Por Heron José de Santana, Luciano Rocha Santana e Tagore Trajano
A doutrina do “politicamente correto” surgiu na China dos anos 30, e em seu nome o “camarada” Mao Tsé-tung matou milhares de pessoas inocentes que não se adequavam à ortodoxia do Partido Comunista. A expressão, todavia, se popularizou no mundo ocidental a partir do processo de democratização das universidades americanas, quando estudantes saídos das classes populares abraçaram a luta pelos direitos civis dos negros, das mulheres e contra a guerra do vietnã.
É que em uma sociedade democrática, as minorias tendem a reivindicar tratamento igualitário, que consiste, entre outras coisas, no direito de não ser discriminadas. No auge de sua luta pelos direitos civil, por exemplo, Martin Luther King Jr., denunciava a complacência da sociedade americana com a injustiça social em relação aos negros, enquanto a média dos americanos argumentavam: “O que estes negros estão desejando que paguemos, se nós já demos a eles a liberdade?”
Nos anos 90, com a derrocada do mundo comunista, a doutrina do politicamente correto passou a reivindicar algo mais que a igualdade social: a eliminação de estigmas sociais e do tratamento pejorativo que costumam receber, de modo que homossexuais, deficientes físicos e outras minorias passaram a exigir um tratamento digno por parte do Estado e da sociedade. Não obstante, a doutrina do politicamente correto costuma ter como efeito colateral o aumento da intolerância daqueles que se sentem incomodados com essas exigências, via de regra, integrantes do grupo dominante: brancos heterossexuais integrantes da classe média, que temem perder espaço com a ascensão dessas minorias.
Assim, ao lado do crescimento do discurso do politicamente correto assistimos o aumento dos casos de violência física e verbal contra mulheres, homossexuais, negros e outras minorias, que são muitas vezes acusadas de fundamentalistas.
O fundamentalismo, porém, é um movimento ou crença que reivindica o retorno aos textos básicos ou fundamentais de determinada religião, em contraposição à sua modernização ou liberalização, termo que foi utilizado, por exemplo, para definir as religiões protestantes que surgiram no seio do cristianismo, e que para fugir das perseguições acabaram por invadir as terras dos povos indígenas e fundar as colônias que posteriormente viriam a se constituir nos Estados Unidos da América.
Atualmente, o termo tem sido utilizado para definir os grupos islâmicos que defendem uma interpretação restritiva do Alcorão, reivindicando uma “guerra santa” contra aqueles que se opõem a estas “verdades”. Em verdade, são fundamentalistas como os evangélicos que costumam hostilizar determinadas minorias que reivindicam direitos que se consideram politicamente correto, e é este o desafio da democracia: permitir que diferentes demandas sociais sejam cumpridas sem que isto provoque o aumento dos conflitos sociais.
Seja como for, nas democracias modernas, nas omissões do legislador, o judiciário tem sido chamado a se pronunciar sobre essas demandas, ensejando muitas vezes um conflito interno entre formalistasconservadores, que entendem que esse tipo de intervenção ofende ao princípio da separação dos poderes, e os ativistasprogressitas, que entendem que estas decisões fazem parte do jogo democrático.
As recentes decisões do Supremo Tribunal Federal em relação aos homossexuais e a liberdade de expressão têm demonstrado uma tendência progressista do Poder Judiciário brasileiro, o que não deixa de ser salutar em um país como o nosso, de base autocrática e elitista.