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Conservacionistas debatem quando declarar uma espécie extinta

7 de abril de 2010
4 min. de leitura
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Foto: Science Photo Library
Declarar que uma espécie está extinta e, por isso, cortar gastos financeiros com sua conservação não é uma questão trivial. É uma decisão que os cientistas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês) têm de tomar ao elaborar, por exemplo, sua Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas. Uma equipe de pesquisadores australianos está tentando adotar uma abordagem mais rigorosa para essa área com a ajuda do dodô (Raphus cucullatus).

A questão ilustra um problema para os biólogos: determinar quando se deve desistir de uma espécie. Reduzir prematuramente os gastos de conservação pode levar uma espécie à extinção, mas, por outro lado, investir na conservação de um animal há muito não observado traz o grande risco de desperdiçar um dinheiro que poderia ser gasto com uma espécie ameaçada de extinção.

“Declarar a extinção de uma espécie é uma decisão difícil, pois envolve grandes riscos e grandes incertezas”, diz Tracy Rout, baseado na University of Melbourne’s School of Botany, Austrália, que liderou o estudo sobre Conservação Biológica. “Existem diversos casos em que espécies tidas com extintas foram redescobertas – as chamadas espécies Lázaro.”

A Lista Vermelha da IUCN declara que um animal só poderá ser considerado extinto “quando não houver dúvida razoável de que o último indivíduo morreu”. Mas o significado disso na prática não é claro, diz Rout. Seu trabalho estabelece um critério para tomar essa decisão e se aplica a três espécies: gambá-pigmeu-da-montanha (Burramys parvus), espécie ainda existente na natureza, o pica-pau-de-bico-marfim (Campephilus principalis) espécie possivelmente extinta e os “mortos-como-um-dodô”.

“Em termos de dotação financeira, atualmente as decisões são tomadas de forma arbitrária, variando de agência para agência e de espécie para espécie”, diz Rout. “Nosso método ajudará a tornar esses critérios mais explícitos.” 

Rout e colegas elaboraram um modelo que utiliza as observações de espécies ameaçadas de extinção – seja pelo número de observações que falharam em detectar uma espécie ou pelo tempo desde que foram vistas pela última vez – para calcular a probabilidade de existência. Em seguida, aplicam essa conclusão a um critério que avalia o custo de manter a conservação com o de interrompê-la prematuramente.

A probabilidade de que o dodô viva em algum lugar é remotíssima. De acordo com o novo modelo, só valeria a pena gastar dinheiro conservando o dodô se o valor da gestão de conservação (valor das espécies atribuído pelos conservacionistas multiplicado pela diminuição na probabilidade de extinção) fosse mais de 17 milhões de vezes o custo da gestão e acompanhamento.

Em contrapartida, as chances de o gambá-pigmeu-da-montanha estar presente no Mount Buller, Austrália, são cerca de 0,55%. Em estudo anterior, essa população foi avaliada em US$ 180 milhões e US$ 410 milhões, valor equivalente a 66 pesquisas sobre o animal antes de declará-lo extinto.

O caso do pica-pau-de-bico-marfim é complicado, pois existem alegações controversas de observações da espécie em 2004, 2005 e 2006, o que provocou enormes despesas financeiras com conservação.

Usando apenas observações de campo amplamente aceitas do pica-pau-de-bico-marfim, Rout calcula que sua extinção teria sido declarada em 1965. Considerando as recentes e polêmicas observações, somente em 2032 a espécie será declarada extinta, caso nunca mais seja observada.

“A pesquisa de Rout representa uma tendência crescente em algumas partes do campo de conservação”, diz David Roberts, biólogo conservacionista do Durrell Institute of Conservation and Ecology, da University of Kent, em Canterbury, Reino Unido.

“Atualmente é possível verificar que os critérios da Lista Vermelha da IUCN e todos os outros são quantitativos, enquanto as declarações de extinção são muito mais qualitativas. Existe um grande nível de incerteza”, diz Roberts, que forneceu a Rout alguns dados sobre o pica-pau-de-bico-marfim.

“Há uma grande movimentação no sentido de incorporar processos de tomada de decisão e de economia nas decisões sobre conservação”, acrescenta. “Esse sistema irá, pelo menos, tornar o estudo mais transparente, pois estamos trabalhando com espécies específicas”.

Andrew Solow, diretor da Marine Policy Center no Woods Hole Oceanographic Institution, Massachusetts, diz que estudos desse tipo estão começando a ter impacto sobre as práticas de conservação. Solow, coautor de um paper com Roberts sobre a extinção do dodô, acrescenta: “Os recursos são escassos e sempre é bom quando você puder aplicá-los de forma melhor”.

Fonte: Scientific American Brasil


Nota da Redação: É compreensível que os recursos para conservação sejam escassos, mas só podemos considerar que “só valeria a pena gastar dinheiro conservando o dodô se o valor da gestão de conservação fosse mais de 17 milhões de vezes o custo da gestão e acompanhamento” se pensarmos exclusivamente em termos econômicos, já que,  ainda que haja apenas um exemplar de qualquer espécie, preservar sua vida valerá a pena. Já é chegada a hora de a vida ser mais valorizadada que o dinheiro.

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