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Consumo de animais selvagens deixa mais de 100 espécies à beira da extinção

27 de dezembro de 2016
6 min. de leitura
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Por Laura Dourado/ Redação ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais

Foto: Nathalie van Vliet
Porcos-do-mato-africanos, pequenos antílopes e macacos a venda em uma barraca no mercado de Makokou. Foto: Nathalie van Vliet

Até agora muitas pessoas já reconheceram que os humanos alteraram tão drasticamente o meio ambiente que o clima de todo o planeta está se modificando e centenas de espécies encaram a extinção. A perda do habitat e a poluição são os principais causadores dessa ameaça à biodiversidade, mas algumas pessoas podem se surpreender ao descobrirem que o comércio de carne também contribui significativamente para essa situação.

A comida no mundo de hoje é abundante, apesar de mal distribuída e não há escassez de produtos. Porém, na última década houve um aumento no comércio da carne de animais selvagens, sustentado em parte pela nova e abastada elite que desponta nos países asiáticos e algumas das chamadas “iguarias” requisitadas nos menus incluem mais de 300 espécies de animais que atualmente estão em risco de extinção devido à caça. São desde tipos grandes, como o kuprey, o camelo-bactriano e o javali-barbado até espécies menores dos mais variados tipos de morcego.

“Esse comércio global da caça é um problema fundamentalmente angustiante porque está intimamente ligado aos desafios de desenvolvimento humano, como a insegurança em relação à procedência da comida, riscos de surgimento de novas doenças e mudanças no uso das terras. Enquanto muitos grupos étnicos caçaram animais selvagens por toda a sua vida como forma de subsistência, muitas vezes com efeitos prejudiciais, a insustentabilidade desta prática tem acelerado em diversas áreas devido ao crescimento da população humana, o aumento na procura de carne selvagem para ser comercializada e o uso generalizado de armas de fogo e veículos motorizados na caça, aumentando assim a eficiência e extensão espacial da atividade”, escreveram pesquisadores no jornal Royal Society Open Science.

Essas espécies são caçadas pela sua carne, para fins medicinais, partes do corpo, “troféus” ou como animais domésticos. De acordo com o relatório da Royal Society Open Science, 126 espécies (mais do que qualquer outro grupo) são ameaçadas por meio da caça, incluindo gorilas, chimpanzés, bonobos e várias espécies de lêmures e outros macacos.

As espécies de mamíferos ameaçadas pela caça abrangem uma série de grupos. Foto: Royal Society Open Science.
As espécies de mamíferos ameaçadas pela caça abrangem uma série de grupos. Foto: Royal Society Open Science.

De acordo com o relatório “estima-se que 89 mil toneladas de carne com um valor de mercado de cerca de US$ 200 milhões sejam colhidas anualmente na Amazônia brasileira, enquanto as taxas de exploração na bacia do Congo são cinco vezes maiores”.

A maior parte da carne de animais em extinção termina em mercados e, depois, em restaurantes onde são vendidas como “iguarias exóticas”.

Outro relatório mostrou que cinco toneladas de carne de animais silvestres são contrabandeadas semanalmente em bagagens turísticas que passam somente pelo aeroporto parisiense Charles de Gaulle. Isso sem contar a matança de vários outros animais apenas para o uso “terapêutico” de algumas partes de seu corpo.

A caça de rinocerontes na África do Sul aumentou nos últimos dois anos depois de relatos vindos do sudeste da Ásia de que o chifre da espécie teria curado uma pessoa que sofria de câncer terminal no fígado. Não é preciso dizer que não há qualquer comprovação científica que sugira que o pó de chifre de rinoceronte, ou seus derivados, tenha qualquer poder curativo para o câncer, impotência ou qualquer outra doença.

O chifre do búfalo-asiático foi considerado como uma alternativa ao chifre de rinoceronte no tratamento de febres e convulsões, e essa demanda têm diminuído muito as populações da espécie, sendo que restam atualmente alguns milhares de indivíduos. A pele, os ossos, dentes e garras de tigres também são muito usados na medicina tradicional.

“Nosso objetivo é aumentar a sensibilização para essa crise global, muitos desses animais estão à beira da extinção e o comércio de animais selvagens e seus derivados é dirigido por redes internacionais e perigosas, competindo com o tráfico de pessoas, de armas e de drogas em termos de lucros”.

Pangolins são frequentemente mortos por sua carne, que é considerada uma iguaria. Foto: Wikimedia Common
Pangolins são frequentemente mortos por sua carne, que é considerada uma iguaria. Foto: Wikimedia Common

Os autores da pesquisa sobre o contrabando de carne selvagem apresentaram algumas sugestões que podem travar essa atividade: leis podem ser modificadas para aumentar as penas para a caça e tráfico, além de expandir a proteção dos habitats de mamíferos em perigo, direitos de propriedade podem ser fornecidos para comunidades que se beneficiam da presença da vida selvagem, mudança nos hábitos de consumo por meio da introdução de vegetais ricos em proteínas, trabalho educacional para ajudar os consumidores em todo o mundo a entender as ameaças que os mamíferos sofrem ao serem caçados ou presos.

Muitos países onde a carne de animais selvagens é adquirida ou comercializada já têm leis e penalidades definidas; O problema reside na forma como estas são implementadas. Na Malásia, por exemplo, aqueles que são capturados comendo carne de pangolim estão sujeitos a uma multa de mais de US$ 1000, mas mesmo multas pesadas como esta não impedem moradores locais e alguns turistas, especialmente da China, de transformar carne de animais em perigo em seu jantar, segundo o ZME Science.

Em uma entrevista, um dos porta-vozes da Wildlife Watchers of Sabah disse que o comércio da carne da vida selvagem ainda continua em Nabawan, um dos distritos da Malásia:

“Basicamente, em poucas palavras, o diretor estava dizendo que eles conseguiram solucionar a caça e comércio de animais selvagens que assolava Nabawan por anos. Assim, com a antecipação cautelosa desta notícia muito boa para a conservação da vida selvagem, decidimos visitar o Nabawan Tamu para ver o quão factual foi o relatório do Departamento de Vida Selvagem. Chocantemente, para o nosso espanto, este ainda era um negócio atual e costumeiro em Nabawan Tamu, com uma multidão de várias espécies diferentes de animais sendo vendidos.”

A maior parte da perda de vida selvagem pode ser atribuída ao uso urbano. Os autores do estudo enfatizam que uma liderança ousada e um esforço coordenado são necessários para atenuar esta indústria terrível que já atingiu níveis alarmantes.

“Nossas opções para mudar a demanda humana por animais selvagens ameaçados devem ser colocadas em políticas e planos de ação internacionalmente coesos e pragmáticos, como os propostos na recente Declaração de Londres (2014), assinada por 46 países. Estas medidas exigem uma vasta gama de ações destinadas a combater este comércio, incluindo a garantia de enquadramentos jurídicos eficazes e medidas de dissuasão, o reforço da aplicação da lei e a promoção de meios de subsistência e desenvolvimento sustentáveis. Além disso, os países desenvolvidos se comprometeram a fornecer financiamento significativo para a biodiversidade nos trópicos durante a ECO-92, mas não cumpriram essas promessas”, disse o estudo.

“Se este financiamento estivesse disponível, os países desenvolvidos poderiam desempenhar um papel significativo para ajudar nações em desenvolvimento a protegerem a vida selvagem da caça. Todas essas ações, junto com várias outras, estão inseridas nas cinco ações de conservação que descrevemos acima para reduzir tanto a mortalidade da fauna como a demanda por carne e produtos selvagens”, concluiu o documento.

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