Por Fátima Chuecco (Da Redação)
O laudo toxicológico apontou que os 37 animais encontrados em sacos de lixo e na casa de Dalva Lima da Silva, na noite de 12 de janeiro, na Vila Mariana (SP), foram a óbito devido a uma alta dosagem de anestésicos injetados diretamente no coração. Todos os animais, na maioria filhotes, tinham uma perfuração no peito. A única exceção é da cachorrinha de laçinho rosa (foto), entregue à Dalva algumas horas antes do crime, que apresentava 18 furos na região peitoral, o que indica que houve dificuldade em localizar o coração do animal e isso deve ter causado um sofrimento terrível.
Dalva alega ter aprendido a matar os animais com um veterinário amigo da família. A médica veterinária Rafaela Costa Magrini explica que acertar o coração pode ser fácil para quem estudou a anatomia do animal, mas uma pessoa sem conhecimento e prática teria dificuldade. Ela diz também que a administração intracardíaca pode doer: “A perfuração no coração causa um incômodo e um pouco de dor, mas o que pode ter sido mais dolorido são as várias perfurações em animais sadios. Além disso, eles deviam ficar com muito medo e o estresse da situação aumenta o nível de dor”.
Na casa de Dalva foram encontradas agulha de grosso calibre. A veterinária esclarece que, dependendo do tamanho do animal, a agulha deve ser mais ou menos comprida, com maior ou menor calibre. Caso não seja dessa forma, o animal sentirá muita dor, pois, terão que ser feitas várias tentativas para acertar o coração.
“O tipo de medicamento também influencia. Existe medicamento exclusivo para eutanásia que causa uma parada cardiorespiratória sem que o animal sofra, porém, vários profissionais só realizam esse procedimento, mesmo com esse medicamento, começando com uma anestesia geral. Na necessidade de uma eutanásia sou a favor de uma morte sem qualquer sofrimento”, diz.
Será que Dalva agia sozinha?
Filhotes de gatos podem oferecer pouca resistência, mas Dalva também matou gatos adultos e cachorros. “Só é possível realizar o procedimento intracardíaco sem ajuda de ninguém se o animal estiver muito doente (inapetente), mas caso esteja saudável e forte precisará ser imobilizado de alguma forma”, comenta a veterinária.
Na casa localizada à Rua Mantiqueira, número 168, onde Dalva residia, há duas outras casas menores no subsolo e numa delas vivia a filha mais velha, Alice Queiroz, de 22 anos que disse à polícia desconhecer o que a mãe fazia. Inclusive, por falta de indícios e testemunhas, Alice não será processada. A outra casa era normalmente alugada, mas na ocasião do flagrante estava vazia.
Na parte superior na casa está o ponto mais macabro da história. Um quartinho sem janelas, parecido com um porão, que bate com a descrição dada por uma antiga faxineira da casa. Ela contou que era proibida de entrar nesse recinto, mas nas raras ocasiões em que esteve lá para a faxina, viu sangue, fezes e urina. Na noite da vistoria o quartinho foi revistado: havia móveis velhos, jornais e gaiolas.
Ficha Suja
O próximo passo é o laudo dos vidros de remédio encontrados na casa, Dopalen e Xilazin, a fim de descobrir se os princípios ativos são de uso controlado ou proibido. Em seguida, o delegado José Celso Damasceno, responsável pelo caso junto à Divisão de Investigações Contra o Meio Ambiente do DPPC (Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania), relatará ao Juiz com o intuito do caso ser encaminhado para o Ministério Público Criminal.
Um fato importante, que não encerra o assunto, mas ajuda, é que independente do resultado do processo que Dalva responderá por maus-tratos com resultado de morte, seu nome ficará para sempre marcado como tendo passagem pela Polícia. Isso porque o delegado a indiciou criminalmente. Como as leis brasileiras ainda são bastante brandas para casos como esse, não aumentando a pena para pessoas que matam animais em série ou em massa (e Dalva se inclui nas duas categorias), a população teme que o desfecho seja apenas a cobrança de uma multa ou serviços comunitários.
Contradições de uma mente perversa
Vale lembrar que Dalva confessou estar matando animais há pelo menos um ano em função da escassez de adotantes e custo elevado com veterinários, mas dos 37 animais encontrados mortos na noite de 12 de janeiro, ela só assumiu ter matado seis por estarem, segundo ela, “muito doentes”. No entanto, após as necrópsias, constatou-se que todos os animais estavam saudáveis e perfeitamente adotáveis.
Dalva recebe duas pensões alimentícias e tem mais de um imóvel. Seu rendimento mensal, segundo seu próprio advogado, é o suficiente para ter um bom padrão de vida e bancar escola particular para duas filhas – lembrando que Alice entrou na USP esse ano e não precisa mais de suporte financeiro para os estudos como antes. Ou seja, aparentemente, não há motivação comercial para os crimes e nem faltava dinheiro para ração e custos veterinários.
Além disso, se ela alega não ter condições de doar e nem de ficar com os animais, por que continuava recebendo-os? A Santa Casa de Misericórdia, com ajuda do CCZ e de protetores, entregou cerca de 300 gatos na casa de Dalva alguns anos atrás, cujo paradeiro ela nunca soube informar. Outra testemunha contou ao delegado Damasceno ter visto Dalva aplicando uma injeção diretamente no peito de um gatinho levado para doação. O gato “apagou” na hora. Dalva disse que era só para “acalmar” o bichinho.
Outro depoimento dúbio: Dalva alega “amar os animais”, mas tira a chance deles viverem e os embala em jornais para serem levados embora como lixo. Dizia para as pessoas que arranjaria adotantes para os bichos numa atitude típica de protetora, mas contou ao delegado que nunca disse ser uma protetora ou ter sítio. Algumas testemunhas disseram que uma condição imposta por Dalva era não devolver os animais, ou seja, houve também irresponsabilidade por parte dessas pessoas que não se importaram de saber o destino dado aos bichos entregues a ela.
Indagações dos leitores
Na matéria publicada no dia 19 com o título “Novas e reveladoras informações sobre o caso Dalva”, os leitores demonstraram bastante revolta, tristeza e indignação. Surgiram várias dúvidas que, em parte, estão abaixo esclarecidas com o delegado responsável pelo caso:
Como os lixeiros não perceberam nada e nem foram chamados para depor?
Segundo o delegado, não houve qualquer manifestação por parte de lixeiros da região da Vila Mariana. Ele acredita que Dalva devia embalar muito bem os corpos em jornais e fechar bem os sacos de forma que somente nos aterros os bichos eram notados.
Qual a razão da demora no resultado do laudo toxicológico?
Foram analisadas 37 vísceras e, antes disso, os corpos primeiro passaram por uma necrópsia para identificar a causa da morte. Os dois procedimentos, juntos, levaram em torno de dois meses. O delegado informou que os exames dos frascos de remédio também demandam um tempo.
Por que o veterinário com quem Dalva diz ter aprendido a matar os animais não foi indiciado?
Ela disse que ele já faleceu. Seu ex-marido, médico pediatra, faleceu de leucemia aos 76 anos de idade. Ele é pai de Alice Queiroz. A título de curiosidade, Dalva foi secretária na clínica onde o pediatra trabalhava e disse que se casaram apenas depois que ele já havia se separado da mulher.
Dalva pode ser processada por exercício ilegal da profissão de veterinária?
Ela não mantinha uma clínica veterinária fantasia e nem se passava por veterinária. Ela fazia uso de um método que apenas veterinários podem usar e, mesmo assim, somente em casos muito especiais. Mas não fingia ser veterinária e, portanto, não pode ser processada por esse motivo.
Ela continuará matando animais se for uma psicopata?
O psicopata não tem cura. Sua compulsão por matar é incontrolável. Um psicopata só deixa de fazer vítimas (sejam animais ou pessoas) quando é preso, internado ou quando morre.
Em tempo
Acompanhe, em breve, o lançamento na ANDA da Série “Matadores de Animais – Assim começa a carreira de um psicopata”, com histórias do Brasil e do Exterior mostrando a estreita e perigosa relação entre pessoas que matam animais (desde a mais tenra idade) e os mais ardilosos matadores em série, que chocaram o mundo com seus rastros de violência.
Veja também a primeira parte dessa matéria em:
Novas e reveladoras informações sobre o caso Dalva