Por Elisabeth Ribbans
Traduzido por Giovanna Chinellato (da Redação)
Já que a temporada de corridas National Hunt está terminando, talvez seja um bom momento para fazer uma pausa e lembrar todos os cavalos que não sobreviveram até aqui.
Fatalidades em ocasiões de alto risco como o Grand National em Aintree, onde quatro cavalos morreram em três dias esse mês, podem atrair a mídia – seria um ano bem incomum se nenhum animal tivesse perdido a vida no evento – mas eles representam só uma pequena fração dos cavalos mortos com menos de um murmúrio de reconhecimento no ramo de corridas inglês.
A maior parte das mortes ocorre em corridas de obstáculo, mas não todas. Desde o início da temporada de inverno, em meados de novembro, 51 cavalos da National Hunt foram para casa em sacos pretos. Enquanto isso, em corridas comuns ou de obstáculo, de janeiro a abril de 2010, o número de mortes já chegou a 139.
A British Horseracing Authority (BHA) se recusa a publicar detalhes do assunto, então o trabalho de contar os corpos fica para a Animal Aid, que publica as informações em seu website. “Nós escavamos tudo que podemos sobre mortes em corridas do Racing Post e acreditamos em informações dos detentores de registros oficiais, treinadores, apostadores e espectadores preocupados”, disse o diretor da organização, Andrew Tyler.
Nos últimos três anos a Animal Aid registrou mais de 500 mortes de cavalos de corrida britânicos. A lista é terrível: perna quebrada, pescoço quebrado, tendinite severa, ataque cardíaco, colisão e morte. É praticamente esse o ritmo das coisas. A BHA – que diz monitorar todos os acidentes em pistas de corrida, mas alega que é apenas para “satisfazer pesquisadores”- não disputa com a Animal Aid. “Corrida de obstáculos é um esporte que carrega riscos e alguns chegam a ver como um nível aceitável de risco, apesar de tentarem constantemente reduzi-lo”, diz o porta-voz da BHA, Paul Struthers.
Apoiadores alegam que um cavalo não faria nada que não goste e a BHA aponta que, mesmo com o fato de os jóqueis terem de carregar um chicote, seu uso é opcional. Eles dizem que o bem-estar é levado a sério, e descrevem as mortes como “acidentes”. Ao assistir a uma corrida, você tira suas próprias conclusões sobre o chicote, sobre o que define um acidente e sobre o número de cavalos que continua morrendo. O festival Chelteham, o ápice do calendário da National Hunt, deixa claro que esforços para melhorar a segurança não parecem estar sendo úteis. Quatro cavalos perderam suas vidas em março – uma melhora em relação a 2006, de 11 mortes, quando o trajeto foi modificado, mas, fora isso, foi o ano com mais fatalidades da década.
Alguns anos atrás eu fui convidada para o famoso Danish Derby em Copenhagen. Quando passei pelo padock, meus olhos perceberam uma protuberância do tamanho de um punho de carne pulando para fora da perna de um cavalo. Não me parece algo que você veja num animal saudável e eu engasguei com a possibilidade de ele ter de correr a próxima corrida. As pessoas que me convidaram disseram que o cavalo estava apto para correr, já que era um pista sem obstáculos, enquanto eu tentava acreditar que, por ser uma pista reta, as chances de uma tragédia eram menores. Eu estava errada em tentar acreditar: alguns minutos de corrida e esse cavalo tropeçou. Pouco tempo depois seu corpo estava sendo transportado num saco preto de cadáver. “Ele quebrou a outra pata”, disse um veterinário de equinos, explicando que ele provavelmente teria apoiado muito peso do seu “lado bom”. “Droga”, disse um cara na nossa mesa, bebericando sua champanhe, “eu tinha apostado nesse daí”.
Não duvido que muitos tratadores e garotos do estábulo fiquem tristes quando um cavalo de sua ala não volta para casa. O que perturba e irrita é a impressão coletiva de que esses magníficos animais são tratados como se só existissem para nosso entretenimento. “É um infortúnio que esses acidentes aconteçam”, disse Iain Woolnough, gerente do Virginia’s Colonial Downs, depois que seu cavalo morreu no verão de 2007. “Ficamos chateados quando acontece, mas é só parte do jogo da corrida”.
Será que realmente precisa ser parte do jogo? Tenho muita certeza de que um cavalo dando de cara num carro em uma rodovia é uma tragédia. Estou bem menos certa da razão pela qual cavalos “fazendo o que foram criados para fazer” acabam também em tragédias. Talvez os cavalos sejam forçados a “praticar” um esporte. Talvez os obstáculos sejam altos demais, os trajetos, longos demais, estreitos demais e considerações médicas pouco levadas em conta. Ouço essas teorias expostas e negadas, mas não ouço debates bem informados ou o clamor por um.
“Se participantes humanos morressem na mesma proporção que os cavalos no Grand National, haveria tumultos e muitas repercussões”, disse a League Against Cruel Sports no encontro deste ano. Mas não consigo evitar pensar que uma pessoa não precisa apelar para esse nível de empatia para ter razão. Se collies estivessem quebrando seus pescoços nos pulos na água e em competições de agility, poderíamos esperar uma revolta coletiva.
É claro que tem muita grana envolvida. Corridas de cavalo renderam à economia britânica 3,7 bilhões de euros em 2008, fazendo dela o segundo esporte mais popular, perdendo somente para o futebol.
O fato é que grandes negócios e bem estar-animal nunca foram colegas de estábulo.
Com informações de Guardian UK