Nova análise sugere que a União Europeia poderia ser responsável por mais de 80% do comércio global de animais de fazenda, o qual continua a estar conectado a falhas no mantimento do bem-
estar desses animais.
Os dados globais, providenciados ao “The Guardian” pelo Food and Agricultural Organization (FAO) das Nações Unidas, indicam que 1,8 bilhões de galinhas, porcos, ovelhas, cabras e gado foram movidos através da fronteira em 2019. A União Europeia foi apontada como responsavel por mais de três quartos do total. “Uma grande parte do movimento de animais vivos para além da fronteira está localizado na União Europeia”, conta a oficial de desenvolvimento do FAO, Anne Mottet.
O comércio global de animais – estimado a arrecadar mais de 20 bilhões de dólares por ano – quadruplicou de tamanho nos últimos 50 anos, de acordo com uma investigação do Guardian no ano
passado. Entretanto, os regulamentos inadequados mostram que os animais podem estar sendo colocados em risco durante algumas jornadas, ou expostos a crueldade ao chegarem a seus destinos.
O governo propõe a proibição da exportação de animais da Inglaterra e do país de Gales, a não ser por motivos de reprodução ou uso de longo-prazo – e não só para engordarem e acabarem
massacrados.
As preocupações sobre o bem-estar animal durante seu transporte levaram a União Europeia a estabelecer um inquérito para investigar as alegações de falhas, no ano passado.
Os riscos de transporte de animais incluem estresse durante o carregamento e descarregamento, ferimentos, fome, sede e exaustão, de acordo com um relatório publicado pela organização que
advoga pela causa animal, Eurogroup for Animals, que também destacou o potencial para baixos padrões de abatimento e os altos riscos de contágios de doenças infecciosas durante transportações difíceis.
O Eurogroup for Animals pede por uma reforma regulamentar que inclui tempo de jornadas mais curto e a substituição do “transporte de animais vivos por comércio de carne e carcaças assim como de material genético.”
O FAO argumenta que não faz sentido agregar todos os animais transportados da mesma maneira. “Alguns são muito pequenos. Não se pode misturar galinhas com vacas. Por exemplo, 95% dos 1,8 bilhões de animais que atravessaram a fronteira em 2019 eram galinhas, enquanto o gado representou menos de 1% desse total”, diz Mottet.
Ditte Erichsen, veterinária do Animal Protection Denmark, diz que um dos fatores que conduz o transporte de animais é que os países se especializam na produção de um tipo específico de comida,
que frequentemente são exportadas. “A Dinamarca se tornou o maior exportador de porcos”, diz Erichsen. Ela diz que a maioria deles são leitões de quase três meses de idade e que seu tempo de viagem é, muitas vezes, de mais de oito horas. De acordo com o relatório do Eurogroup, que utilizou os dados do Eurostat, quase 15,7 milhões de porcos dinamarqueses deixaram o país em 2019.
“Esse é o resultado de uma tendência que temos visto pela última década, onde a produção de porcos foi especializada a tal ponto que os leitões nascem em um país, engordam em outro e podem
ser abatidos em um terceiro país”, disse Erichsen.
Os riscos para os porcos, conta ela, são estresse gerado pelo calor, pois porcos não podem suar, sufocamento devido a aglomeração, fome prolongada, sede e a falta de um espaço para descanso.
Iris Baumgaertner, da ong suiço-alemã Animal Welfare Foundation, diz que a especialidade alemã são pintinhos. O relatório descobriu que o país exportou 312 milhões de cabeças de frango dentro
da União Europeia, dos quais quase 100 milhões pesavam menos de 185 gramas.
“O número de animais que são transportados pela União Europeia, e os milhões de frangos que deixam a Alemanha, é o resultado desequilibrado da globalização e especialização,” diz Baumgaertner.
Os subsídios da União Europeia são outro fator que conduz o transporte de animais, diz Gabriel Paun, apoiador dos direitos dos animais romeno e diretor da ONG Animals International. “No Oriente Médio e na África do norte, é preferido a carne de ovelhas locais, mas a carne romena é muito barata, em parte por conta dos subsídios da União Europeia,” disse Paun.
Paun diz que é esperado que os dados de 2020 mostrem uma estimativa de 3 milhões de ovelhas romenas que foram exportadas para a Arábia Saudita. O transporte em si é barato, com o valor de
envio para de 25 dólares por cabeça, ou menos em navios maiores, disse Paun.
A Romênia foi recentemente acusada pelo “silêncio completo” a respeito da investigação do naufrágio do navio Queen Hind em novembro de 2019, que resultou na morte de mais de 14.000 ovelhas.
Apesar de os dados sobre os transportes serem limitados – e a contagem de peixes é em peso ao invés de números de animais – o relatório do Eurogroup estima que aproximadamente 54.000
toneladas de peixes vivos foram transportadas pela União Europeia em 2019. Desse número, 75% são trutas, carpas, enguias e atum-rabilho.
Os peixes vivos são igualmente propensos ao estresse do transporte. “Os peixes não alimentados por pelo menos um dia antes da transportação, mas as vezes até por duas semanas, o que pode causar agressões entre os peixes, pois estão à procura de comida,” disse Christine Xu do Instituto Aquatic Life. Outros riscos incluem baixa qualidade da água e aglomeração.
Um porta-voz da Comissão Europeia diz em um e-mail que estão cooperando com o World Organization for Animal Health (OIE) “para melhorar as condições do bem-estar dos animais transportados para fora da União Europeia”, e que irão “continuar a monitorar a exportação de animais vivos e tomarão as medidas necessárias de acordo com suas competências, para assim melhorar a implementação da legislação na União Europeia.”