A fauna pantaneira é bastante celebrada por autoridades, tem imagens usadas em propagandas de Mato Grosso do Sul, é retratada por artistas, mas basta uma viagem de carro até o coração do Pantanal para verificarmos que a realidade é bastante diferente do romantismo das telas ou do que é exibido nos comerciais.
Muitos animais, que figuram inclusive em lista de extinção do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), são atropelados e mortos pela imprudência dos motoristas que trafegam em alta velocidade pelas estradas da região.
Também há falta de iniciativa do poder público e sociedade civil em buscar alternativas para solucionar o problema.
No entanto, um projeto do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) no Estado, anunciado recentemente pelo Ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, não vai inaugurar um capítulo especial de proteção à fauna, mas está sinalizando o começo da conscientização sobre o problema no Estado.
Nele está prevista a instalação até 2011 de cercas de arame sob pontes localizadas na BR-262, trecho Miranda/Corumbá (MS) para orientar a passagem de animais. O projeto está vinculado à reforma da BR, que ainda recebe acostamento e recapeamento do asfalto, no valor de R$ 230 milhões.
Segundo o superintendente do Dnit, Marcelo Miranda, as cercas serão colocadas em pontes que estão na BR-262 do local que é conhecido como Buraco das Piranhas (a 70 quilômetros de Miranda) até a ponte sobre o Rio Paraguai, a 100 quilômetros de Corumbá.
As pontes que terão cercas embaixo já servem para o tráfego dos veículos na estrada, uma vez que a região é alagada em época de cheia. “De 100 em 100 metros temos uma ponte neste trecho”, descreve o superintendente.
Quando o Pantanal estiver em período de cheia, no entanto, as cercas não devem ajudar os animais na travessia de um lado para o outro. “Na cheia, inclusive, os animais buscam refúgio nas BRs porque a estrada costuma estar num nível maior ao do Pantanal”, aponta a doutora em Ecologia e Conservação, Janaína Casella, que realizou estudo sobre o atropelamento de animais na BR-262 e vê com bons olhos a iniciativa das cercas instaladas sob as pontes. “Há muito que se fazer para evitar os acidentes envolvendo animais, mas estas cercas podem resolver parte do problema. Depois de instaladas tem de haver um monitoramento de dados sobre a utilização delas, pelos animais”, continua a pesquisadora. O superintendente do DNIT disse que ainda não está desenhado um projeto de monitoramento.
Estatísticas
Não há estatísticas oficiais sobre a quantidade de animais atropelados nas estradas que cortam o Pantanal – pelo menos em Mato Grosso do Sul. A Polícia Militar Ambiental não realiza a contagem, a Polícia Rodoviária Federal/MS (PRF) apresenta apenas as estatísticas gerais de acidentes registrados, envolvendo animais.
Mas pesquisadores que já tiveram o tema como objeto de estudo fazem estimativas preocupantes. A pesquisadora Janaína Casella apontou num estudo defendido como tese de doutorado no começo do ano, que em algumas viagens partindo de Campo Grande com destinos à Aquidauana e Miranda, dezenas de animais foram encontrados mortos na BR-262 nos trechos citados. “Foram 231 animais. Os mais vistos foram lobinhos (71); tatu-peba (52); tamanduá-bandeira (36); tatu-galinha (20) e tamanduá-mirim (19)”, contabiliza.
Mas o número levantado em algumas viagens está ainda aquém da realidade, pois só foram contadas pela pesquisadora as carcaças dos animais que estavam na BR. Há muitos casos em que os animais são atingidos, conseguem caminhar alguns metros e morrem no mato.
Outro pesquisador, o biólogo Wagner Fischer, chegou a uma estimativa em 2002, de 2.600 mortes/ano na BR-262, trecho Campo Grande/Corumbá. “Mas este dado é muito conservador. No mínimo, a taxa de atropelamento é o dobro disso, mas acredito que seja muito maior”, relatou Fischer, que na época do estudo era professor/pesquisador da UFMS.
Os dados no entanto ainda são insuficientes e não há condições de fechar um índice de atropelamento de animais. Na Espanha, por exemplo, a estatística de atropelamentos é de 10 milhões de animais por ano; na Holanda, são 6 milhões, e nos Estados Unidos, o número chega a 1 bilhão de animais mortos nas estradas daquele país, por ano.
Nos países de primeiro mundo, os dados são extraídos de maneira mais eficaz com constante monitoramento das estradas. “No Brasil, onde temos uma biodiversidade maior do que nos EUA, por exemplo, acredito que o número de atropelamento de animais seja realmente assustador, maior do que nos Estados Unidos. É uma tragédia silenciosa que ocorre nas estradas brasileiras”, constatou o pesquisador.
Na estrada
Os acidentes nas estradas que envolvem animais também ameaçam a vida humana. Segundo estatísticas da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Estado, em 2009, foram registrados 185 acidentes ocasionados pelo choque com animais que resultaram em uma morte; 13 vítimas graves e 39 com lesões leves. Em 2010, a PRF divulgou estatísticas até o mês de abril: foram 38 acidentes ocasionados em razão de atropelamento de animais; com duas vítimas graves e sete leves.
A alta velocidade dos carros é apontada por autoridades e pesquisadores como maior fator de atropelamento dos animais e consequentemente dos acidentes envolvendo veículos. Segundo o DNIT, a velocidade máxima na BR-262, que atualmente é de 80 quilômetros por hora, não será alterada em razão do alto índice de tráfego de animais. Já a PRF monitora a velocidade dos carros com radares e admite que poucos cumprem a velocidade recomendada.
Lombadas, trechos sinalizados de forma mais dinâmica e mais fiscalização, além é claro de educação e conscientização dos motoristas, pode ser a equação para ajudar a diminuir o atropelamento dos animais e a salvar vidas segundo a pesquisadora Janaína. “É um conjunto de ações que vai diminuir o índice de atropelamento dos animais”.
Fonte: Aquidauana News