Por Giovanni Cerruti, do La Stampa
Tradução de Natalia Cesana (da Redação)
Hilal levanta cansada da sombra e toca a rede. Sabe que quando Abdulfatah Husni encontrá-la trará algo de bom, pelo menos um pouco de alimento fresco. Hilal estava acostumada bem: o seu tutor, Saadi Gheddafi, chegava com uma pick-up cheia de carne fresca. Mas ela não vê Saadi, um caçador, há três meses. E há um mês, os 200 funcionários do Zoológico de Tripoli, na Líbia, se tornaram apenas 20. Hilal sacode a cabeça cheia de moscas e coloca uma pata magra na rede, implorando por comida e carinho. Husni não traz nada. Hilal, com suas moscas, volta desiludida para Jacuta, Morjan e outros seis leões.
“Mais uma semana e não terão o que comer”, disse Husni, um dos diretores do zoológico. “Aqui não há compromisso com os direitos humanos. São só os animais, que não interessam a ninguém”.
Localizado próximo à prisão de Abu Salim, o zoológico de 45 hectares recebia um milhão de visitantes ao ano. No último mês devem ter entrado dez pessoas. Eram 600 animais, de 60 espécies, diz com orgulho o diretor. Pássaros, primatas, gazelas, búfalos e raposas. Vinte leões, quatro tigres, duas panteras negras, seis pumas, quatro hienas e três hipopótamos. Para alimentá-los, eram necessários ao menos 200 quilos de comida por dia.
Quando anda pelo zoológico, Husni chuta balas que aparecem na areia. “Estamos em uma região de alojamentos e do lado da prisão. Aqui em volta tem acontecido bombardeamentos e tiroteios.” Um filhote de búfalo nasceu em 1º de agosto, quando mísseis da OTAN cruzavam o céu. “Ainda bem que não tínhamos mais elefantes e ursos. Mas camelos e dromedários que circulavam livremente pareciam loucos. Os chimpanzés escaparam no parque.”
Em frente à jaula de Charlie, um leão branco solitário e sem pelo, o diretor do zoológico conta a angústia que vive. “Como em todas as cidades, estamos com problemas no fornecimento de água. Por isso temos que escolher: ou damos o que beber aos animais ou limpamos as jaulas e as instalações. Decidimos que por alguns dias é possível negligenciar a higiene, mas e depois?”, questiona.
Husni também acabou de descobrir que o zoológico enganava os fornecedores há pelo menos dois anos. “Esta é uma estrutura que dependia do governo, que não revertia a verba. A conclusão para mim é uma só, corrupção. Alguém ficou com o dinheiro e os fornecedores ficaram quietos, com receio de alguma retaliação do regime.”
O prazo para salvar Hilal e os outros animais do Zoológico de Tripoli é de uma semana. “Por caridade, estamos prontos a receber qualquer ajuda de qualquer parte, mas até agora só temos promessas. Como tem acontecido em toda a Líbia, os meus 600 habitantes do zoológico deverão esperar por um futuro melhor”, disse Husni, em frente ao depósito de materiais, alvejado por tiros de bazuca das tropas de Kadaffi, local onde três hipopótamos emergem de um reservatório com água preta, movendo-se com dificuldade no lodo. “Eu disse que a limpeza está suspensa até que haja a reabertura dos registros.”
Chega uma pick-up, mas não é Saadi, que abandonou seus nove leões em uma jaula maior. É um voluntário que traz maços de erva fresca para as gazelas Waddan, aquelas com os chifres gigantes.
Fora do escritório do diretor, os termômetros marcam 43 graus. Não tem vento. “Não sei quando o número de visitantes chegará ao um milhão ao ano de novo. Devo pensar em que acontecerá quando terminar minha gestão, daqui a sete dias.”
Hilal voltou a cavar um buraco na areia, na sombra de uma pedra grossa, bocejando de fome. Deve ser a única em Tripoli que tem saudade de Saadi e da sua família.