EnglishEspañolPortuguês

DESSERVIÇODESSERVIÇODESSERVIÇO

Brechas na lei de proteção animal da China trazem risco de novas pandemias

Após um ano da pandemia da Covid-19, conservacionistas temem que os esforços de Pequim para prevenir o surgimento de outra doença zoonótica não vão longe o bastante, escreve William Yang.,Após um ano da pandemia da Covid-19, conservacionistas temem que os esforços de Pequim para prevenir o surgimento de outra doença zoonótica não vão longe o bastante, escreve William Yang.,Após um ano da pandemia da Covid-19, conservacionistas temem que os esforços de Pequim para prevenir o surgimento de outra doença zoonótica não vão longe o bastante, escreve William Yang.

15 de fevereiro de 2021
Gabriela Alves | Redação ANDA Gabriela Alves | Redação ANDA Gabriela Alves | Redação ANDA
8 min. de leitura
A-
A+
Foto: Animal Equality

Já faz mais de um ano desde que o surto de um vírus misterioso foi rastreado até um mercado úmido da cidade central chinesa de Wuhan, e era difícil para qualquer um imaginar em janeiro de 2020 que a doença antes desconhecida, que viria a ser chamada de Covid-19, infectaria mais de 100 milhões de pessoas no mundo todo.

Pouco depois da propagação do vírus pela cidade de mais de 11 milhões de habitantes em janeiro de 2020, oficiais locais em Wuhan rapidamente fecharam o Mercado de Frutos do Mar de Huanan. Depois, em fevereiro de 2020, o Congresso Nacional do Povo (NPC) da China aprovou uma proibição no consumo de animais selvagens como alimento.

A ação foi seguida por planos de revisar a Lei de Proteção à Vida Selvagem da China, reformar a Lei de Prevenção de Epidemias Animais e de introduzir uma Lei de Biossegurança, tudo isso fazia parte dos esforços de Pequim para prevenir outras doenças zoonóticas de passar de animais para humanos no futuro.

A proibição temporária de alimentar-se de vida selvagem teve alguns efeitos imediatos nos mercados e fazendas de animais selvagens da China, uma indústria lucrativa que vale £13 bilhões anualmente, de acordo com um relatório publicado pelo Brookings Institute, em janeiro. A proibição significa que o hábito de consumir vida selvagem como alimento se tornará algo que pertence ao passado em muitas partes da China.

“Basicamente, não há oportunidades de pessoas normais consumirem animais selvagens como alimento em muitas partes da China”, disse Jay Fang da Fundação de Consumidores Verdes em Taiwan (Green Consumers’ Foundation). “Acredito que cidadãos normais na China agora estão mais cientes do efeito da proibição introduzida pelo governo chinês em 2020”.

Foto: Animal Equality

De acordo com o Fang, o banimento tornou quase impossível que comerciantes vendessem animais selvagens nos mercados pela China. “Mesmo que algumas pessoas ainda tentem comprar vida selvagem de forma clandestina, agora é difícil para o comércio de animais selvagens voltar à mesma escala que costumava ter antes da pandemia”, ele contou ao “Independent”.

“A pandemia realmente ensinou às autoridades chinesas uma lição difícil, e eles não são mais tão tolerantes em relação ao comércio de vida selvagem e ao seu consumo como alimento. Contudo, enquanto Pequim agiu rapidamente para aplicar a proibição do consumo de animais selvagens, eles não abordaram de fato os problemas estruturais por trás de um ecossistema inteiro de comércio de vida selvagem”.

A campanha “Pare o Comércio Ilegal de Vida Selvagem” do jornal “The Independent”, que foi lançada no ano passado, busca um esforço internacional para parar com a caça e comércio de animais selvagens, que continua sendo uma das maiores ameaças à biodiversidade no futuro.

A publicação está trabalhando com entidades de conservação incluindo a Space for Giants e a Freeland para proteger a vida selvagem em risco devido à crise de financiamento à conservação causada pela Covid-19. Como a China iniciou alguns esforços para conter o consumo de vida selvagem no país após o surto do novo coronavírus, o “Independent” trabalha com seus parceiros para conseguir mais informações sobre o impacto das ações de Pequim.

E de acordo com a ACTAsia, uma organização sem fins lucrativos que trabalha para realizar mudanças sociais sustentáveis na China, a série de medidas introduzidas desde fevereiro de 2020 para banir o consumo de vida selvagem e seu comércio ilegal criou várias lacunas que poderiam, potencialmente, levar a outra pandemia causada por uma doença zoonótica no futuro.

Enquanto alguns animais, como o pavão azul, foram agora proibidos para o consumo, pessoas ainda são livres para comercializá-los para entretenimento ou outros propósitos.

“Apesar de proibirem as pessoas na China de se alimentar de certos tipos de animais selvagens, as novas leis e emendas introduzidas no ano passado ainda permitem sua criação e comércio para outros propósitos, incluindo peles, remédios ou entretenimento”, disse Pei Su, a fundadora da ACTAsia.

“Sob a nova lei, sapos e cobras ainda podem ser consumidos como alimento ou criados para propósitos comerciais”,  Fang explicou. “A única diferença antes e depois da pandemia do coronavírus é que algumas espécies desapareceram do mercado como fonte de alimento”.

A sra. Su aponta que enquanto as leis existentes proíbem pessoas chinesas de comer certas espécies de animais selvagens, eles ainda podem ser criados para outros propósitos permitidos sob as novas regras.

“Muitas pessoas pensaram que a atualizada Lei de Proteção à Vida Selvagem tinha banido todo o comércio ilegal de vida selvagem, mas muitos animais selvagens foram recategorizados como ‘gado’ ou ‘animas selvagens aquáticos’, ambos permitidos de serem criados e comercializados para outros propósitos”, ela explicou.

Pei Su disse que animais foram recategorizados como “gado” na China, o que permite que eles sejam isentos da Lei de Proteção à Vida Selvagem e da proibição anunciada em fevereiro de 2020. Além disso, sapos foram categorizados como “animais selvagens aquáticos”, o que permite que comerciantes continuem vendendo-os nos mercados na China.

“As leis da China frequentemente parecem muito completas na superfície, mas na verdade, há várias brechas que permitem que atividades ilegais continuem sob alguma ‘moderação’”, ela adicionou.

No relatório do Brookings Institute, Vanda Felbab-Brown, diretora da Iniciativa sobre Atores Armado Não-Estatais da organização (Initiative on Nonstate Armed Actors), destacou um exemplo de como as regulamentações existentes têm ambiguidades que farão os animais selvagens permanecerem vulneráveis à criação comercial ou à exploração na China.

“Embora a maior parte da medicina tradicional chinesa não use partes de animais selvagens, os produtos usados exacerbaram dramaticamente o colapso de espécies selvagens em todo o mundo por meio do comércio ou da caça”, ela escreveu.

“Práticas anti-higiênicas nas fazendas de vida selvagem da medicina tradicional chinesa produzem riscos parecidos de zoonose, a não ser que as práticas veterinárias e de abate sejam melhoradas. Pior ainda, muitas fazendas de vida selvagem na China e em outros lugares são, na verdade, abastecidas da natureza, introduzindo patógenos nas fazendas e colocando em risco populações selvagens ”.

Foto: Animal Equality

Su contou ao “Independent” que desde que a China suspendeu as consultas para revisar a Lei de Animais Selvagens, em novembro de 2020, grupos conservacionistas temem que a lei existente crie brechas que podem levar a uma grave pandemia no futuro.

“Há sérias preocupações de que os Artigos 26 e 29 da lei na verdade apoiam a criação em cativeiro de animais selvagens com uma licença, com a única condição de que a espécie já tenha um número substancial de população sendo criada em cativeiro”, ela disse. “Uma vez que uma licença é emitida para criar uma espécie em cativeiro, essa permissão pode rapidamente evoluir à categorização de um animal selvagem como animal de consumo”.

Su explicou que essas práticas levaram à criação comercial generalizada de animais selvagens como visons, raposas e cães-guaxinim, que são rotulados como animais próprios para consumo na China e criados intensivamente para obtenção de suas peles.

“Como as pesquisas mostraram que os visons e os cães-guaxinim são hospedeiros intermediários potenciais na transmissão do coronavírus, a criação comercial em grande escala e o comércio desses animais cria sérios riscos de causar outra pandemia no futuro”, ela acrescentou.

Enquanto tais brechas permanecem nas leis designadas para restringir o comércio de vida selvagem na China, Su continua pessimista sobre a campanha de Pequim para prevenir futuros surtos de doenças zoonóticas. “Como cerca de 75% das doenças zoonóticas se originaram de animais selvagens, se a China continuar a permitir a criação comercial e o comércio de animais selvagens, a transmissão de doenças zoonóticas de animais para humanos nunca vai parar”, ela alertou.

“A Covid-19 é um exemplo perfeito de como as doenças zoonóticas se espalharão dos animais para os humanos, então, se quisermos evitar que mais pandemias aconteçam, precisamos proibir a reprodução comercial em grande escala e o comércio de todos os tipos de animais selvagens.”

Como o Congresso Nacional do Povo da China espera retomar em março, a comunidade conservacionista está agora tentando impelir o governo chinês a reformar ainda mais a Lei de Proteção à Vida Selvagem e a aprovar mais leis para garantir que o tráfico de animais selvagens possa ser completamente banido no país.

“Visto que a China possui uma consciência muito baixa sobre a conservação da vida animal, isso torna difícil para o governo aplicar de forma abrangente quaisquer leis relevantes que eles promulgaram”, disse Su.

“Uma vez que as vacinas e tratamentos para a Covid-19 se tornarem amplamente disponíveis, as pessoas chinesas logo esquecerão o que causou toda a pandemia. Nós precisamos conscientizar a geração mais jovem na China sobre porque eles não devem comer, criar ou comercializar animais selvagens. Enquanto a criação comercial e o comércio de animais selvagens ainda forem permitidos, o comércio ilegal de vida selvagem continuará a sobreviver na China”.

    Você viu?

    Ir para o topo