O segundo andar de um prédio comercial discreto no centro de Bangkok é um lugar estranho para se encontrar o maior roedor do mundo. Ali, dentro de um pequeno recinto com um lago raso, três capivaras estão à disposição de dezenas de clientes pagantes – todos ávidos por uma selfie. Enquanto as pessoas oferecem avidamente petiscos de folhas aos animais de aparência indiferente, poucos parecem se dar conta da peculiaridade subjacente: como, exatamente, esse roedor sul-americano foi parar a mais de 16.000 quilômetros de casa, em uma metrópole asiática agitada?
Cafés dedicados a capivaras têm surgido por todo o continente nos últimos anos, impulsionados pela crescente fama do animal na internet. Os animais semiaquáticos aparecem em mais de 600 mil publicações no TikTok. Em Bangkok, os clientes pagam 400 baht (cerca de £9,40) por uma sessão de 30 minutos para interagir com elas, além de alguns suricatas e ratos-bambu chineses. Os cafés ficam abertos 12 horas por dia, sete dias por semana.
“Eles são simplesmente muito estranhos”, diz Elizabeth Congdon, bióloga especializada em capivaras na Universidade Bethune-Cookman, na Flórida, refletindo sobre o apelo repentino do roedor. “E aí você junta esse fator de estranheza com o quão dóceis eles são, o quão fáceis são de manter em zoológicos e o quão sociáveis eles são.”
Mas, segundo especialistas, essa popularidade recente está ligada a um preocupante aumento no número de cafés com animais exóticos na Ásia. Taiwan foi o primeiro lugar a permitir que frequentadores de cafés interagissem com gatos, em 1998. Japão e Coreia do Sul, posteriormente, popularizaram a interação com animais selvagens, de corujas a guaxinins e lontras. No ano passado, este último país reprimiu os cafés com animais exóticos, introduzindo leis que impedem a exibição de animais selvagens em cafés, a menos que sejam registrados como zoológicos ou aquários. Mas em algumas das outras grandes cidades asiáticas, de Ho Chi Minh, no Vietnã, a Guangzhou, na China, os cafés com animais estão mais populares do que nunca.
“A diversidade e o número de animais – e, em particular, a quantidade considerável de animais ameaçados de extinção – são muito preocupantes”, afirma Timothy Bonebrake, biólogo da conservação da Universidade de Hong Kong, que estudou o crescimento de cafés com animais exóticos na Ásia.
Uma simples busca online revela cafés com capivaras em cidades como Jacarta, Qingdao e Hanói. Os roedores não são classificados como ameaçados de extinção – sua distribuição geográfica se estende do norte da Colômbia até o norte da Argentina, com uma população estimada em 1,2 milhão de indivíduos vagando pelos pântanos e cidades do Brasil. Mas, “o motivo de não estarem ameaçados de extinção é a abundância no Brasil, onde são protegidos”, afirma Congdon, acrescentando que na Venezuela e na Colômbia eles vivem principalmente em áreas protegidas.
O comércio internacional de capivaras não é regulamentado pela Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção (CITES), embora a exportação de capivaras selvagens nativas continue ilegal em muitos países da América do Sul, como Brasil, Argentina e Peru. Especialistas afirmam que a movimentação desses roedores da América do Sul para a Ásia está frequentemente ligada ao comércio ilegal de animais exóticos, com as mesmas pessoas transportando as espécies através das fronteiras internacionais.
“As cadeias de abastecimento legais e ilegais de animais vivos convergem em vários pontos e, muitas vezes, são controladas pelas mesmas pessoas e empresas”, afirma Scott Roberton, diretor executivo de uma equipe de combate ao tráfico de animais selvagens na Wildlife Conservation Society (WCS).
As capivaras no café de Bangkok são “de fazendas éticas na Tailândia. Não as importamos de seu país de origem”, de acordo com uma pequena placa no recinto dos animais. No entanto, Roberton afirma: “A lavagem de animais capturados ilegalmente para cadeias de suprimento legais é muito comum, e esses animais são frequentemente usados para estabelecer ou complementar o plantel reprodutor”.
Espécies ameaçadas de extinção também têm sido alvo do comércio de animais exóticos para cafés com animais exóticos. Este ano, um estudo associou lontras-de-unhas-curtas encontradas em cafés com animais no Japão a dois pontos críticos de caça furtiva no sul da Tailândia – violando a proibição do comércio dessa espécie vulnerável.
A preocupação com o crescimento do comércio ilegal de animais exóticos – inclusive para cafés com animais – levou os membros da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) a adotarem uma moção com o objetivo de coibir o tráfico em seu congresso de outubro.
“Do ponto de vista da conservação, o comércio global de animais exóticos está realmente fora de controle”, afirma Sue Lieberman, vice-presidente de políticas internacionais da WCS. “Nos últimos cinco anos, temos observado um aumento significativo no comércio de animais exóticos na Ásia. Antes, falávamos sobre o comércio de alimentos na China, mas agora o comércio de animais no país está crescendo com a proliferação de cafés temáticos para animais.”
Um levantamento realizado em um dos maiores bancos de dados de empresas da China, o Qichacha, revela que o número de empresas listadas como zoológicos de animais exóticos, que inclui cafés com animais, saltou de menos de 100 em 2020 para mais de 1.800 em 2025. E enquanto a tutoria de animais exóticos particulares na China aumentou 50% nos últimos cinco anos, os cafés com animais têm crescido a uma taxa de 200% ao ano.
Uma análise abrangente do recente crescimento no número de cafés com animais exóticos em toda a Ásia ainda é escassa, mas um estudo coescrito por Bonebrake e publicado na revista Conservation Letters constatou a existência de 406 cafés com animais na Ásia em 2019, dos quais pouco mais de um quarto abrigava espécies exóticas. E das mais de 250 espécies exóticas registradas, quase metade estava ameaçada de extinção ou apresentava populações em declínio na natureza.
Mesmo na ausência de preocupações com a conservação de espécies importadas, alguns países temem o transporte de animais exóticos para abastecer cafés. Em maio, a polícia apreendeu cinco capivaras de traficantes na Costa Rica, onde o comércio de capivaras é ilegal devido ao receio de que elas possam escapar e proliferar na natureza. As capivaras se reproduzem rapidamente, suportam uma ampla gama de temperaturas e têm uma dieta flexível, composta por gramíneas e plantas aquáticas. “Há um alto risco de elas se tornarem invasoras”, afirma Congdon.
O impacto dos cafés com animais exóticos no comércio ilegal de animais selvagens não se limita apenas aos animais que circulam pelo local, diz Roberton, mas também à forma como podem estimular a procura. “De repente, você está incentivando as pessoas a verem esse animal exótico, grande e interessante, que elas podem acariciar e alimentar. Quantas pessoas saem desse café pensando: ‘Quero um filhote de capivara’?”
Traduzido de The Guardian.