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ALERTA

Por que recordes de desmatamento em janeiro e fevereiro são preocupantes?

Ano de 2022, gera preocupação nas perdas das florestas do Brasil

3 de abril de 2022
Carolina Dantas
6 min. de leitura
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Desmatamento na Amazônia foi o pior para o mês de fevereiro em 15 anos, diz Imazon Foto: Globo

Janeiro e fevereiro de 2022 acumularam recordes de desmatamento no Brasil (veja números abaixo). De acordo com especialistas ouvidos pelo g1, os números são alarmantes porque é justamente nesta época do ano que a Amazônia costuma sofrer um pouco menos com a ação de tratores e de motosserras.

Normalmente, o período entre dezembro, janeiro, fevereiro e março acumula taxas menores de desmate já que estão dentro da estação chuvosa da maioria dos estados do bioma. No entanto, as taxas atuais se comparam aos registros da estação seca em anos onde houve maior ação contra os crimes ambientais.

Os números indicam que está sendo mantida a tendência que pode levar a Amazônia a superar os 15 mil km² de destruição até julho, conforme estimativa do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Na temporada passada, foram 13 mil km².

Em janeiro foram 430,44 km² de área sob alerta de desmatamento, de acordo com o sistema Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A média para janeiro no período entre 2016 e 2021 é de 162 km²; a taxa atual foi 165% maior;

Em fevereiro foram 199 km² de áreas sob alerta de desmate, segundo o Inpe ; a média entre 2016 e 2021 é de 135 km²: o número registrado neste ano é 47% maior;

Monitoramento independente feito com outra metodologia pelo Imazon, divulgado na sexta-feira (19), aponta 70% de alta no desmatamento no mês passado; foi o pior fevereiro em 15 anos.

Motivos do avanço mesmo sob chuva

Avanço e profissionalização dos envolvidos na devastação e a redução da fiscalização são fatores já conhecidos, mas agora os especialistas associam o aumento recente também a um “senso de oportunidade”: criminosos temem que as eleições deste ano signifiquem uma mudança no combate ao desmatamento, ponto pelo qual o governo de Jair Bolsonaro foi criticado até no exterior.

Gabriel Lui, coordenador de Uso da Terra do Instituto Clima e Sociedade (iCS) e ex-coordenador do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), reforça que as taxas nesta época geralmente são mais baixas.

“Se você olhar os números mensais e comparar com os períodos mais secos, esse período que a gente está vivendo agora é mais baixo. Só que o mais baixo desse período que estamos vivendo agora está sendo mais alto do que o baixo dos outros anos. A gente costumava detectar muito pouco desmatamento nesta época”, diz Gabriel Lui, do iCS.

Justamente por causa da chuva, o desmatamento fica mais difícil e custoso nesta época do ano. Há uma dificuldade de deslocamento no campo, de posicionamento de equipamentos pesados. Além disso, com o aumento da nebulosidade, os satélites tendem a detectar menos alertas. Mesmo assim, 2022 começou com recordes de perda de floresta.

Perspectivas

Ambientalistas entrevistados pro g1 apontam que as perspectivas são de um novo ano com altas taxas e sem avanço nas propostas para reduções das emissões responsáveis pelas mudanças do clima, além de uma influência política negativa que impede e impedirá a proteção do bioma.

“O governo anunciou no ano passado lá em Glasgow que iria zerar o desmatamento ilegal até 2028. No ano passado, a gente teve 13 mil km², que foi a pior taxa desde 2006. Agora, já nos dois primeiros meses do ano, a gente gastou uma boa parte do que o governo esperava de redução para 2022. Isso é muito preocupante em relação ao número que a gente vai ter no final do ano”, avalia Gabriel Lui, do ICS.

Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon, destacou em entrevista para a GloboNews que o desmatamento já vinha crescendo e houve uma aceleração sob a gestão Bolsonaro.

“Basicamente, o governo cumpriu a promessa de reduzir a fiscalização e as pessoas no campo entendem isso rapidamente. Se tem menos fiscalização, os criminosos vão atuar. E do outro lado, quando você combina do lado do mercado, várias empresas fizeram promessas de não comprar áreas associadas ao desmatamento, mas as compras continuam. Você junta essas duas coisas aí você vê esse crescente agora”, explica Barreto.

‘Desmatamento cresceu porque governo cumpriu promessa de diminuir a fiscalização’, diz especialista

Perspectiva de recordes em ano eleitoral

Além de as altas taxas se distanciarem das metas propostas pelo governo federal na última Conferência do Clima, Ana Toni, diretora-executiva do iCS, prevê um cenário com mais recordes, com aumento da devastação por causa das perspectivas eleitorais. “Pode ser que seja o último ano de Bolsonaro”, aponta a diretora do iCS, citando o que seria uma das motivações para a atuação dos criminosos.

“Época de eleição eles vão com tudo: é assim, deixa eu desmatar tudo o que posso, com a esperança que o PL da grilagem passe e que, talvez, assim, sejam premiados em seguida com o título da terra”, explica.

Toni se refere ao Projeto de Lei 2.633, que foi aprovado pela Câmara em 2021 e altera regras para a regularização fundiária. De acordo com ambientalistas, ele aumentou a brecha para que ocupações irregulares sejam legalizadas.

Caetano Scannavino, diretor da ONG Saúde e Alegria e um dos defensores da região do Tapajós, no Pará, também vê uma influência política neste ano.

“Você tem um governo que afrouxa fiscalização e controle, você tem um último ano de governo e não sabemos quem vai assumir. Então, eu acho que os desmatadores estão aproveitando tudo o que é possível para fazer as maldades logo agora, porque no ano que vem talvez não possa mais”, analisa.

Impactos ambientais já sentidos

O monitoramento do Imazon também aponta que vivemos um começo de ano com alta no desmatamento na comparação com períodos anteriores, e um dos legados da persistência desta destruição é o agravamento da mudança climática.

“Essa alta é extremamente grave diante da emergência climática que estamos vivendo, já que o desmatamento contribui com o aquecimento global, que por sua vez intensifica as mudanças climáticas que ocasionam os eventos extremos. (…) No Brasil, já tivemos no ano passado chuvas fortes que provocaram mortes e destruições na Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro”, afirma a pesquisadora Larissa Amorim, do Imazon.

Segundo o Imazon, em relação aos nove estados da Amazônia Legal, Mato Grosso foi o que mais desmatou pelo segundo mês seguido. Apenas em fevereiro, 96 km² de floresta foram derrubados em solo mato-grossense, o que corresponde a 32% do total. Com isso, Mato Grosso também foi o estado que registrou a maior alta na devastação em relação a fevereiro do ano passado, de 300%.

“Precisamos chamar atenção para o que está ocorrendo nos municípios mato-grossenses de Colniza, Barra do Bugres e Apiacás, que ficaram entre os 10 que mais desmataram na Amazônia em fevereiro. Juntos, eles registraram 43 km² de devastação, o que somado corresponde a 45% de toda a destruição detectada em Mato Grosso”, explica Amorim.

Fonte: G1

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