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POR JUSTIÇA

Tutor de Joca escreve carta e conta que vai lutar pelos animais: 'Ele me salvou da depressão'

26 de abril de 2024
7 min. de leitura
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Foto: Reprodução/Instagram

De repente, a vida começou a passar em câmera lenta e o choque tomou conta do corpo. Um soco no peito, quem sabe, seria menos doloroso. É assim que João Fantazzini, tutor do cachorro que morreu por negligência da Gol, relembra o momento em que recebeu a notícia da morte de Joca. Em carta enviada ao jornal O Globo, ele garante que lutará pelos direitos animais e lembra velório de ‘cãozinho’: “Pedi muito a Deus para que ele coma todas as maçãs, rúculas e beterrabas que tanto amava comer”.

O caso que comoveu o país na última semana aconteceu na segunda-feira, 22. Ao receber o cachorro já sem vida após a Gollog, empresa de transportes da Gol, errar o destino do animal, Fantazzini relembra sua primeira reação ao perceber que algo estava errado: “Eu perguntava pra menina da Gol se não tinham veterinário pra atestar que o Joca estava bem. Ela virava e falava que não tinha”.

A dor e a indignação tomaram conta do tutor de Joca ao perceber que o caso não tinha jeito. A emoção de Fantazzini é a de quem teve no cachorro seu maior companheiro em momentos difíceis, como a pandemia e uma separação. Em carta, ele conta como surgiu a ideia de criar o cachorro.

“Sempre foi meu sonho ter um golden retriever e decidi realizar. Pesquisei muito. Eu sempre morei sozinho. Quis ele porque sabia o quão amoroso um cão dessa raça é. Não que os outros não sejam, né? Mas eu tinha na minha cabeça que ele sempre seria um parceiro muito grande”, explica o tutor.

O primeiro encontro com o ‘bichinho’ foi em 2019 na cidade de Ibiúna, em São Paulo. Fantazzini lembra que ficou tão empolgado em receber o cachorro que fez até uma bolsa de maternidade com os itens que precisava para levar Joca para casa. Na época, o Golden Retriever tinha apenas três meses.

Desde então, o cão passou a ser não só um animal doméstico, mas parte de sua família. “O Joca era meu filho. Eu fazia tudo com ele. Todos os lugares que eu ia, eu adaptava pra ele. O Joca era a minha vida. A gente teve uma conexão muito grande. Como eu era sozinho, era sempre nós dois juntos. Para onde eu ia, buscava lugares que aceitavam cachorro. Caso contrário, não ia. Então ele virou um companheiro muito grande pra mim”, detalha Fantazzini.

Ele, que já tinha tido a experiência de criar e ver um animalzinho morrer quando era criança, garante que o sentimento era diferente do que experimentou com o golden. “Minha conexão com o Joca foi de filho mesmo. A gente se entendia. Era impressionante. Descobri isso quando começou a pandemia. Ele me salvou da depressão”, escreve.

Foi justamente no momento em que todo mundo precisava manter distanciamento social em razão da Covid-19 que Joca se tornou inseparável de seu tutor. Quando ele estava triste, o cachorro era quem o animava. Quando se sentia sozinho, lá estava Joca o chamando para brincar.

Fantazzini lembra a relação: “Entendia até o jeito que eu sentava, ficava me olhando. Eu chorava muito na época, porque, como eu disse, eu morava sozinho. Para você ter uma ideia, ele pegava o chinelo dele pra ficar me mostrando, na tentativa de me animar. Quando eu estava no meu sofá chorando, ele saía da sacada, sentava do meu lado e deitava. Olha que ele não aguentava, porque é muito quente para ele, e mesmo assim ficava ali, daquele jeito”.

O tutor continua, destacando a importância de Joca em momentos difíceis. “Eu era uma pessoa que tinha o mundo em volta de mim. Todo mundo me conhecia, sabia quem eu era. Na pandemia, todo mundo se afastou, claro, automaticamente. Quando comecei a ter um problema financeiro, de perder algumas coisas, ele estava ali. Ele me salvou de tudo. Literalmente tudo que eu fazia era por ele”, declarou.

Diante de tanta dedicação e companheirismo, Fantazzini admite que sempre teve medo de perder o cachorro. “É por isso que eu cuidava tanto dele. Para durar muitos anos comigo. Mas ele não durou. Eu tento achar um propósito do porquê ele veio pra cá. Não imaginei a proporção que isso tomaria. Nunca, jamais na minha vida. Acho que até agora eu não consegui que a minha ficha caísse”, se emocionou.

Indignação e luta pela causa animal

Joca morreu após um erro da Gollog, que faz parte da Gol. Ele deveria ter saído do Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP)  direto para Sinop (MT). No entanto, por conta de uma falha operacional, o animal foi embarcado em um voo para Fortaleza (CE). Quando Fantazzini conseguiu reencontrar o cão, ele já estava morto dentro do canil da empresa.

Sobre o ocorrido, o tutor do Golden faz questão de ressaltar o que ele afirma ter sido falta de cuidado com o transporte do animal. “Eu acho feio falar isso, mas eles literalmente mataram o Joca. Não tiveram cuidado nenhum”, denunciou.

Ele ainda se refere à falta de regulamentação no transporte de animais no Brasil. Isso porque a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) não define um padrão de regras para a operação. No entanto, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), solicitou que a Anac crie o documento após a repercussão do caso Joca. Atualmente, a única regulação para transporte de animais pela Anac diz respeito aos cães-guia.

Para Fantazzini, sua maior indignação é saber que não conseguiu ajudar o cão. “A maior dor da minha vida foi saber que ele morreu sozinho. Porque eu não estava ali para ajudar, que era a promessa que eu sempre fiz. Eu não pude cumprir. Peguei ele morto, e ele estava me esperando. A minha dor é muito grande por isso. Sempre falei pra ele que eu nunca iria abandoná-lo, e eu não estava lá”, escreveu em carta.

Agora, o tutor de Joca pensa em contribuir com a causa animal para que nenhum outro passe pela mesma fatalidade. “A única coisa que eu sei agora, o que quero fazer, é lutar por ele. Lutar para que nenhum outro cachorro passe por isso. Eu não deixaria mais nenhum cachorro passar pela Gol, porque eles não têm cuidado nem com os passageiros. Então como eles vão ter com o filho deles, que é um pet?”, questionou.

Emocional abalado

Visivelmente abalado, Fantazzini emocionou durante sua participação no Mais Você, da TV Globo, na última quinta-feira, 25. Ao relembrar os momentos com o cão, o tutor de Joca chorou e foi acompanhado pela apresentadora Ana Maria Braga. Na carta, ele conta que teve que fazer uso de remédios para cuidar do emocional.

“Eu acho que nunca mais vou sentir a dor que eu estou sentindo agora, por saber que nunca mais vou ter o Joca. Estou à base de remédio. Estou tomando calmante a cada três horas, porque vem tudo à tona na minha cabeça, principalmente o momento em que descobri que ele morreu. A única coisa que estou conseguindo fazer agora é dar apoio para mim mesmo”, detalhou.

Depois que recebeu o cãozinho morto da companhia aérea, Fantazzini decidiu fazer um velório para o animal doméstico. No desabafo, ele relembra o momento e conta que fez um pedido especial durante o momento triste.

“Eu velei o Joca. Meus familiares foram até lá. O irmãozinho dele foi também, porque eu era casado e o meu ex o levou para o local. Uma das melhores coisas que aconteceu pra mim foi ver os dois lá. O Lucas participou disso comigo, de uma parte da minha vida com meu filho. Quando decidi tê-lo, nós estávamos juntos. Eu pedi muito a Deus para que ele coma todas as maçãs, rúculas e beterrabas que tanto amava comer”, lamentou o tutor.

Fonte: Terra

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