A medida de fuzilar 10 mil camelos tomada pelo governo australiano visa impedir que os animais invadam comunidades aborígenes em busca de água e alimento
Conforme anunciado pelo governo australiano, atiradores utilizando-se de helicópteros, tiveram autorização para matar 10 mil camelos de 8 a 12 deste mês como forma de impedir invasões a comunidades aborígenes que sofrem com a seca no país. O massacre de 5 dias contabilizou metade da meta prevista: cerca de 5 mil animais mortos.
Segundo reportagem do portal Daily Mail de 14 de janeiro, “líderes aborígines disseram que os grandes rebanhos ameaçavam alimentos e água potável escassos, danificavam a infraestrutura e criavam um risco para os motoristas”.
Como o massacre de camelos foi muito criticado por ativistas de direitos animais do mundo todo, Richard King, gerente geral das Terras Anangu Pitjantjatjara Yankunytjatjara (APY) – que abriga cerca de 2.300 aborígenes – disse ao Daily Mail:
“Agradecemos as preocupações dos ativistas dos direitos animais, mas há informações errôneas significativas sobre a realidade da vida de animais selvagens não-nativos, que estão entre os lugares mais áridos e remotos da Terra”.
“Como guardiões da terra, precisamos lidar com uma praga que foi introduzida, de maneira que proteja o suprimento valioso de água para as comunidades e a vida de todos, incluindo nossos filhos pequenos, idosos, flora e fauna nativas”, completou.
King explicou ao jornal: “Os camelos enfraquecidos freqüentemente ficavam presos e morriam em poços de água, contaminando as fontes de água necessárias aos habitantes locais, animais e pássaros nativos. O período prolongado de seca, embora não seja difícil para a fauna nativa, leva os camelos selvagens a um sofrimento extremo”.
Os camelos chegaram na Austrália na década de 1840 para exploração do vasto interior do país, com até 20 mil importados da Índia nas seis décadas seguintes. Depois foram e ainda são utilizados pelo turismo.
Agora acredita-se que a Austrália tenha a maior população de camelos selvagens do mundo, com estimativas oficiais sugerindo que mais de um milhão está vagando pelos desertos do país.
Segundo o que o Daily Mail apurou, os animais são considerados uma praga, pois, sujam as fontes de água e atropelam a flora nativa enquanto procuram comida por longas distâncias a cada dia. “Os proprietários tradicionais das Terras da APY por anos venderam camelos selvagens mas, recentemente, eles ficaram incapazes de gerenciar a escala e o número de camelos que se reúnem em condições secas, de acordo com o departamento de meio ambiente”, diz a matéria.
Já a posição dos ativistas de direitos animais é que um país rico, bem estruturado e com os maiores institutos de pesquisas do mundo tem plenas condições de conter a explosão populacional de diversas espécies sem optar pelo fuzilamento dos animais. Além dos camelos é autorizada a caça de cangurus e o envenenamento de gatos selvagens como forma de conter a reprodução.
Ao longo de décadas, controles populacionais éticos e muito mais eficazes poderiam ter sido aplicados evitando-se medidas cruéis como essa contra os 10 mil camelos. Ao mesmo tempo, as comunidades aborígenes seriam poupadas de transtornos com esses ou outros animais.
Matéria publicada na ANDA com o título “Carnificina de 10 mil camelos na Austrália segue até domingo” (que teve 37 mil curtidas) gerou muita polêmica porque várias pessoas entendem que os aborígenes têm direito de defender seu território, já tão restrito como a de qualquer outro povo indígena que tenta resistir com seus costumes.
Mas a questão é que um país tão desenvolvido certamente poderia investir na fiscalização e controle de espécies importadas, como também em pesquisas que visem métodos éticos de controle populacional. Em pleno século XXI não cabem mais medidas como as de fuzilamento em massa de animais.
Com esse triste episódio de matar milhares de camelos, a Austrália conseguiu alcançar e talvez superar a má reputação da China com relação ao tratamento que destina aos animais, muito criticada mundialmente pela matança de milhares de cães e gatos das formas mais brutais.
O povo australiano, em geral, ama os animais, mas o governo há décadas tem autorizado matanças que poderiam ser evitadas.
A vida selvagem, que já foi o mais admirado cartão postal da Austrália, atraindo milhares de turistas do mundo todo a cada ano, hoje luta contra os incêndios, contra a fome e a sede e, se sobrevive, ainda pode morrer fuzilada.
Fátima ChuEcco é jornalista ambientalista e atuante na causa animal