A COP30, conferência da ONU que reúne líderes mundiais supostamente para debater soluções para a crise climática, transformou-se no palco principal de uma das mais perversas operações de greenwashing já vistas no país. No coração da Amazônia, enquanto diplomatas negociam acordos tímidos e a Cúpula dos Povos amplifica vozes historicamente silenciadas, o lobby do agronegócio, corporificado no espaço conhecido como AgriZone, trabalha a todo vapor.
Financiado por corporações com extensos históricos de destruição ambiental, como as mineradoras Vale e Hydro, os frigoríficos Marfrig e BRF, a Suzano de papel e celulose e a Bayer, gigante dos agrotóxicos, a AgriZone promove centenas de atividades com o objetivo de propagandear a fábula de um agronegócio sustentável, tecnológico e parte da solução climática.
Estas são as mesmas empresas cujas operações estão diretamente ligadas ao desmatamento do Cerrado e da Amazônia, à expulsão de povos originários e comunidades tradicionais, à contaminação de solos e rios com agrotóxicos, e à grilagem de terras. São agentes centrais de um modelo de produção que é um dos principais vetores da crise climática no Brasil, responsável por radical mudança no uso da terra e grandes emissões de gases de efeito estufa.
Máquina de mitos
A existência e protagonismo da AgriZone dentro da COP30 é a prova cabal de que o evento foi cooptado por um lobby bem financiado. Enquanto o mundo observa, as corporações que promovem o colapso ecológico se vestem de salvadoras da pátria. É a perpetuação de um conjunto de mitos cuidadosamente construídos, como o da sustentabilidade, da legalidade e o da harmonia com o meio ambiente.
Alguém pode, em sã consciência, acreditar que a Bayer, uma das maiores fabricantes de venenos agrícolas do mundo, responsável por adoecer e matar agricultores, trará soluções genuínas para a crise climática? Ou que a Marfrig, cuja cadeia é incessantemente associada ao desmatamento, é agora paladina da “pecuária de baixo carbono”?
Esta operação de lobby não começa nem termina na AgriZone. Ela é amplificada por uma mídia que, em grande parte, é patrocinada por esses mesmos interesses. A bem-sucedida campanha “Agro é Tech, Agro é Pop, Agro é Tudo”, da Rede Globo, é o exemplo mais cristalino de como os mitos do agronegócio são injetados no imaginário social, criando um “consumidor mais-que-perfeito” para um produto intoxicante, a ideologia de que a destruição é progresso.
Verdadeiros líderes e as soluções reais
Enquanto isso, do outro lado da cidade, na Cúpula dos Povos, os verdadeiros guardiões da floresta, indígenas, quilombolas, ribeirinhos e movimentos sociais, apontam as soluções reais e urgentes que são sistematicamente ignoradas pelos corredores do poder, a reforma agrária popular, o incremento da agroecologia, a demarcação imediata de todos os territórios indígenas, a mudança do sistema alimentar baseado em commodities e o fim dos financiamentos públicos para atividades predatórias.
A presença do AgriZone na COP30 é a essência do problema. É a confissão de que o mesmo poder econômico que nos levou à beira do abismo agora busca controlar o discurso sobre a solução, garantindo que nada mude de fato. É a transformação de uma conferência do clima em um balcão de negócios para a perpetuação do modelo de morte.
A COP30 se torna o exemplo perfeito da contradição estrutural da política climática global, onde os responsáveis por parte central da crise são tratados como seus interlocutores preferenciais.
Para enfrentar de verdade a devastação climática, e com ela o massacre contínuo de animais silvestres e domésticos, é necessário romper com essa fábula cuidadosamente construída. A crise não será mitigada por corporações que se beneficiam dela.
Enquanto a COP abre espaço para o lobby do agronegócio, quem paga o preço são os animais, humanos e não humanos, que perdem suas casas, suas famílias e suas vidas para sustentar um modelo insustentável desde a raiz.