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Ética e ateísmo

6 de dezembro de 2009
18 min. de leitura
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Certa vez conheci uma pessoa que me disse que, ao saber que eu era ateu, sentiu-se receosa, mas que, com o tempo, percebeu que apesar disso eu era uma boa pessoa – como se o ateísmo fosse um entrave para o desenvolvimento ético de um ser humano. No entanto, essa mesma pessoa era perversa, manipuladora, mentirosa, arrogante – para resumir, uma hipócrita. Com o tempo, entendi que não havia uma contradição em sua personalidade. Não que pessoas religiosas sejam necessariamente hipócritas, mas aquelas mais fanáticas e que se consideram ungidas de uma missão divina, como era o caso dela, frequentemente o são, mesmo sem se dar conta. Isso porque é necessária uma boa dose de arrogância para acreditar conhecer os segredos do universo, ter “linha direta” com um deus e sentir-se apto a revelar – ou impor – esses segredos aos demais.

Ainda jovem, quando a curiosidade me levou a frequentar alguns cultos, entendi que o pecado que mais se observa nas igrejas e templos é o do orgulho, da vaidade. O que há na fé que faz as pessoas se sentirem melhores que as outras que não têm fé ou não têm a supracitada “linha direta”? Não tenho resposta pronta para essa pergunta, mas esta leva a uma outra questão, mais fácil de abordar: o sentimento de superioridade lhes leva a supor que não há bondade fora da religião, que quem não tem religião não possui estatura moral ou capacidade de praticar o bem e o respeito ao próximo.

Diversas vezes ouvi, de forma direta ou velada, a opinião de que um ateu não pode ser uma boa pessoa. Em 2007, uma pesquisa feita no Brasil mostrou que os ateus são o grupo que seria mais amplamente rejeitado pelos eleitores numa eleição presidencial: 84%  admitiriam votar num negro, 57% numa mulher, 32% em um homossexual, e 13% num ateu; 57% disseram que não votariam em um ateu em hipótese nenhuma [1]. Pesquisas nos Estados Unidos têm resultados muito semelhantes.

Frequentemente, quando se debate a diversidade e a tolerância religiosa, é comum se ouvir a seguinte frase: “o que importa é que cada um, a seu modo, está em busca de deus”. Se você não busca, então você não conta, está aquém do resto da humanidade. Há também os que dizem que o ateísmo é rebeldia adolescente e que, cedo ou tarde, o ser humano aceita a ideia de um deus. Existe também a batida máxima de que os ateus são pessoas amargas e infelizes que adorariam acreditar em um deus ou apenas ainda não foram “despertas”. O cronista Reinaldo Azevedo certa vez escreveu: “Tendo a achar que, se dependesse da vontade, todo mundo acreditaria em Deus. Mas há quem não consiga, ainda que queira.” [2]

Deixei de acreditar em um deus aos 16 anos. Hoje, com 30, tenho cada vez mais convicção da inexistência de um deus e cada vez mais antipatia pelas religiões instituídas. Sou hoje, sendo adulto, mais ateu que há 14 anos. E sei que crer em um deus não me faria mais feliz nem mais completo. Não é uma vontade mal-suprida, algo que “não consigo, ainda que queira”. Pelo contrário: a ideia de um deus me gera angústia e tristeza, pois simboliza hierarquia, superioridade, poder, enquanto eu acredito na radicalidade da liberdade e da igualdade, e que somente pela consciência damos valor aos nossos atos. Fazer o bem obrigado por deus é como fazer o bem obrigado pelos pais ou pela lei: é uma ação moralmente neutra. Não tem valor intrínseco, pois não partiu da consciência, e sim de uma coação externa. Podemos nos conformar à lei por conveniência ou medo, mas apenas quando fazemos o que é certo por livre escolha somos pessoas verdadeiramente conscientes – mesmo que isso vá contra a conveniência, o benefício pessoal e a própria lei (pois, como sabemos, o direito e a ética frequentemente não coincidem).

Daí, na minha opinião, o elevado valor de optar por um estilo de vida vegano. Não quer dizer que os veganos sejam automaticamente pessoas boas, melhores ou superiores. A ética humana não é linear: pode-se ter uma grande consciência ética num campo e uma grave falha de caráter noutro. Eu bem sei que conheço alguns veganos completamente desprovidos de caráter, da mesma forma que há onívoros com elevada consciência ética em relação aos humanos, embora sejam todos deficientes éticos perante os animais. Como disse Milan Kundera numa passagem que já citei, o verdadeiro teste da bondade humana está perante aqueles que não podem nos fazer nenhum mal, nem reagir ao mal que lhes infligimos, e contra quem as injustiças praticadas não levam a algum tipo de punição. Estes são os animais. E neste teste fundamental da bondade, a maioria dos seres humanos falha miseravelmente.

Outro caso: certa vez ouvi de uma católica fervorosa que não se poderia afirmar com certeza que Gandhi teria sido aceito no paraíso. Afinal, ele não professava a religião “correta”. Vindo daqueles que professam os pretensos altos valores morais de sua fé, isso revela, ao contrário, o completo desprezo por eles: não importa seu caráter ou a contribuição dada em vida para a paz, a justiça, a liberdade. Importa apenas se você se curva diante do “verdadeiro” deus. Não é apenas uma ideia como essa que é detestável. Todo o sistema de crenças que lhe dá origem não pode ser senão um completo equívoco.

Alguns dos maiores crimes cometidos pela humanidade tiveram na religião sua justificativa, senão seu motor principal. Dentre elas, as religiões monoteístas abraâmicas – judaísmo, cristianismo e islamismo – se mostraram particularmente sanguinolentas [3]. O maior genocídio perpetrado em toda a história – o extermínio dos povos nativos da América pelos conquistadores europeus – foi justificado em nome do cristianismo, tanto católico quanto protestante. Cerca de 90% dos habitantes da América em 1492 foram exterminados num espaço de poucas décadas [4]. Também a maior migração forçada da história, de africanos para a América, e o maior, mais recente e mais complexo sistema escravista que a motivou – vicejaram e prosperaram, em vez de minguar, sob os olhos complacentes do cristianismo – de novo, tanto protestante quanto católico.

Cultuando a obediência e a hierarquia, defendendo o dever da expansão da “verdadeira” palavra divina e inteligentemente utilizado pelos conquistadores europeus, o cristianismo se revelou a ideologia perfeita para o colonialismo. Você poderia matar, torturar, escravizar, explorar, oprimir, e ainda alegar que estava promovendo e difundindo o bem. É absolutamente ocioso discutir se isso foi só uma “instrumentalização” ou “distorção” da fé religiosa, por dois motivos: primeiro, os colonizadores, em sua maioria, ainda que em grau maior ou menor de fervor, eram sinceramente crédulos nas palavras da Bíblia; segundo, as autoridades eclesiásticas, responsáveis pela salvaguarda da doutrina, eram elas próprias coniventes com tais atrocidades e corrompidas pela sede de poder e riqueza.

Algumas das guerras mais sangrentas da história foram guerras religiosas. Muito antes das Revoluções Francesa e Russa, antes do nazismo e de sequer se imaginar a possibilidade de guerras mundiais ou hecatombes nucleares, os indivíduos se matavam em nome de deus. O mais prolongado conflito anterior ao século XX, a Guerra dos 30 Anos (1618-1648), foi uma guerra religiosa. Em apenas um episódio, a Noite de São Bartolomeu, em 1572, milhares de protestantes franceses foram massacrados pelos católicos. Proferir a religião errada na Europa das Idades Medieval e Moderna era, se não um terrível risco, como no caso da Inquisição, pelo menos um grande inconveniente – que o digam os judeus, vítimas de leis discriminatórias e violências sazonais (os chamados pogroms). Havia que se professar sua fé em silêncio e às escondidas para não ser alvo de perseguição e violência. Quantos massacres não caíram no esquecimento para que hoje a Igreja Católica possa projetar uma autoridade moral da qual carece num mundo tão moralmente corrompido como é o nosso?

Isso para não mencionar os conflitos religiosos contemporâneos. Fala-se muito de fundamentalismo islâmico hoje em dia, mas se esquece que existe também um fundamentalismo cristão, sediado nos Estados Unidos e que encontrou seu ápice no governo de George W. Bush, marcado por um profundo desprezo pelo que não é judaico-cristão, um senso missionário de exportação dos valores “americanos”, uma desconfiança e até hostilidade à ciência e um forte conservadorismo de costumes.

A repulsa pelo pensamento dissonante é tão profundo no cristianismo que o maior pecado que pode cometer um cristão não é o assassinato, nem mesmo o suicídio, mas o pecado da “heresia”. Séculos de discurso religioso vendem ao termo “heresia” um sentido terrível. Na verdade, porém, “heresia” é tão somente uma “distorção da fé”, isto é, uma discordância e interpretação distinta da doutrina e do dogma religioso. É precisamente isso que era o heliocentrismo: um pecado mortal contra a doutrina religiosa, por afirmar que a Terra não era o centro do universo.

Por isso Galileu teve de se haver com a Inquisição. Se a verdade está contra deus – pior para a verdade. Aliás, um axioma típico do pensamento religioso. No filme Crimes e Pecados, de Woody Allen, um personagem diz, a certa altura: “Se for necessário, eu sempre vou escolher deus à verdade”. Não deveríamos temer a verdade. Mesmo a mais dolorosa verdade pode nos libertar: conhecer a realidade é ter o poder de transformá-la. Em outra passagem do filme, outro personagem diz: “o universo é um lugar muito frio; somos nós que o investimos com nossos sentimentos”. Tal passagem, aparentemente desoladora, de fato nos concede a autonomia moral de optar o que vamos fazer de nossas vidas. Cabe somente a nós tomar as decisões corretas, optar se vamos contribuir para o bem ou o sofrimento alheios. “Somos nós, em nossa capacidade de amar, que atribuímos sentido ao universo indiferente”, por fim, diz o mesmo personagem numa das últimas frases do filme.

As chamadas religiões da “nova era” gostam de afirmar que deus está em todas as coisas – o que nada mais é que uma versão pós-moderna do deus onipotente, onipresente e onisciente. Porém, para acreditarmos que existe uma conexão entre as consciências ou na energia que o corpo humano emite, não precisamos chamar isso de deus nem muito menos crer em deus. A energia é um fato físico cientificamente comprovado. Se não podemos testar, reproduzir ou comprovar a existência de algum tipo de conexão mental promovida pelo vínculo afetivo ou afinidade de ideias, isso não significa que esse fato seja sobrenatural e não possa ser explicado um dia – nem tampouco que existe uma inteligência superior que a tudo dá sentido. Nossos pensamentos são ondas cerebrais. Como as ondas do rádio, é possível que possamos “sintonizá-las” com outras mentes que operam na mesma frequência. Se quisermos chamar essa sintonia de “deus”, isso se deve tão somente à incapacidade de escapar da tradição judaico-cristã, e não porque ela realmente manifeste a existência de um ser criador do universo.

De fato, creio que nem mesmo a possibilidade de vida após a morte depende de um deus para ser válida. Por sinal, o budismo, que muitos veem mais como uma filosofia que uma religião, aponta nesse sentido: um universo que prescinde de deus, cujo objetivo é a evolução interior. Afinal, se o universo depende de um criador, caímos num paradoxo: se há um criador do universo, qual a origem do criador? Mistério insolúvel. Alegar que nossa limitação terrena impede a resposta, que a verdadeira natureza de “deus” nos escapa, como afirmam os religiosos, não soluciona o problema: se não podemos encontrar a resposta para este dilema, então a hipótese de que não há criador em absoluto, que os religiosos não admitem, é tão válida quanto a hipótese de que há.

Por fim, quando me perguntam, então, por que não me mantenho aberto à ideia da existência de um deus, me vejo forçado a afirmar: porque devo estar disposto a aceitar o dogma judaico-cristão, e não o dogma hindu ou das muitas outras religiões existentes no mundo? O agnosticismo assume uma postura subalterna diante do monoteísmo abraâmico. Ou você já conheceu algum agnóstico que está aberto à ideia da existência de Brahma, Vishnu e Shiva? Se estamos dispostos a admitir a existência do deus abraâmico, por coerência, devemos admitir a possibilidade de existência de outros deuses, pois não há nenhum fato que demonstre que as religiões abraâmicas são as únicas que podem ser “verdadeiras”. Adotar essa postura é por si só curvar-se ao monoteísmo abraâmico e adotar uma postura etnocêntrica, ocidentalista e arrogante. Diversas religiões já foram abandonadas e perdidas, seja voluntariamente ou por imposição externa. Como não supor que issso também não possa ocorrer com as religiões contemporâneas, inclusive as abraâmicas?

Vejamos o caso do suicídio, que aludimos mais acima. Por que o suicídio é particularmente condenado por todas as religiões? Os sinos da Igreja não tocam por um suicida. Se ele for judeu, não pode ser enterrado no cemitério judaico. Não há perdão ou compaixão para o suicida – que deve ser justamente o ser humano mais necessitado de ambos, devido ao estado de sofrimento que lhe faz abrir mão da própria vida. Ora, os religiosos veem o suicídio (com razão, do seu ponto de vista) como uma afronta a deus. Toda religião é baseada no medo da morte e na necessidade de acreditar numa vida após a morte. Se o ser humano não temer mais a morte, significa que não teme mais a deus. Por isso os suicidas são os maiores inimigos das religiões: um exército de “desgarrados” para quem deus não oferece mais nenhuma resposta.

O que nos leva à própria relação inseparável entre religião e poder. O antropólogo Pierre Clastres, em seu clássico A Sociedade contra o Estado, levanta uma interessante hipótese: a de que o Estado surge não pela propriedade, como afirmavam Rousseau e os marxistas, mas pela autoridade religiosa. Nas sociedades tribais, bem como nas sociedades mais antigas de modo geral, em que o conhecimento objetivo do universo não estava disponível pelas limitações técnicas e científicas de suas épocas, e a vulnerabilidade diante das intempéries da natureza era enorme, aqueles indivíduos capazes de “interpretar” os sinais da natureza e “intermediar” a relação do ser humano com o sobrenatural (o “divino”) eram investidos de grande poder. Por isso, em todas as sociedades pré-modernas – incluída a Europa até fins do século XVIII – as autoridades religiosas eram, senão as mais poderosas, extremamente poderosas. Os soberanos políticos, não raro, eram tidos como ungidos pela autoridade divina – como os reis da Europa – ou divindades eles mesmos – como os faraós e o imperador azteca.

E por que afinal os crentes supõem que um ateu não pode ser uma pessoa boa? O que significa essa suposição? Significa dizer que o ser humano é essencialmente mau e precisa de uma força externa para comandá-lo a praticar o bem. Nesse caso, o bem não é praticado por consciência, mas pelo medo da punição – o inferno, o karma ou coisa parecida – ou, na melhor das hipóteses como “moeda” em troca de alguma recompensa, uma “graça divina”. Existiria de fato alguma ética e bondade no ser que age apenas movido pelo medo ou o interesse pessoal?

Pelo contrário, a religião não nos ensina de fato sobre o bem e a moral. A maioria dos seres humanos pode conjugar os dois fatores, mas na verdade a ética é completamente autônoma da religião. Como afirmei no último texto, o ser humano tem uma capacidade inata de distinguir entre o certo e o errado. Essa capacidade pode ser estimulada e desenvolvida pela educação e a vida social ou, ao contrário, distorcida e silenciada pela mesma, mas está latente no ser humano por meio não só da razão vulgar, como dizia Kant, mas também do sentimento de compaixão, como destacou Rousseau. Algumas questões complexas podem requerer o debate e a ajuda de um especialista (diga-se, um estudioso da ética, e não uma autoridade religiosa como costuma ser o caso), mas essas são as questões auxiliares ou marginais, não as básicas. Todo ser humano SABE que é errado matar, mentir, praticar agressão física, verbal ou moral, e assim por diante.

Por tudo isso, tendo a concordar com Marx quando este diz, em A Questão Judaica, que a verdadeira liberdade religiosa consiste em libertar-se da religião. A religião não nos ensina sobre o bem não apenas por conta da autonomia da ética, mas também pelos frequentes males e injustiças praticados e justificados em nome da religião, como nos inúmeros exemplos que dei ao longo do texto. Entretanto, não defendo, por isso, o ateísmo oficial ou a perseguição religiosa como se viu nos regimes socialistas, dos quais sou extremamente crítico, como sabe quem lê os meus textos. A busca da espiritualidade responde a uma inclinação legítima do ser humano em questionar-se sobre o sentido da vida e sua continuidade. Essa busca interior deve ser respeitada como parte da liberdade individual de crença e de pensamento. Porém, embora muito frequentemente os crentes acusem os ateus de querer impor a não-fé, são as religiões institucionalizadas as que promovem perseguições e cruzadas religiosas, recorrem à violência, à exclusão e ao autoritarismo para preservar seu poder. Pois o controle que detêm da linguagem simbólica ainda hoje é fonte de grande poder, justamente por esta inclinação natural do ser humano à busca do sentido da sua existência.

É por esta razão que sou, antes de tudo, opositor das religiões institucionalizadas, que são forças opressoras e disciplinadoras do ser humano. O pensamento religioso é deficiente para responder à questão dos direitos fundamentais do ser humano, pois é todo fundado em dogmas. Ou os aceitamos, ou somos excluídos. Nós, como indivíduos, é que não deveríamos dar importância às opiniões das igrejas. Espero que um dia a humanidade possa libertar-se dessas amarras.

De qualquer modo, não vejo sentido, por exemplo, nesses movimentos para que a Igreja Católica mude suas posições sobre celibato, homossexuais, camisinha, aborto… Ainda que seja questionável o direito da Igreja Católica de condenar o divórcio, o sexo com camisinha ou a homossexualidade – pelo que essas opiniões absurdas podem acarretar em termos de preconceito e violação de direitos – as igrejas, como qualquer organização da sociedade civil, têm o direito de escolher seus membros e opinar sobre as questões da sociedade.  Assim como nós temos o direito de questionar e denunciar suas teses arcaicas. Diante da epidemia de AIDS, por exemplo, a condenação da camisinha não é apenas um equívoco, é moralmente duvidosa. Quanto à questão do aborto, deveria ser debatida sobre bases éticas, racionais e científicas, jamais religiosas [5]. Ainda assim, se você não concorda, tanto melhor sair da Igreja, ora! Para que frequentar um espaço que não aceita sua personalidade ou suas opiniões? Em vez disso, escolha-se a liberdade! Parafraseando Groucho Marx: eu não gostaria de entrar (ou permanecer) num clube que não me aceitasse como sócio [6].

Sempre que escrevo sobre religião sou criticado por intolerância e perseguição. Os mais benevolentes sugerem que aceite deus em meu coração. Pois bem… como disse acima, não tenho nada contra pessoas religiosas. Tenho amigos religiosos e respeito suas opiniões. Ao escrever sobre ateísmo exerço tão somente minhas liberdades: liberdade de pensamento, liberdade de expressão e… liberdade religiosa! Pois tanto quanto um religioso tem o direito de ser respeitado pela sua fé, praticá-la e expor suas opiniões, nós, ateus, temos o direito de sermos respeitados pela nossa ausência de fé na religião e em um deus, e também de expressarmos nossas opiniões.

O ateísmo não representa, como muitos desejam, a ausência de moralidade. Um ateu pode ser imoral, antiético e sem caráter como qualquer outro indivíduo, mas isso nada tem a ver com o ateísmo em si. A maioria da humanidade é religiosa, de modo que, se ética e religião fossem realmente irmãs siamesas, já viveríamos no “paraíso”. Por outro lado, não existe ética mais elevada do que aquela originada tão somente da consciência individual, motivada pelo senso desinteressado do dever e do respeito, e não pelo medo da punição ou desejo de recompensa. Por isso, a verdadeira ética não existe em ninguém apesar do ateísmo. Pelo contrário, a ética pura, embora possa conviver e coabitar com a fé religiosa, prescinde em si mesma, e por completo, de qualquer deus ou religião, e só pode estar baseada na autonomia e consciência morais do indivíduo.

[1] Fonte: Revista Veja. “Como a Fé Resiste à Descrença”. 26 de dezembro de 2006, edição 2040, pp. 70-7. Os dados da pesquisa estão na página 72.

[2] Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/reinaldo/geral/veja-5-so-13-dos-brasileiros-votariam-num-ateu-para-presidente/

[3] Adota-se essa terminologia porque as três grandes religiões monoteístas têm a origem comum no patriarca Abraão.

[4] Cf. TODOROV, Tzvetan. A Conquista da América. A Questão do Outro. São Paulo: Martins Fontes, 1996, especialmente p. 123 e ss. Os dados sobre o genocídio dos nativos americanos encontram-se na página 129.

[5] Pessoalmente tenho objeções éticas ao aborto na maioria dos casos, pelo direito à vida que o feto tem a partir do momento em que é senciente.

[6] A frase original do comediante, para quem não sabe, é: “eu não entraria num clube que me aceitasse como sócio”.

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