O cenário da Amazônia parece piorar cada vez mais, perdendo cerca de 200 mil acres de seu território ao dia.
O legado de Chico Mendes
A esperança foi como um alerta nas palavras do seringueiro e ativista Chico Mendes. Pouco antes de fazer 44 anos, em dezembro de 1988, ele previu que não estaria vivo até o Natal. Palavras dele: “De primeira, eu achei que estava lutando para salvar seringueiras. Então, eu achei que estava lutando para salvar a Amazônia. Agora percebo que estou lutando pela humanidade.”
O ativista recebeu ameaças de morte a sua vida toda. E o clichê era o mesmo: um fazendeiro ambicioso batia o pé por uma reserva da floresta, para que pudesse queimar e derrubar as árvores e abrir espaço para pasto. O fazendeiro então contratava jagunços para cercar a vizinhança de Chico.
Resistência
E ele se opunha publicamente às intenções do fazendeiro. Reclamava os direitos humanos dos povos indígenas, dizendo pois que o Brasil devia proteger a floresta mais biodiversa do mundo. Segundo ele, destrua isso, e nós, a raça humana, vamos terminar por destruir-nos.
Homicídio
Três dias antes do Natal daquele mesmo ano afinal, Chico foi morto alvejado a tiros pelo filho do fazendeiro. A notícia abalou o mundo.
Depois do assassinato, o Conselho Nacional de Seringueiros fez uma petição para que a Amazônia fosse preservada “por toda nação brasileira, como parte de sua identidade e auto-estima”. E o Conselho continuou: “Esta Aliança dos Povos da Floresta – juntando indígenas, seringueiros e comunidades ribeirinhas – abraça todos esforços para proteger e preservar esta imensa porém frágil ecossistema que envolve nossas florestas, rios e lagos, a fonte da nossa saúde e base de nossas culturas e tradições.”
Devastação em massa
Desde a morte de Chico, aproximadamente 1 milhão de km², quase o tamanho do Texas e Novo México juntos, têm sido devastados. Primariamente no Brasil, mas também no Peru, Colômbia, Suriname, Venezuela, Guiana e Guiana Francesa.
Segundo matéria do portal The Guardian, a perda equivale a 200 mil acres por dia, ou 40 campos de futebol por minuto. Somente no Brasil, que é onde se encontra a maior extensão da floresta, esse índice de destruição tem crescido 30%.
A floresta agora libera mais carbono do que o estoca, portanto aumenta, mesmo com toda ajuda para diminuí-la, nossa crise climática mundial.
Desgoverno
Houve um leve declínio no desmatamento de 2004 a 2012. Mas desde então os números voltaram a subir, e principalmente nos últimos dois anos, com Jair Bolsonaro no poder.
Em 2018, enquanto Bolsonaro fazia sua campanha como salvador da pátria, cientistas previam uma catástrofe iminente no ecossistema. Pois tal estudo dizia que se o bioma perdesse mais 25% de suas árvores, iria se tornar uma floresta mais seca. E tudo por conta do desmatamento, com impacto negativo nos níveis de chuva. Além do mais, à medida que o bioma se fragmenta, então as áreas cercadas por pastagem perdem espécies. Esse processo é chamado por biogeógrafos de “declínio ecossistêmico”.
Veredito
Para ser curto e grosso: a floresta está morrendo. Bibliotecas de DNA inteiras e sinfonias de espécies sendo varridas para assim dar lugar a gado emissores de metano.
Fomos avisados
“Bolsonaro é um poderoso apoiador do agronegócio”, foi escrito no Washington Post em matéria prévia à eleição do presidente. “E é hábil a favorecer isso acima da preservação. [Ele] se zangou com a pressão externa para se atentar à proteção da floresta e […] se mostra contra reservas indígenas”.
Escrito no portal Mongabay, Thais Borges e Sue Branford reportaram que um “novo manifesto de oito ex-ministros do meio ambiente … alerta que as terríveis políticas ambientais do presidente poderiam resultar num grande dano à economia.
Robert Walker, um geógrafo quantitativo do Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade da Flórida disse que a menos que haja mudança repentina, a Amazônia pode desaparecer até 2064.
Supondo assim, será pela ação centenária de oportunistas locais em destruir um bioma de 10 bilhões de anos. Talvez então, depois de um mundo quente e menos verde nos demos conta de tamanha ignorância capitalista.
Uma mensagem
O papa Francisco junto com o arcebispo de Canterbury, Justin Welby, e o patriarca ortodoxo ecumênico, Patrick Bartholomew, formaram recentemente “Uma Mensagem Conjunta pela Proteção da Criação” pedindo a cristãos de todo mundo a “ouvirem o clamor da terra”. E isto inclui ricos e pobres, velhos e novos, todos são chamados a rever suas atitudes e oferecer “sacrifícios coerentes pela terra que Deus nos deu”.
Se a saúde permitir, Francisco irá à conferência de Glasgow. Welby também planeja ir. Sendo o primeiro papa sul-americano, Francisco também virá ao Brasil, abençoar o que resta da floresta.
O que realmente vale a pena
São Francisco de Assisi da Itália, o santo patrono dos bichos e pássaros, assim como Mendes, morreu aos 44. Henry David Thoreau, de New England que escreveu Walden e Desobediência Civil, também morreu aos 44 e foi outro defensor da causa.
Portanto não é questão de quanto tempo vivemos, nem com quanto dinheiro. E sim o que fazemos com isso. “Vivamos como contraponto para pararmos a máquina” escreveu Thoreau. Anotou ainda que sempre depois de uma caminhada no bosque, ele se sentia “mais alto que as árvores”.
Brasilidade
O nome “Brasil” vem de uma espécie de árvore milenar, cujo nome português foi dado devido à cor avermelhada de sua madeira. Hoje chamado de “pau-brasil”, a espécie é plantada e conservada em reservas, com rigorosa e específica demanda industrial.
Dizem que brasileiros, independente de quão ruim a situação esteja, sempre sorriem em vez de chorar, porque amam a vida. Agora é dito que o futuro do Brasil é o futuro do mundo.
Chico Mendes tinha razão.