(da Redação)
A Declaração Universal dos Direitos dos Animais diz que colocar em risco a vida de qualquer animal é crime. O artigo nono diz ainda que é responsabilidade da lei dos humanos protegê-los. Mas no último final de semana, a Associação dos Melhores Amigos dos Animais de Frederico Westphalen – AMAA – descobriu que um cão sem raça definida chamado Bingo aparentemente não tinha direitos.
Respondendo a denúncia anônima, na tarde do sábado dia 11, voluntários chegaram até uma madeireira no distrito industrial da cidade para descobrir que Bingo estava preso. Não só amarrado, mas com uma das patas traseiras enrolada de tal forma em cordas que já não havia mais circulação. Ele estava contorcido numa posição absurda que dificultava sua respiração. Além disso tinha lesões de pele, bicheiras, estava magro, desidratado e enlouquecido pela dor. De acordo com a médica veterinária Luciane Dal Piva, uma das voluntárias, o tempo em que a pata ficou presa – provavelmente mais de dois dias – já havia causado necrose. “Sem tratamento urgente ele pode morrer”, alertou.
Começou então a busca pela tal lei dos homens. Luciane e a voluntária da AMAA Priscila Krodi Santos buscaram
apoio da Patrulha Ambiental (Patram) e da Brigada Militar, já que precisariam entrar em uma propriedade
particular para auxiliar o animal. “A BM disse que não poderia nos ajudar, e passou a responsabilidade à Patram.
E a Patram não atendia nenhum dos telefones. Mesmo o celular, em que deveríamos encontrar o plantão, estava
desligado”, conta Priscila.
Sem apoio, e com o tempo se esgotando, elas decidiram socorrer o cão de qualquer forma. “Quando cheguei já vi que era grave. Ele estava tão enrolado que não alcançava a água ou a ração”, diz Luciane. A veterinária precisou sedar o animal para que pudessem manuseá-lo e soltar as cordas. Mas no momento em que se preparavam para colocá-lo na van da clínica, foram impedidas pelo chegada do proprietário do local. Muito agressivo, ele impediu a retirada e acionou a BM – que só então apareceu – para denunciar invasão de propriedade.
“Tentamos explicar que era um flagrante de maus-tratos, um crime em evolução, mas os policiais militares se
negaram a registrar a ocorrência”, relata Priscila. “A proposta deles foi que esperássemos até dois dias e caso o cão não fosse socorrido, fizéssemos a denúncia”. Bingo não tinha todo esse tempo. Segundo a também veterinária Joana Jacomy Silveira, que participou do atendimento, “ele já apresentava fraqueza muscular, sinal grave de desnutrição”.
O resgate Impedida de atender Bingo ou retirá-lo do local, a AMAA registrou Boletim de Ocorrência de maus-tratos na Delegacia da Polícia Civil de Frederico Westphalen. Depois, encaminhou um pedido ao juiz plantonista da Comarca da cidade para que autorizasse a retirada do animal do local. A resposta foi imediata. Ainda na noite do sábado, a promotora Andrea Almeida Barros determinou que o animal deveria ser removido do local para preservar sua vida e dignidade. E já na manhã do domingo a decisão do juiz José Luiz Leal Vieira deferiu o pedido, ordenando que Bingo fosse retirado dessa situação de risco.
A decisão do juiz reconheceu que existiam provas consistentes da ocorrência, em tese, da infração penal delineada no artigo 32, da Lei 9.605/98, que trata de crimes ambientais. O artigo diz que “Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos” é crime e pode levar a uma pena de três meses a um ano de prisão, além de multa.
Bingo foi localizado pela Polícia Civil, acompanhada da AMAA, na casa de seu “tutor”. Deitado em uma garagem escura, ainda sem nenhum tipo de medicação, ele estava coberto de óleo diesel, numa equivocada tentativa de minimizar o crescimento das bicheiras. A apreensão do animal foi tensa. Só depois de esclarecido de que a retirada de Bingo era uma decisão judicial, e que poderia inclusive ser realizada, se necessário, com apoio de força policial, o tutor concordou em entregá-lo. Nâo sem antes brindar os voluntários da AMAA com um grande repertório de adjetivos, menções de agressão física e o arremesso de um balde dágua.
Finalmente, Bingo foi removido à Clínica Veterinária Mundo Animal. De acordo com a veterinária Luciane, a situação é grave, mas ele deve sobreviver. “Estamos tentando salvar a pata, que está muito ruim”, informa. “Mas o importante é que conseguimos resgatar o Bingo e que as ações da Polícia Civil, do Ministério Público e do Poder Judiciário foram rápidas, o que nos permitiu ajudá-lo”, finaliza a voluntária Priscila Krodi Souza.
O email da AMAA é o [email protected].