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EMOÇÕES COMPLEXAS

Estudo questiona comportamento pacífico dos bonobos, os macacos 'hippies' primos dos chimpanzés

20 de abril de 2024
4 min. de leitura
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Foto: Getty Images

Um grupo de biólogos que passou anos observando populações de bonobos, símios evolutivamente próximos dos humanos e dos chimpanzés, publicou hoje um estudo questionando a fama de pacífica que essa espécie, apelidada de macaco “hippie”.

Estudos da primatologista Jane Goodall na década de 1960 influenciaram muito o estudo da natureza da agressividade, porque mostraram que os chimpanzés machos na Tanzânia ocasionalmente se juntam em ‘gangs’ para atacar grupos rivais, numa forma primitiva de guerra. O estudo do fenômeno, porém, se tornou mais complexo quando os bonobos começaram a ser mais bem estudados na bacia do Congo.

Esses outros primatas, além de não promoverem violência coletiva, possuem estrutura social diferente, com alguns grupos sendo liderados por fêmeas. Isso lhes rendeu também os apelidos e macacos “pacifistas” e até “feministas”.

O estudo que sai hoje, liderado pela bióloga Maud Mouginot, da Universidade de Toulouse (França), dá uma ideia do quão exagerado, ou simplesmente equivocado, é esse imaginário construído em torno desses carismáticos macacos congoleses.

Ao fazer um levantamento da quantidade de interações agressivas que machos das duas espécies de macaco tinham com outros indivíduos, a cientista mostrou que bonobos se envolvem em brigas com mais frequência, e não menos, do que os chimpanzés. Foram monitoradas Junto com três colegas das univerisdades Harvad e do Minnesotta, ela explica em artigo na revista Current Biology que os bonobos também usam a violência para benefício próprio, e muito.

“Surpreendentemente, encontramos taxas mais altas de agressão entre homens entre os bonobos do que entre os chimpanzés, mesmo limitando as análises à agressão por contato”, escreveram Mouginot e colegas. “Em ambas as espécies, machos mais agressivos obtiveram maior sucesso reprodutivo.”

Chegar a essa conclusão deu um bocado de trabalho para os biólogos. Para obter dados em número suficiente para ter significância estatística, os cientistas acompanharam três comunidades de bonobo na República Democrática do Congo e duas de chimpanzés na Tanzânia. Somados os dias de “perseguição” focando indivíduos empenhados em cada uma delas, o tempo de observação equivale a 14 anos de dados.

O que a pesquisa revelou, mais do que quantificar ataques, é que a estratégia de agressividade é diferente quando se compara as duas espécies. Enquanto bonobos machos agridem principalmente outros machos, os chimpanzés dividem mais sua hostilidade entre fêmeas e outros machos. Um macho bonobo típico acaba tendo mais contato com outros machos, porém, o que resulta em mais violência dentro dos próprios grupos, ainda que não haja tanta escaramuça entre grupos rivais.

Ligações políticas

O estudo mostra um sinal claro de que esse comportamento emergiu conferindo vantagem aos indivíduos mais agressivos. Tanto entre chimpanzés quanto entre bonobos, os machos que se envolviam em episódios de violência com mais frequência tiveram maior sucesso reprodutivo.

Argumentar que bonobos são mais violentos que chimpanzés, porém, ainda é algo que envolve uma certa complexidade, porque os segundos exibem comportamentos mais chocantes que não foram registradas entre os primeiros até agora, como estupros e assassinatos de indivíduos da mesma espécie. Fêmeas de bonobo, em contrapartida, são via de regra mais violentas que as de chimpanzé.

Apesar cometerem atos análogos aos de “crimes hediondos” de humanos, os chimpanzés tem um ponto em seu favor quando tratam de prevenir violência. Na década de 1970, os primatólogos Frans de Waal e Richard Wrangham mostraram que muitas sociedades de chimpanzés administram disputas internas formando coalizões “políticas”. Indivíduos mais carismáticos podem ganhar status agregando mais aliados, intimidando rivais pelo tamanho de seus grupos, sem usar necessariamente a agressão.

Segundo Mouginot, isso pode estar por trás da maneira com que cada espécie emprega violência.

Embora nossas descobertas indiquem que a frequência da agressão entre machos não reflete a diferença entre espécies em sua intensidade, elas apoiam a visão de que, ao contrário dos chimpanzés machos, cujo sucesso reprodutivo depende de coalizões fortes, os bonobos machos têm estratégias reprodutivas mais individualistas”, escreveu a cientista.

O estudo dessas espécies para entender a natureza da agressividade em humanos, de qualquer forma, continua válida, porque bem ou mal nosso DNA é mais de 99% similar ao desses macacos, e eles por sua vez também são capazes de perpetuar comportamentos por meio de transmissão cultural, não apenas genética.

Em comunicado à imprensa Mouginot afirma que sua intenção não é a de denegrir a imaginário popular que se construiu em torno das duas espécies de macaco que são os nosso parentes mais próximos na árvore da vida.

“A ideia não invalidar a imagem dos bonobos como sendo pacíficos. A ideia é que existe muito mais complexidade dentro de ambas as espécies”, afirmou.

Fonte: Um Só Planeta

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