instaladas por toda a extensão do canal do Panamá. Os equipamentos ajudam no processo de captura e sedação dos felinos, que recebem um colar de rastreamento.

Para além da ajuda do amplo aparato de vigilância e GPS, a equipe do pesquisador tem apoio e recepção dos indígenas do povo Emberá, originários da região, que o ajudam a desbravar o território e têm a onça-pintada como uma guardiã mística de suas florestas.

“Eles [indígenas] ajudam a montar o acampamento, a mobilizar a comida. E agora, estamos fazendo treinamentos para que instalem câmeras. Além disso, eles ajudam a inibir caçadores que vêm de outras partes do mundo para caçar onça ou outros animais aqui, conversando e explicando sobre a importância desses seres”, conta Moreno.

Agora, a grande aposta do biólogo e a equipe de pesquisadores é realizar um grande “censo”, tanto das onças-pintadas como de outros animais que vivem na selva com o predador.

“Com o rigor científico, teremos pela primeira vez uma informação valiosa para o país e poderemos ter um número com uma amostra grande e realmente mais precisa. Estamos expandindo esse trabalho, que era feito apenas em uma parte de Darién, para todo o Panamá”, explica Moreno.

Fonte: UOL

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