EnglishEspañolPortuguês

Cada um tem uma forma potencial de contribuição para a causa dos direitos dos animais

28 de setembro de 2010
8 min. de leitura
A-
A+

foto_mariana_hoffmannMariana Hoffmann tem 28 anos, é jornalista e em 2008 colocou em prática um projeto de mídia independente pelos direitos dos animais. O Informe Vegano é uma publicação bimestral que chega à quarta edição promovendo os temas relacionados à questão animal, como a bioética, o ecofeminismo e a adoção. Mariana falou à ANDA sobre o Informe, que tem um projeto visual de zine, é produzido “artesanalmente”, reproduzido em cópias xerox e com tiragem que nesta edição atinge 400 cópias. Distribuído pessoalmente, o Informe tem copyleft – direitos liberados de reprodução de conteúdos. A iniciativa mostra que fazer crescer o interesse pelo veganismo é um objetivo que está ao alcance de todos e que muitas vezes parte de ímpetos idealistas individuais isolados, para depois ganhar repercussão. Em 2009, Mariana quer ver seu Informe Vegano na internet, mantendo a proposta gráfica da versão impressa.

ANDA – O que a levou ao veganismo?

Mariana Hoffmann – Eu sou vegana há um ano e meio mas sou vegetariana há dois anos. Nunca comi muita carne. Fiz esta opção numa aula de yoga. Eu estava fazendo meditação e de repente caiu a ficha: por que eu como carne? Eu gosto dos animais, sinto respeito por eles e acho que eles têm direito à liberdade e à vida. Então por que eu estou cuidando de uns, dando preferência para alguns como gato, cachorro e periquito e estou comendo outros? Isto não faz o menor sentido. Foi aí que eu comecei a repensar várias coisas e me tornei vegetariana. Com o veganismo foi um pouco diferente. Eu conheci uma pessoa ligada ao hardcore de Curitiba que tem uma banda. Eles são muito ligados a esta questão do veganismo. Com o vocalista da banda Nieu Dieu Nieu Maitre, o Gustavo, eu comecei a fazer algumas intervenções urbanas. A gente saia na rua de madrugada para fazer estas intervenções. Ele era vegano e eu era vegetariana. Comecei a entender que o leite tem tanta crueldade quanto a carne. Se você for pensar, esses animais ficam aprisionados, depois acabam sendo abatidos do mesmo jeito, eles têm uma vida miserável. A questão animal é tudo, não é só a carne, é o leite, a manteiga, tudo que vem dos animais. Aí resolvi cortar tudo de origem animal e fazer o pensamento virar prática.

ANDA –  Como é essa experiência de intervenções urbanas pelo veganismo?

Mariana Hoffmann – Eu chamo de intervenção urbana, porque não são pichações. A pichação é uma coisa, você faz qualquer coisa, suja. Isto é uma pichação. Uma intervenção urbana é quando você passa uma mensagem, quando diz alguma coisa, quando você é impulsionado por uma ideia.

ANDA – Num primeiro momento me parece que seria mais fácil e de baixo custo alguém montar um blog sobre veganismo. Mas você optou por um veículo impresso, que exige uma estrutura de produção e distribuição. A ideia do Informe Vegano surgiu como?

Mariana Hoffmann – Eu tinha abandonado o jornalismo porque não estava satisfeita, mas nunca deixei de gostar de escrever. O jornalismo está aí de uma forma ou de outra, do gostar de escrever, de comunicar melhor de forma escrita do que falada. Eu pensei: o que eu posso fazer? O ativismo é uma coisa legal, mas as intervenções, por exemplo, são perigosas. Não dá para fazer isso a vida inteira, né? Sair de madrugada para fazer intervenções é ter que fugir da polícia. Hoje eu tenho mais medo da polícia do que de bandido. E aqui em Curitiba também tem muitas empresas de segurança privada. Recentemente esses seguranças mataram um guri que estava pichando um muro. Isto me deixa muito insegura. Achei melhor fazer uma outra coisa a que eu possa dar continuidade, que eu me sinta bem fazendo, que eu não tenha medo de fazer. Aí surgiu esta ideia de escrever um zine sobre o veganismo, sem ter que me submeter a nenhum tipo de padrão externo. Eu escrevi algumas matérias para explicar o veganismo na primeira edição, porque algumas pessoas não tinham a menor ideia do que era o veganismo. Para a maioria, ser vegano é ser parecido com um marciano. Mas o que é realmente o veganismo? Será que é só um modismo ou tem alguma coisa por trás disso? E veio esta ideia do Informe. Eu pensei muito na questão de ser uma pastinha, passar essa coisa radical. Mas ser radical é ir à origem dos problemas. Então eu até escrevi no primeiro editorial: esta é uma publicação radical. Eu não tenho nenhum medo de dizer isto. Eu não tenho o rabo preso com ninguém, eu produzo, eu faço a publicação, eu distribuo.

ANDA – Como funciona a redação e a parte operacional do Informe Vegano hoje?

Mariana Hoffmann – O conceito gráfico foi meu, o desenho da página, o formato das letras, a imagem. Mas quem coloca no computador é a Dani (Daniela Baumgartner), que é quem faz a parte gráfica no computador. É uma parceria: eu penso como vai ficar, mas quem lida mesmo com o programa é ela. Da pauta à redação final eu faço tudo. Eu comecei fazendo 300 exemplares e agora estou em 400, na quarta edição bimestral. Eu mesma financio o jornal. Mando imprimir, pago a produção gráfica e distribuo. Comecei pelas escolas de yoga e em pontos de grande circulação de pessoas, como a reitoria da UFPR. Coloco para distribuição gratuita também no Balarama, porque é o único restaurante vegano da cidade. E o jornal também tem um recadinho de que pode ser reproduzido livremente. Esta é uma forma de incentivar o veganismo. Eu sempre falo para as pessoas: se você gostou do jornal, se achou bacana, faz cópias. É uma forma de ter uma distribuição mais ampla. Eu sozinha só dou conta de 300 ou 400 exemplares, mas se eu tiver uns 10 amigos que façam mais 10 cópias cada um, já são mais 100. E as pessoas que recebem também podem repassar isto para a frente. Esta é a ideia: que as pessoas leiam, repassem. Se fizerem uma ou duas cópias já torna possível atingir o maior número de pessoas.

ANDA – Quais os planos futuros para o Informe Vegano?

Mariana Hoffmann – Este ano eu quero fazer um site e colocar o zine em PDF, para não perder esta característica de zine. Isto só não aconteceu ainda porque eu não sei operar essas tecnologias. Mas vai acontecer. Eu não quero deixar de fazer o zine impresso, mas quero usar a internet como uma ferramenta para expansão. Também irei ao 12º Festival Internacional Vegano, em julho, no Rio.

ANDA – Como você tem percebido a recepção dessa mídia? As pessoas estão gostando, o veganismo surge como uma novidade?

Mariana Hoffmann – No zine eu dou um e-mail também para as pessoas se corresponderem. Nos e-mails que recebi sugeriam outros temas, diziam que a ideia é legal. Mas a maior parte do retorno vem do boca a boca. Eles dizem: “– Ah, é você quem escreve o zine? Eu falei com tal pessoa que achou superlegal”. A maioria achou interessante, mesmo aquelas que ainda são vegetarianas, que não são veganas. Às vezes eu fico me perguntando se as pessoas vão fazer alguma coisa ou só vão achar interessante. Eu tenho essa expectativa, mas a gente também tem que perceber que cada pessoa tem o seu momento, assim com eu tive o meu, cada pessoa tem o seu. E tenho que controlar a minha angústia. Eu posso ir até aqui. Depois é com cada um. Mas as pessoas acham muito legal, ninguém nunca fez críticas negativas.

ANDA – Você percebe nas pessoas uma certa resistência ao veganismo ou predomina uma falta de conhecimento sobre o tema?

Mariana Hoffmann – Eu acho que é uma coisa muito diferente. As pessoas ainda têm aquela visão de que “– Não, isto é muito radical pra mim”. Mesmo pessoas que têm acesso às informações, que sabem de tudo o que acontece por trás da indústria da carne, por trás das indústrias farmacêuticas, parece que acham que vão ter que se sacrificar muito para ser vegano. É este pensamento que eu percebo, como se ser vegano fosse um sacrifício em prol dos animais. Mas é um ato ético, é uma mudança de vida com a qual você se sente bem, porque é totalmente coerente. Mas, para quem ainda não tem muito contato, parece uma coisa muito difícil e que não vale a pena.

ANDA – Qual a filosofia deste trabalho que você está realizando de forma independente pelo veganismo? Qual a contribuição que você pretende dar?

Mariana Hoffmann – Eu acho que cada um deve fazer o que sabe fazer melhor. Se você realmente se importa com os animais, se realmente acha que eles têm direitos, pode fazer alguma coisa, qualquer coisa. Eu gosto de escrever, eu faço um zine. Se você gosta de pintar, você pode pintar coisas relacionadas aos direitos dos animais; se você gosta de usar a internet, também pode usá-la. Cada um tem uma forma potencial de contribuição, e isso é muito importante. Os animais não têm voz, nós temos que ser a voz deles. A gente vive numa sociedade que explora os animais até a última gota. A gente hoje pensa: “– Nossa, como os romanos eram bárbaros, matavam-se uns aos outros no Coliseu”. Mas nós continuamos sendo bárbaros. Não só com a nossa espécie, com guerras, mas com os animais. Eles são os escravos de hoje. A gente tem que se perguntar se isto está certo, se não pode fazer nada mesmo. Será que é tão difícil fazer alguma coisa? Não é.

É só uma questão de coerência.

Você viu?

Ir para o topo