Ambientalistas e comerciantes da cidade de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, decidiram se mobilizar contra a proposta do presidente Jair Bolsonaro (PSL) de transformar a Estação Ecológica de Tamoios, conhecida como Esec Tamoios, em uma “Cancún brasileira” para explorá-la através do turismo.
Formada por 29 ilhas e um raio de 1 km de mar ao redor de cada uma, na baía de Ilha Grande, ao longo de Angra dos Reis e de Paraty, no Rio de Janeiro, a estação é considerada única devido ao mar pontilhado, com ilhas, ilhotas, lajes e rochedos. Atualmente, o local é uma unidade de conservação e, por isso, a pesca, o desembarque e o mergulho são proibidos. As informações são do portal G1.
A área preservada corresponde a apenas 5% da baía de Ilha Grande, os outros 95% podem ser aproveitados e habitados. Por essa razão, biólogos que estudam a região afirmam que a Esec Tamoios não impede o turismo. Ainda assim, o presidente tem a pretensão de transformar a estação em local turístico, o que preocupa ambientalistas, comerciantes e pessoas sensíveis à causa ambiental.
“Acabar com a Esec pra incentivar o turismo, na verdade, é você acabar com o turismo. O turismo existe na baía da Ilha Grande justamente porque existem esses paraísos ecológicos preservados. Ninguém vem aqui pra ficar vendo uma área totalmente degradada”, explicou o biólogo Leonardo Flach, do Instituto Boto-Cinza.
Apostar no turismo na estação é, também, preocupante do ponto de vista da proteção a espécies de animais. Isso porque o local é responsável pela preservação de mais de 10 espécies ameaçadas de extinção. Os botos-cinza, por exemplo, correm sério risco de desaparecer caso a proteção ambiental da estação seja retirada.
A região é chamada de santuário, porque não é permitido nenhum tipo de exploração, explicou o professor de direito ambiental da PUC-Rio, Fernando Walcacer.
“Qualquer atividade que possa prejudicar a preservação da diversidade biológica dos ecossistemas nessas unidades é um atentado contra direitos de gerações futuras que a constituição brasileira protege”, disse Fernando.
Pequenos comerciantes e proprietários de pousadas da região também são contra a proposta de Bolsonaro. “A gente teria mais embarcações andando por ali, então é óleo no mar, é arrasto de fundo de baía. Isso tudo traz uma parte negativa”, justificou Cagério de Souza, dono de pousada. “Tem que ser preservado o máximo possível, porque a gente depende do turismo, né?”, disse Luis Alberto das Neve, proprietário de um restaurante.
Retirar a proteção da estação seria um grande retrocesso. Com ela, a região já sofre ameaças. Sem, estaria fadada à degradação. Em Angra dos Reis, o Ministério Público Federal ajuizou uma ação pública contra o sucateamento da estação ecológica. De acordo com o procurador da República Igor Miranda da Silva, atualmente os escritórios do Ibama e também da Esec Tamoios estão praticamente fechados no local.
Nenhum dos dois órgãos, ainda segundo o MP, tem barcos em funcionamento para realizar a fiscalização da área. Quando as fiscalizações eram frequentes, o próprio atual presidente, na época ainda deputado, foi multado por pescar numa área proibida ao redor da Ilha Samambaia, em 2012. A multa nunca foi paga e, após a eleição de Bolsonaro, foi anulada. Além disso, a pedido do presidente, o fiscal José Augusto Morelli, responsável por aplicar a multa, foi exonerado em março deste ano. A conduta das autoridades envolvidas nesse episódio é investigada pelo Ministério Público Federal.
Por duas vezes, em visitas ao Rio de Janeiro, Bolsonaro criticou a existência da estação ecológica. “A situação ecológica de Tamoios está demais. Não preserva absolutamente nada e faz com que uma área rica que pode trazer bilhões de reais por ano do turismo fique parada por falta de uma visão mais objetiva, mais progressista nessa questão. Ou seja, o meio ambiente e o progresso podem casar, sim, e permanecer juntos para o bem da nossa população. A Baía de Angra pode ter, com certeza, brevemente, se Deus quiser, uma Cancún aqui no Brasil”, disse o presidente. As declarações do presidente sobre a estação não preservar “absolutamente nada” são rebatidas por ambientalistas, que reforçam que espécies de animais e plantas dependem da proteção da estação para que sobrevivam.
Cancún é um balneário no México com uma praia de 22 km com grandes construções, como hotéis. O local atrai milhões de turistas. Mas, para o ambientalista Israel Klabin, que foi um dos responsáveis pela criação da estação ecológica de Tamoios, o modelo de Cancún, citado por Bolsonaro, não é compatível com a Esec Tamoios.
“Não tem como você fazer grandes edifícios e grandes usos”, justificou Klabin.
De acordo com juristas, a Constituição não permite que o presidente extingua uma estação ecológica. “Só pode ser extinta por lei. Então precisaria haver um ato do Congresso Nacional, extinguindo a estação ecológica. Fora disso, seria totalmente inconstitucional”, explicou Fernando Walcacer.
O Ministério do Meio Ambiente, ao ser questionado sobre o sucateamento da frota de barcos e o abandono dos prédios e instalações do Ibama e do ICMBio, mais uma vez jogou a responsabilidade para os antigos governos, dizendo que o problema é “um legado de gestões anteriores” e não apresentou nenhuma proposta para resolver a questão – o que é uma característica do novo governo, que ficou conhecido pelos retrocessos ambientais gerados em apenas 100 dias de mandato.