Germano Woehl Jr.
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Na Costa Rica, assim como em vários lugares do mundo, existe o hábito de consumo de ovos de tartaruga. O saque de ovos é um problema muito sério na Costa Rica. Há anos a coleta de ovos de tartaruga é proibida. Mas algumas ONGs atuam somente na vigilância (dia e noite) das ninhadas. Fazem apelo pela internet para recrutar voluntários (jovens) no mundo inteiro para defender os ninhos das tartarugas. Não sei como estes jovens voluntários fazem para impedir um grupo violento de saqueadores, por exemplo.
Os biólogos, os professores escolas e universidades, órgãos de fiscalização e ONGs desenvolvem há décadas trabalhos sérios de Educação Ambiental nas escolas, comunidades, etc, para desestimular o consumo de ovos de tartarugas, porque é um problema terrível de se lidar, como podemos imaginar.
Então surge um projeto piloto duvidoso que usa a estratégia de liberar a coleta na praia de Ostional, em Guanacaste, dentro de uma unidade de conservação da natureza, mas de “forma sustentável”, garantem.
Os resultados desastrosos (a médio e longo prazo) deste projeto são previsíveis e bem conhecidos em vários lugares do mundo, para diferentes espécies exploradas (plantas, animais, etc). O que é mais grave neste caso: trata-se da tartaruga oliva (Lepidochels olivacea) que está ameaçada de extinção.
Um dos erros fundamentais de projetos deste tipo é ignorar o fato de que não é da natureza humana apenas subsistir, retirar só o necessário. As pessoas querem sempre mais, querem prosperar, consumir cada vez mais e a população humana aumenta. Não tem como alguma coisa ser sustentável neste nosso mundo real. Explora-se um recurso até o esgotamento, mesmo sabendo das conseqüências (temos os exemplos da Ilha de Páscoa e tantos outros – estudos apontam que eles sabiam que iriam colapsar).
Este projeto na Praia de Ostional dá dinheiro para muita gente. Eles recebem recursos de todos os lugares. No papel e na propaganda o projeto é lindo, maravilhoso, como sabemos. É o projeto dos sonhos. Gera renda e “preserva” as tartarugas. É aí que está a pegadinha.
Há estudos sérios mostrando que ele não funciona. Eles não conseguem ter este controle sobre a coleta, como prometem. Contudo, não adianta usar como indicador o declínio detectado recentemente na população de tartarugas. Eles já estão colocando a culpa no aquecimento global, poluição dos oceanos, enfim, colocam a culpa em tudo, menos nesta contribuição predatória dos saques das ninhadas para gerar renda.
Esta atividade de saque de ovos pode levar mais de 100 anos para exterminar a espécie. É justamente este longo prazo para se detectar o colapso de uma espécie, ou de um ecossistema, um dos fatores que joga a favor dos defensores de projetos deste tipo. Porque eles não estarão mais aqui para serem punidos pelo erro.
A divulgação das imagens chocantes do saque de ovos autorizados na Costa Rica na internet teve muitos reflexos positivos na sociedade. Serviu para alertar as pessoas que uma inocente inscrição “produzido de forma sustentável” nos rótulos de produtos considerados “ecologicamente corretos” pode significar muita crueldade cometida contra a natureza.
O roubo de ovos de tartaruga ocorre também no Brasil e já temos um possível indicador de que as imagens abomináveis da Costa Rica difundidas pela internet deram o alerta e ajudaram a combater este crime aqui, conforme mostra a matéria do Jornal O Globo, de 08/01/2010, intitulada “Encontrados 50 mil de ovos de tartaruga na zona rural do Rio Grande do Sul”.
Outro caso recente foi publicado no portal Globo Amazônia, em 20/10/2009, com a manchete: “Fiscais apreendem 200 ovos de tartaruga roubados de seus ninhos no PA, ovos eram coletados nas margens do Rio Xingu“.
Para se ter idéia da dimensão do problema, uma matéria do jornal do Reino Unido Telegraph, de 04/11/2008, registrou a ação da polícia da Malásia em uma apreensão recorde de 10 mil ovos de tartaruga em extinção que seriam destinados ao comércio de alimentos na ilha de Bornéu.
Na foto da matéria, um monte mostra 10.000 ovos. Na Costa Rica são saqueados legalmente 3 milhões de ovos por ano (informações dos gestores do projeto). Imagine o volume que representa. E este roubo descoberto no Rio Grande do Sul, com 50.000 ovos? É três vezes o volume mostrado na foto. Uma montanha de ovos. Que loucura isso! E os predadores naturais, como ficam?
No blog Defensor da Natureza tem um texto completo sobre o problema, ilustrado com imagens, links para outras matérias etc.
Fonte: O Eco