Criada há quatro anos para estabelecer metas e locais no Brasil – que abrigam espécies únicas de animais ameaçados de extinção – nos quais devem ser investidos recursos e atenção, a Aliança Brasileira para Extinção Zero (BAZE) vai divulgar em breve levantamento que está sendo finalizado com as indicações. O anúncio vem em boa hora: a Organização das Nações Unidas declarou 2010 o ano da biodiversidade e pretende não apenas ampliar a discussão sobre a conservação da diversidade biológica no mundo, mas rever metas de conservação estabelecidas na Rio Eco 1992 e verificar o que foi feito pelas nações nesses 18 anos. O encontro, que vai reunir especialistas de todo o mundo e representantes dos países signatários da Convenção da Diversidade Biológica, ocorre em outubro, em Nagoya, no Japão, e promete chamar a atenção para o problema, refletir sobre o assunto, aprofundar a discussão e indicar soluções.
Composta por várias instituições governamentais e não governamentais, a BAZE usou metodologia internacional para fazer a escolha e o Livro vermelho da fauna ameaçada de extinção, de 2008. São espécimes da fauna que ocorrem em uma única localidade, com reduzido número de indivíduos. Exemplo disso é o entufao-baiano (Merulaxis stresemanni), descoberto no norte de Minas Gerais, na localidade de Bandeira. Endêmico da mata atlântica, o pássaro tem sua última população nessa área do estado, que está em processo de transformação em reserva particular do patrimônio natural (RPPN) da organização não governamental Biodiversitas, que trabalha em prol da conservação da natureza.
A compra do terreno já é uma ação, similar à prevista pela aliança em outras regiões do país, para a conservação da espécie. “Esse tipo de ação é o que estamos prevendo que ocorra, juntamente com o apoio dos integrantes da aliança, como o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Conseguimos adquirir a área para fazer o trabalho de preservação e conservação da espécie com a ajuda da American Bird Conservancy”, diz a superintendente técnica da Biodiversitas, a bióloga Gláucia Drummond.
Um caso de sucesso de conservação que já dura 15 anos e com resultado efetivo é uma área protegida pela Biodiversitas em parceria com o Ibama em Canudos (BA), onde havia 50 araras-azuis-de-lear, espécie que há alguns anos estava criticamente em perigo, um dos piores estágios de conservação. Nesse trabalho, foi possível que a ave voltasse a viver em seu hábitat sem tantos conflitos e, agora, tem população de mais de 1 mil indivíduos. “Esse é um resultado emblemático. A arara-azul-de-lear está em perigo, mas teve um aumento significativo em sua populção e melhorou sua condição de conservação”, acrescenta Gláucia.
Conscientização
Para o biólogo e especialista em assuntos de biodiversidade da ONG Conservação Internacional (CI) Adriano Paglia, o ano da biodiversidade estabelecido pela ONU é importante, pois vai permitir que haja uma discussão direcionada sobre o tema. Segundo ele, “nos últimos anos houve debate importante sobre as mudanças climáticas, mas a biodiversidade no planeta vem se erodindo de maneira mais palpável e preocupante”.
“Acho importante para provocar essa conscientização geral e rever o que foi acordado em 1992, no encontro no Rio de Janeiro. É importante avaliar o que foi proposto, o que de fato foi feito e onde podemos melhorar. Além disso, vamos avaliar o status de conservação da fauna e da flora usando as listas oficiais. Para se ter ideia, o Brasil tem uma lista polêmica, a da flora, em que foram levantadas por pesquisadores 1,5 mil espécies em risco de extinção, embora o MMA tenha reconhecido apenas cerca de 500. Outro objetivo mais ambicioso que vejo com esse debate é reduzir os números de ameaças de extinção, pois muito pouco tem sido feito nesse sentido”, diz Paglia.
Outra questão importante levantada pelo biólogo são os ataques sistemáticos à legislação ambiental brasileira. “A discussão do novo Código Florestal é fundamental, mas, como está colocada, é complicado, pois reduzir áreas de preservação permanente (APPs) e transferir a responsabilidade que hoje é da União para os estados de definir qual a porcentagem de reserva legal deve ser feita em cada propriedade (reserva legal é uma área que deve ser ‘separada’ e protegida em uma fazenda, por exemplo) acho perigoso para a biodiversidade. Tem de haver diálogo entre os setores ambientalista e produtivo, o que não pode é radicalização de opinião nem lobby muito forte, pois os danos poderão ser muito grandes”, acrescenta.
Listas vermelhas
As listas vermelhas são documentos que indicam quais espécies estão ameaçadas de extinção e formam importante instrumento de política ambiental, pois possibilitam o estabelecimento de programas prioritários para a proteção da biodiversidade. As informações desses documentos fornecem subsídios para a formulação de políticas de fiscalização, criação de unidades de conservação e definição sobre a aplicação de recursos técnicos, científicos, humanos e financeiros em estratégias de recuperação da fauna ameaçada.
Para se ter uma ideia da lista para fauna no Brasil, 627 espécies foram classificadas em uma das três categorias de ameaça (Criticamente em perigo, Em perigo e Vulnerável) adotadas para a avaliação. Os vertebrados somam 67% do total de espécies indicadas e, entre estes, estão cerca de 13% das espécies brasileiras de mamíferos. O bioma mata atlântica é o que apresenta maior número de espécies ameaçadas ou extintas, com 383, seguido pelo cerrado (112), marinho (92), campos sulinos (60), Amazônia (58), caatinga (43) e pantanal (30). Isso significa que, em conjunto, mata atlântica e cerrado respondem por mais de 78% das espécies da lista, ou seja, 495.
No trabalho de listar as espécies ameaçadas no Brasil, a Fundação Biodiversitas listou, com a ajuda de 300 pesquisadores e especialistas do país, 1.495 plantas, mas o MMA só reconheceu 472. Os critérios usados seguiram a IUCN (sigla em inglês para União Internacional de Conservação da Natureza).
Fonte: Uai