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Libertação em Movimento – Parte 2

6 de março de 2009
4 min. de leitura
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No texto anterior, argumentei que as dificuldades contemporâneas que os veganos encontram, cotidianamente, para divulgar sua filosofia de vida e mesmo poderem ser totalmente coerentes com ela são momentâneos e que, na mesma medida que o veganismo se expande, abre-se espaço para um debate sobre a total e definitiva abolição da exploração animal.

O que nos leva, assim, ao segundo ponto: as evidências muito atuais dos progressos da luta pela abolição da exploração animal, a despeito da afirmação assoberbada de quem acha que não passa de mero delírio juvenil. Talvez alguém achasse, em um tempo remoto, que era impossível que negros, índios, estrangeiros ou mulheres pudessem ter os mesmos direitos que homens brancos. Aliás, na Europa querem tirar os direitos mais básicos dos imigrantes, e uma das desculpas é justamente dizer que “não é possível” uma Europa que garanta direitos a todos, prospere e seja pacífica ao mesmo tempo.

Trata-se de uma típica chantagem de exploradores e detentores do poder, portadores da ideologia dominante, tentando afetar psicologicamente os adversários, desqualificá-los e à sua luta. Enquanto isso, nós pressionamos, ganhamos espaço, forçamos o debate, conseguimos pequenas concessões, e num futuro próximo teremos adeptos e poder para emplacar mudanças.

Basta mencionar alguns exemplos.

Casos como a proibição de animais em circos e a vivissecção são emblemáticos: quem imaginaria que poderíamos avançar nessa matéria, 50 anos atrás? E, ainda assim, o debate avança. Diversas cidades já proibiram o uso de animais em circos, e outras estão seguindo o exemplo. Atualmente, já se discute uma lei federal que contenha tal proibição. Muitas dessas leis não impedem o circo que usa animais de apresentar-se, apenas impedem-nos de apresentar estes animais – o que virtualmente neutraliza o propósito abolicionista da proibição. De todo modo, mesmo com tais incoerências, o debate está se expandindo e é questão de tempo para que o uso de animais em circos seja abolido em nosso país.

No caso da vivissecção, mesmo que não tenhamos vencido, leis proibindo testes em animais foram aprovadas no Rio de Janeiro e Florianópolis, antes de serem desfiguradas e vetadas. A reação dos exploradores também não tardou – como se era de esperar – e os vivisseccionistas criam eventos, mesas redondas, publicam artigos, fazem lobby e canalizam recursos para defender seus interesses, seu meio de vida, sua visão de mundo e seu poder constituído. Estranho seria se não fosse assim: afinal, esta também é, principalmente, uma disputa por PODER! O último movimento do lobby dos vivisseccionistas foi a pressão pela aprovação da Lei Arouca, que regulamenta os testes em animais. A lei foi enfim aprovada – com o apoio de bem-estaristas –, o que significa que iniciativas como a do Rio de Janeiro e Florianópolis não poderão mais acontecer, pois violam uma lei federal. Embora um grande retrocesso, ela de modo algum representa o fim do jogo. O debate antivivissecção está apenas começando. O simples fato de estarmos pondo as questões na agenda já indica uma auspiciosa mudança de ventos. Um grande abaixo-assinado contra a Lei Arouca circulou antes da sua aprovação, obtendo mais de 20 mil assinaturas, uma demonstração de que nossa demanda não se restringe a um pequeno grupo.

A própria reação em si já significa uma vitória para nós: eles, que antes tinham sua posição legitimada a priori e riam das nossas críticas, agora têm que nos levar a sério e se esforçar em convencer a sociedade de que seu ofício é legítimo, e que não pode ser de outro modo. Claro está que a pressão irá aumentar nos próximos anos, inclusive de dentro das universidades: o uso de animais vivos já está sendo abolido no ensino e, como mencionei, existem cientistas de respeito que se opõem ao modelo animal também na pesquisa. Também entre os estudantes o questionamento ético do uso de animais é crescente. Nesse mesmo período, a União Europeia já proibiu testes da indústria de cosméticos a partir de 2009, e na UE e América do Norte já existem selos que atestam que determinados produtos não foram testados em animais – um tipo de certificação que estamos tentando implementar aqui no Brasil e que agora recebeu o respaldo de um senador da República.

E é questão de tempo até chegarmos na pecuária. Em 2008 tivemos, pela primeira vez, uma matéria tratando da controvérsia do abate humanitário e o embate entre abolicionistas e bem-estaristas num veículo de comunicação de massas de grande circulação:

http://vista-se.com.br/arquivos/revistafolha.htm

Pode levar anos, e deverá levar muitos anos, décadas até; mas chegaremos ao ponto de veicularmos seriamente nossa oposição à criação de animais para a alimentação e nos fazermos ouvir. Quando isto acontecer, os pecuaristas estarão na defensiva, como estão hoje os vivisseccionistas.

Claro, foram apenas pequenos passos dados até agora. E absolutamente não está garantido que seremos vitoriosos, nem quando. A história é feita de progressos e retrocessos, contradições e conflitos. Mas é com pequenos passos que se começa uma longa jornada, e eu acredito que a história humana tende a caminhar para sistemas mais livres: sempre que surge a tirania, onde quer que se imponha, ela sempre é desafiada, e acaba sucumbindo. A liberdade e sua busca são condições sine qua non da existência. A causa abolicionista se move e progride: lenta, mas continuamente.

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