Três das maiores empresas de alimentação do mundo foram acusadas de comprar soja de um agricultor ligado ao desmatamento da Amazônia brasileira.
A Cargill, Bunge e Cofco adquiriram grãos de soja da Fiagril, empresa de propriedade chinesa e da multinacional Aliança Agrícola do Cerrado, ambas tendo sido supostamente abastecidas por um agricultor multado e penalizado várias vezes após desmatar áreas da floresta tropical, de acordo com uma nova investigação.
Os grãos de soja são um ingrediente essencial na alimentação de aves, bois e porcos, particularmente para animais criados em fazendas intensivas.
O destino da Amazônia é o objeto de grande foco à medida em que líderes mundiais lutam para chegar a um acordo sobre como lidar com a emergência climática. Uma pesquisa publicada na revista acadêmica Nature Climate Change no mês passado descobriu que a área desmatada na Amazônia quase quadruplicou em 2019 – o primeiro ano do Presidente Bolsonaro no poder – comparado ao ano anterior.
O Bureau of Investigative Journalism (TBIJ), a Unearthed e o Repórter Brasil usaram imagens de satélite e registros de aplicação para revelar como soja foi plantada em áreas que tinham sido anteriormente embargadas – uma forma de proibição governamental que detém agricultores que violaram as regras de desmatamento ou que causaram outros danos ambientais usando partes de suas terras.
Ao menos 15 km² de floresta registrados a um agricultor fornecendo soja para a Aliança e a Fiagril foram embargados em 2019 pelo Ibama, órgão regulador ambiental brasileiro, após terem sido desmatados. Um outro embargo, emitido pela agência estadual do meio ambiente do Mato Grosso, em 2016, cita o mesmo agricultor em relação a mais desmatamentos ilegais.
Usando análise de satélites do MapBiomas, o Repórter Brasil afirmou que a soja foi ilegalmente cultivada nessa terra em 2018 e 2019, apesar do embargo. Registros públicos mostraram que o agricultor foi multado num total de R$12m (£1.3m) por violações a leis de proteção florestal – as multas foram em 2013 e 2019.
O agricultor, baseado na remota região da Marcelândia no estado brasileiro do Mato Grosso, supostamente vendeu soja para a Fiagril e a Aliança em 2019, após o embargo governamental da terra. A Bunge comprou soja da Fiagril, e a Cargill e a Cofco compraram soja da Aliança, após as duas empresas terem sido abastecidas pela fazenda em 2019, de acordo com registros vistos pelo TBIJ.
A Fiagril e a Aliança, bem como a Cargill, a Bunge e a Cofco, são signatárias da moratória da soja. Os signatários se comprometeram a não “vender, comprar ou financiar soja de áreas desmatadas no bioma amazônico após julho de 2008”.
Contudo, as empresas podem legitimamente comprar soja da fazenda porque é a terra que está embargada, e não a fazenda inteira ou o agricultor. Não se sabe se a soja comprada pela Fiagril e pela Aliança veio de terras proibidas.
Entende-se que o sistema de monitoramento da moratória só proíbe as áreas onde as violações ocorreram, excluindo outras propriedades do mesmo agricultor.
“Permitir que diferentes propriedades regidas pela mesma pessoa ou grupo sigam diferentes regras abre uma brecha, que os agricultores podem usar para contornar a moratória da soja”, disse Lisa Rausch, uma pesquisadora na Universidade de Wisconsin.
A Fiagril disse ao TBIJ que ela condena qualquer atividade ilegal e que se “compromete à aplicação legal da sustentabilidade na agricultura com os nossos clientes e fornecedores”. A empresa negou ter adquirido soja da fazenda embargada.
A Aliança disse que está regularmente auditada e em conformidade com todos os regulamentos e que “não há fatos ou decisões oficiais que mencionem, conectem ou de qualquer outra forma se refiram à Aliança em quaisquer violações ambientais”. A empresa disse que lida com “incontáveis agricultores e produtores no Brasil” e que “negócios fora do controle da Aliança permanecem sob a responsabilidade exclusiva de um agricultor/produtor específico”.
A Cargill disse que a soja não foi adquirida “diretamente” da fazenda. Ela acrescentou: “Nós defendemos firmemente a moratória da soja brasileira na Amazônia desde 2006… investigaremos a Fiagril e a Aliança do Cerrado de acordo com nosso processo de reclamação da soja”.
A Bunge disse que não compra soja da Aliança desde 2017, e que a Fiagril não forneceu grãos de soja vindos da região da Marcelândia à empresa. “Como um signatário da moratória da soja amazônica, as compras feitas pela Fiagril são auditadas por entidades independentes. Além disso, os contratos da Bunge com fornecedores possuem cláusulas nas quais o fornecedor se compromete expressamente a fornecer grãos de acordo com a legislação aplicável, inclusive com as leis ambientais”, disse a empresa.
A Cofco disse: “Nós conduzimos auditorias internas mensais, assim como auditorias externas anuais sobre o cumprimento da moratória pelos fornecedores. A auditoria de 2019 confirmou que todos os nossos fornecedores cumpriram os requisitos da moratória na temporada passada”.