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Resposta ao argumento "Meus ancestrais não inventaram lanças e flechas para caçarem repolhos"

4 de maio de 2016
2 min. de leitura
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Recentemente tem esboçado uma popularização a frase “Meus ancestrais não inventaram lanças e flechas para caçarem repolhos”, numa tentativa de defender e justificar o consumo de carne. Não sabem seus compartilhadores que essa afirmação é um pacote de falácias e, no final das contas, fracassa em tornar aceitável o consumo de carne – e outros alimentos de origem animal.
Tal frase incide, ao mesmo tempo, nas seguintes falácias:
– Conclusão irrelevante: a partir da premissa de que os ancestrais dos seres humanos modernos usavam armas rudimentares para caçar animais, traz uma conclusão que nada tem a ver com isso: a aceitabilidade do consumo de carne na época atual, em que há muito tempo não é mais necessário caçar, bastando ir ao açougue da esquina e comprar carne vinda de fazendas que subjugam e exploram animais que não podem fugir, para se obter e comer esse tipo de alimento;
– Apelo à tradição: tenta justificar o consumo de carne por ele ser uma tradição de dezenas de milênios, desde a época em que era necessário caçar animais “comestíveis” no meio selvagem com lanças e arcos-e-flechas. Na verdade a tradição não pode ser usada para justificar violações da ética, afinal, escravizar seres humanos e fazer guerras de agressão por expansionismo imperial também são tradições milenares, e nem por isso são defendidas como eticamente aceitáveis pela maioria dos consumidores de carne hoje;
– Falsa dicotomia: coloca como únicos alimentos consumíveis por seres humanos carnes e folhas, quando na verdade há centenas ou milhares de opções vegetais, entre frutas, verduras, legumes, grãos e cereais, sementes, castanhas, oleaginosas etc. E manifesta a crença de que o mundo seria dividido entre pessoas que “só comem carne” e outras que “só comem folhas”;
– Falácia de omissão: omite que a grande maioria dos seres humanos há muito tempo não precisam mais caçar para obter carne, contando com uma pecuária que rende em fartura esse tipo de alimento – a troco da objetificação e matança de bilhões de animais por ano e pesados impactos ambientais que podem inviabilizar a própria vida humana a longo prazo.
Por ser multiplamente falaciosa, a afirmação que liga o consumo de carne de hoje ao uso de lanças e flechas de caça milhares de anos atrás não faz nenhum sentido. Falha em ser uma desculpa para não aceitar a responsabilidade ética, via consumo de carne, pela morte violenta de incontáveis animais por ano. E reflete uma mentalidade ético-moral de muitas pessoas que nunca saiu de uma época em que, em muitos lugares, prevaleciam a “lei do mais forte”, a escravidão, as guerras de agressão, as violências injustas impunes, a justificação religiosa da crueldade, a submissão a regimes tirânicos e outras tradições que hoje consideramos absurdas.

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